Correio braziliense, n. 20870 , 14/07/2020. Economia, p.7

 

Guedes quer OCDE e recebe cobranças

Marina Barbosa

14/07/2020

 

 

Ministro reafirma intenção de entrar para a organização, que reúne os países mais desenvolvidos. Secretário-geral da entidade diz que América Latina e Brasil têm de proteger trabalhadores informais e preservar o meio ambiente

Ingressar na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) continua entre as prioridades do governo brasileiro. O ministro da Economia, Paulo Guedes, ao participar de reunião ministerial da entidade, ontem, ressaltou que o país está enfrentando a crise da covid-19, mas também está pronto para prosseguir com as reformas estruturais e a integração econômica com outros países. Guedes, porém, ouviu cobranças. Para a OCDE, o Brasil e as nações da América Latina e do Caribe têm o desafio de, além dos cuidados com a pandemia, assegurar a proteção dos trabalhadores informais e preservar o meio ambiente.

Guedes discursou por meia hora na reunião. Ele disse que o governo brasileiro não sabe até quando vai a pandemia, alegando que a decisão sobre as medidas de distanciamento social foi “descentralizada” para estados e municípios. Mas garantiu que o Executivo não deixou faltar recursos para a saúde, tanto que o deficit público nominal chegará a 16,6% do PIB neste ano. Disse ainda que o governo prepara a “volta segura ao trabalho”, com programas de crédito para empresas, amparo financeiro aos mais vulneráveis e uma “rampa de ascensão social” para os 40 milhões de trabalhadores informais que hoje vivem do auxílio emergencial.

O ministro afirmou ainda que o governo sabe da importância de proteger o meio ambiente e combater o desmatamento ilegal na Amazônia. Porém, pediu cooperação da comunidade internacional para isso, desde que esse apoio não afete a soberania brasileira sobre a floresta. “A Amazônia é maior que a Europa. É difícil vigiar tudo, monitorar tudo. Queremos o crescimento sustentável, fiscal e ambientalmente. E estamos abertos à cooperação, à ajuda nessa saída da crise”, discursou. E aproveitou esse apelo para reiterar o desejo do Brasil de aderir à OCDE. “Precisamos de cooperação. Por isso, queremos entrar na OCDE, queremos melhores padrões, cooperação”, afirmou.

Para tentar mostrar que o Brasil está fazendo o dever de casa para entrar no clube dos países ricos, Guedes disse ainda que o governo está pronto para retomar as reformas econômicas e ampliar a integração com o resto do mundo. Porém, o que ele ouviu do secretário-geral da OCDE, Ángel Gurría, foi que a América Latina e o Caribe também terão outros desafios no pós-coronavírus.

Gurría lembrou que a região vai ver uma escalada da pobreza e do desemprego após a covid-19. Por isso, vai precisar avançar em programas sociais mais sólidos e capacitar os trabalhadores informais, além de melhorar a gestão do gasto público e o sistema tributário. E tudo isso por meio de um programa de desenvolvimento sustentável que alinhe “as políticas de estímulo econômico com as necessidades em matéria de mudança climática, defesa da biodiversidade e proteção do meio ambiente”.

O mais importante agora, segundo Gurría, é enfrentar a pandemia da maneira adequada. “Primeiro, tem que combater e vencer o vírus. Saúde e economia não se contrapõem. É um falso dilema. Até que haja uma vacina disponível, é fundamental permanecer vigilante, seguir a estratégia de fazer testes e manter o distanciamento social dos que testam positivo. Não tem outra opção”, alertou o secretário-geral da OCDE.

Apesar de não citar especificamente o Brasil nesses recados, Gurría acertou o país em cheio. O governo de Jair Bolsonaro vem sendo criticado pela comunidade internacional pela política de enfrentamento à covid-19 e à gestão da política ambiental. Afinal, o vírus segue avançando pelo país, da mesma forma com que as queimadas continuam se alastrando pela Amazônia. E, mesmo nas reformas econômicas, o governo enfrenta dificuldades. A reforma tributária, por exemplo, precisa passar pelo Congresso, que está disposto a simplificar o sistema, como prega a OCDE, mas não concorda com algumas propostas de Guedes, como a criação de um imposto similar à antiga CPMF.

Sobre atritos políticos, por sinal, Ángel Gurría disse que é hora de os governos latino-americanos buscarem uma cooperação mais efetiva com a sociedade e com os vizinhos. “Todos temos que trabalhar em uma mesma direção, para assegurar a saída forte e solidária da crise. Por isso, a cooperação regional é fundamental”, disse. E ele garantiu que a região pode contar com a ajuda da OCDE, desde que esse novo mundo seja “melhor, mais verde, mais inclusivo e sustentável".

________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Pronampe pode ter mais R$ 20 bi

Marina Barbosa

14/07/2020

 

 

Mais de 70% dos recursos do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) já foram emprestados. Mas muitos pequenos negócios seguem precisando de crédito para sobreviver à pandemia de covid-19. Por isso, a equipe econômica e o Congresso Nacional se preparam para ampliar em até R$ 20 bilhões o orçamento do programa. A ideia é transferir parte dos recursos que hoje estão empoçados no programa de financiamento da folha para o Pronampe.

O programa disponibilizou R$ 15,9 bilhões do Tesouro Nacional para avalizar empréstimos às micro e pequenas empresas, que não vêm conseguindo se financiar pela incapacidade de fornecer garantias reais. E nem chegou a todos os bancos ainda, mas já “deslanchou” e deve ser ampliado, segundo a equipe econômica. No final do expediente bancário de ontem, R$ 11,3 bilhões já haviam sido emprestados a mais de 150 mil micro e pequenas empresas pelo Pronampe.

Foram R$ 5 bilhões no Banco do Brasil, que chegou a anunciar uma suplementação orçamentária de R$ 1,24 bilhão, mas esgotou essa dotação extra em menos de 12 horas e, por isso, não tem mais recursos disponíveis nesta linha de crédito. Mais R$ 3,7 bilhões no Itaú, que também bateu seu limite de crédito em menos de três dias. Outros R$ 50 milhões foram liberados pelo Banco da Amazônia. E R$ 4,24 bilhões na Caixa Econômica Federal, que cumpriu a segunda meta de contratações ontem, mas conseguiu uma terceira leva de recursos e agora tem mais de R$ 1,66 bilhão para emprestar.

Pelo ritmo da procura, o novo orçamento também deve acabar rápido. Por isso, o governo não vai mais esperar que outros grandes bancos privados começassem a operar o Pronampe para começar a estudar formas de ampliar o programa. O entendimento é que, depois de semanas recebendo críticas sobre a dificuldade de acesso ao crédito na pandemia, o programa, enfim, conseguiu sair do papel e. agora, é preciso garantir a continuidade dos empréstimos às micro e pequenas empresas.

Para evitar ampliar ainda mais o rombo fiscal, a equipe econômica estuda fazer um remanejamento orçamentário nas medidas emergenciais de crédito. Isto é, tirar parte dos R$ 34 bilhões que foram destinados para o programa de financiamento da folha das empresas, o Programa Emergencial de Suporte a Empresas (Pese), para o Pronampe. Afinal, o Pese só emprestou R$ 4,5 bilhões desses recursos em mais de três meses; diferentemente do Pronampe, que deve esgotar seu orçamento em pouco mais de um mês.

A transferência, contudo, precisa passar pelo Congresso Nacional. Por isso, o assunto está sendo negociado com parlamentares. O senador Jorginho Mello (PL-SC), disse que vai falar com o presidente Jair Bolsonaro sobre a possibilidade de editar uma medida provisória para isso. Mas Espiridião Amin (PP-SC) e Kátia Abreu (PDT-TO) já se adiantaram e vão apresentar uma emenda à MP nº 975 propondo a transferência de R$ 20 bilhões do Pese. A emenda pode ampliar para R$ 35,9 bilhões as garantias do programa e tem condições de ser votada nos próximos dias.