Valor econômico, v.21, n.5032, 30/06/2020. Brasil, p. A8

 

De saída, Mansueto alerta para ‘risco’ na prorrogação do auxílio emergencial

Lu Aiko Otta

Mariana Ribeiro 

30/06/2020

 

 

Rigoroso observador do comportamento das finanças públicas, estando dentro ou fora do governo, o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, aproveitou a divulgação do resultado das contas do mês de maio para despedir-se dos jornalistas e passar algumas mensagens sobre o futuro “desafiador” para o caixa do governo.

No horizonte mais imediato, alertou para o perigo de prorrogar o auxílio emergencial. “Quanto mais a gente não exagerar no gasto público deste ano, melhor será o futuro.” O Brasil sairá da pandemia com dívida bruta acima de 95% do PIB, o que é elevado para países emergentes. Essa dívida, frisou ele, terá de ser paga.

Mansueto faz parte de um grupo de integrantes do governo que sempre defendeu o ajuste estrutural das contas públicas, mas que vê a pandemia como uma situação excepcional na qual é necessário elevar os gastos para evitar o agravamento do quadro social e da crise sanitária. Esse aumento, porém, deve ficar circunscrito ao período da crise. Em 2021, volta a agenda do ajuste. E ajuste fiscal é discussão política, ressaltou. Não há certo ou errado. Há escolhas.

Se a opção for por algum desenho que eleve a despesa com benefícios sociais, o Brasil terá de estar preparado para discutir um aumento permanente da carga tributária para financiá-la.

E o Brasil, mostrou ele, já gasta bastante com a área social. De cada R$ 4 de suas despesas, R$ 3 vão para programas sociais ou Previdência. Não é pouco para os padrões mundiais, frisou. Nesse ponto, lançou um convite para levar a discussão a um nível mais elevado: olhar para o baixo efeito distributivo dos gastos sociais no Brasil. Citou um estudo disponível no site do Ministério da Economia que mostra o impacto modesto desses programas na redução das desigualdades. Questionou se não seria possível gastar o mesmo e fazer mais.

Esse é o tipo de debate colocado há anos por especialistas, mas que não encontra ambiente político para ser aprofundado. Em sua última entrevista coletiva no cargo, Mansueto apontou para outra discussão do mesmo tipo: o excessivo engessamento da despesa do governo, um problema para o qual ele sempre chamou a atenção.

Ontem, apresentou uma tabela mostrando que há cinco anos toda a arrecadação líquida federal vai para pagamento de gastos obrigatórios, sobretudo Previdência e pessoal.

Em 2020, mesmo sem a covid-19, as despesas que não podem ser reduzidas somariam 106,7% das receitas líquidas. Com a pandemia, serão 116%. Mesmo com essa pressão, não é intenção do governo abrir mão da regra do teto de gastos. Ela continua válida neste ano e será aplicada em 2021.

“Para além de 2022, terá de fazer algo estrutural para ganhar mais espaço no teto”, disse. “Reformas estruturais são mais importantes no médio e longo prazos.”

Essa era a agenda para a área fiscal antes da pandemia. O governo aprovou a reforma da Previdência, que produz efeito sobre o maior grupo de despesas obrigatórias. E preparou uma proposta de reforma administrativa, para conter o crescimento do segundo maior gasto obrigatório, os salários.

Na entrevista, Mansueto disse que a reforma administrativa valoriza o servidor. Cria mais estímulos para buscar avanços na carreira.