O globo, n. 31631, 14/03/2020. País, p. 26

 

Senado cobra de redes sociais acesso a dados

Amanda Almeida

14/03/2020

 

 

Após Facebook e Twitter se recusarem a enviar informações à CPMI das Fake News, Casa exige cumprimento de quebra de sigilo de contas nas plataformas; investigados pediram ao STF para garantir proteção das publicações

O Senado vai notificar o Twitter e o Facebook exigindo o cumprimento de quebra de sigilo de contas das redes sociais em até 10 dias. O ofício, assinado pela Advocacia da Casa, é uma reação à negativa das duas empresas de tecnologia em fornecer informações exigidas pela CPMI das Fake News. Ao colegiado, as companhias alegaram que os pedidos dependem de autorização judicial.

A Advocacia argumenta que comissões parlamentares de inquéritos têm “poderes de investigação próprios das autoridades judiciais”. No ofício, o Senado informa às duas empresas que, se elas não cumprirem a determinação, medidas judiciais serão tomadas em função da “incidência dos crimes de desobediência e de obstrução de investigação, nos termos do art. 330 do Código Penal” e da lei que define a prática de organização criminosa.

Os advogados do Senado citam que “o Supremo Tribunal Federal já decidiu que as CPIs podem, por autoridade própria, determinar a quebra do sigilo de dados fiscais, bancários e telefônicos”. Uma lei editada em 1952 confere, de fato, poder semelhante aos de um juiz a uma CPI. Em 2016, uma atualização na legislação manteve a equiparação, o que garante à comissão autoridade para determinar quebra de sigilo fiscal e bancário ou requerer documentos.

REQUERIMENTOS

As empresas alegam que o pedido da CPMI contradiz a legislação brasileira e acordos internacionais sobre proteção de dados na internet. Elas citam, por exemplo, o Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal entre Brasil e Estados Unidos da América (MLAT), que estabelece um processo pelo qual autoridades precisariam passar para ter acesso a dados. A Advocacia do Senado alega que pedidos de CPI não necessitam de qualquer “homologação”. “Qualquer entendimento que exija a necessidade de cumprimento dos procedimentos instituídos pelo MLAT para o fornecimento de informações solicitadas pela CPMI das Fake News representa verdadeira afronta à soberania do Parlamento brasileiro e à própria soberania nacional”, afirma a Advocacia do Senado.

O colegiado quer acesso a dados como histórico de conversas, lista de contatos, histórico de páginas acessadas, entre outros. Os alvos do pedido já entraram com mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar evitar o fornecimento dos dados. O relator designado, ministro Luís Roberto Barroso, ainda não divulgou decisão.

O Twitter e o Facebook se negaram a fornecer dados pedidos em requerimento apresentado pelo deputado Alexandre Frota (PSDB-SP) e aprovado pelo colegiado em 5 de fevereiro. O parlamentar pede o fornecimento de dados das contas de 11 servidores do deputado estadual por São Paulo Douglas Garcia (PSL), que, segundo ele, estão ligados a “movimentos organizados que atuam dentro da estrutura de comando com a publicação reiterada de postagens ofensivas, difamatórias, injuriosas e caluniosas”.

SEM MEDIDAS JUDICIAIS

O pedido do Senado, no entanto, tem impacto no desfecho de outros requerimentos aprovados e a serem apreciados pela CPMI das Fake News, que também quer investigar outros usuários de redes sociais. Por isso, a resposta do Facebook e do Twitter em relação ao ofício do Senado é aguardada com expectativa pelos integrantes do colegiado, que querem evitar medidas judiciais. Isso porque o trâmite seria mais longo e atrapalharia os trabalhos, que têm prazo para acabar.

A CPMI acaba em abril. Integrantes da oposição e do centrão, no entanto, tentam prorrogá-la até outubro. Segundo membros da comissão, os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEMAP), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não se opõem à proposta. A iniciativa da Advocacia ocorre a pedido do presidente da CPI, senador Angelo Coronel (PSD-BA). O Facebook diz que ainda não foi notificado e alega que “tem respondido a todas as requisições da CPMI” e que está à disposição para colaborar. “Vale destacar que, conforme amplamente noticiado pela imprensa, o Facebook Inc tem fornecido dados à CPMI, sempre em conformidade com a legislação brasileira”, diz a empresa, alegando que, no caso desse requerimento, tem de respeitar o MLAT.