Título: Uma hora, eu ia ter que aparecer
Autor: Almeida, Amanda
Fonte: Correio Braziliense, 15/01/2013, Política, p. 6

Condenado a 13 anos de cadeia, o contador de Cachoeira se apresenta à polícia. Geovani Pereira da Silva era o último membro da quadrilha do bicheiro que ainda estava foragido. Amanda Almeida Enviada especialAnápolis (GO) — "Não tem jeito de correr da Justiça. Mais cedo ou mais tarde, eu ia ter que aparecer." Embora negue envolvimento com os negócios do bicheiro Carlinhos Cachoeira, foi assim que Geovani Pereira da Silva, apontado como contador do esquema, justificou a decisão de se entregar à Polícia Federal, ontem, em Anápolis. Ele era o único foragido do grupo e é considerado peça-chave das investigações, já que controlava a entrada e a saída do dinheiro obtido com jogos ilegais. Condenado a 13 anos e quatro meses de prisão por corrupção e formação de quadrilha, ele foi levado para a Superintendência da PF em Goiânia e, depois, deve seguir para o Centro de Prisão Provisória de Aparecida de Goiânia.

Segundo agentes da PF, Geovani chegou por volta das 9h30 de ontem à delegacia de Anápolis. O mandado de prisão para ele é de 29 de fevereiro do ano passado, data em que foram presos Cachoeira e mais 79 pessoas. Em entrevista ao Correio, Geovani, que não tem curso superior, contou que resolveu se entregar para voltar a ter contato com a família. "Nesse tempo, eu me apeguei muito a Deus, para que me preparasse para me apresentar no momento certo. Quero voltar a ver meus filhos", disse ele, ressalvando que não falaria sobre sua ligação com Carlinhos Cachoeira, com quem assegura não ter mais contato.

Entre as ações de Geovani mapeadas pela PF, está o saque de recursos de uma conta bancária da empresa fantasma Alberto e Pantoja Construções e Transportes Ltda, que, segundo as investigações, foi criada apenas para receber dinheiro da Construtora Delta. A Polícia Federal especula que, por um tempo, foi Geovani quem articulou o pagamento dos honorários dos advogados dos companheiros presos. "Vi isso nos jornais. Não teve nada disso", negou ele. O suposto contador do esquema diz que sua situação financeira está ruim e que tem passado "aperto" para bancar seu sustento. Seu patrimônio declarado é inferior a R$ 200 mil.

Silêncio Perguntado sobre a possibilidade de colaborar com a Justiça, revelando mais informações sobre o esquema de Cachoeira, Geovani diz que não tem mais nada a acrescentar porque "não participou de nada". Ele não entregou nenhum documento à Polícia Federal. Em Anápolis, é conhecido como um "colaborador leal" do bicheiro. Ele conta que assistiu a algumas sessões da fracassada CPI do Cachoeira no Congresso pela televisão, mas não quis comentar o resultado das investigações. "Estou mais aliviado (por ter se entregado). Meu coração está mais leve. Posso tentar resolver minha situação."

Apesar de negar envolvimento no esquema, Geovani foi flagrado em mais de 250 mil horas de gravação da Operação Monte Carlo. Com Cachoeira, ele falava rapidamente e recebia ordens de pagamento. Com o comandante do grupo, ele foi condenado em 7 de dezembro, no processo em decorrência da Monte Carlo, por corrupção e formação de quadrilha. O advogado de Geovani, Calisto Abdalla Neto, informou que entrou, na tarde de ontem, com um pedido de extensão do habeas corpus concedido a Cachoeira e espera que o cliente seja libertado ainda esta semana.

Abdalla garante que não houve negociação para a entrega de Geovani à polícia e reafirmou a versão do cliente de que a decisão foi motivada pela vontade dele de rever a família. "Pedi apenas para que ele ficasse preso em Anápolis, pela proximidade com os parentes. Mas parece que (a carceragem) está cheia. Então, ele será levado para Aparecida de Goiânia", informou. Geovani disse que estava escondido nas redondezas de Anápolis e que espera, agora, ter o apoio de amigos.

Três perguntas para Geovani Pereira da Silva Por que o senhor resolveu se entregar? Achei que era o melhor momento para eu resolver minha situação. Quero retornar à convivência com a minha família, especialmente com os meus filhos. Sou bem relacionado (em Anápolis). As pessoas que me conhecem sabem que eu sou um cara trabalhador, um pai de família. Não sou bandido.

Como foram os últimos meses? Eu não estava dormindo. Não estava comendo direito. O medo de ser preso era muito grande. Toda noite acordava quando ouvia um cachorro latindo ou um barulho de carro. Estava muito deprimido. Ficava 24 horas trancado num quarto. É o sentimento de cumprir 10 meses de prisão.

Vai colaborar com a Justiça? Dar mais informações sobre o esquema de Carlinhos Cachoeira? Não tenho mais nada para acrescentar. Eu não participei de nada. Não quero falar sobre esse assunto.