O globo, n. 31632, 15/03/2020. Especial Coronavírus, p. 12

 

As diferentes cartadas dos governadores contra o vírus

Bernardo Mello

Juliana Castro

Silva Amorim

15/03/2020

 

 

Wilson Witzel, João Doria e Romeu Zema tiveram comportamentos distintos diante da epidemia nos estados

A evolução do coronavírus país afora tem se revelado acada dia um teste de força para os governadores de três estados em cujas capitais a epidemia vem aumentando progressivamente. Aos poucos, a doença ganhou prioridade na agenda de Wilson Witzel (RJ), João Doria (SP) e Romeu Zema (MG), não só do ponto de vista de saúde pública, mas também por conta do impacto político que pode pesar sobre cada um deles. Criticado à época da crise na Ceda e, em janeiro, pela demora para se manifestar sobre amá qualidade da água e para trocar o comando da empresa, o governador do Rio, Wilson Witzel (PSC), editou dois decretos, em um intervalo de três dias, estabelecendo medidas de contenção do novo coronavírus.

As ações incluíram a suspensão, por 15 dias, de atividades como cinemas, teatros e eventos esportivos com público, a proibição de visitas a presidiários e a antecipação do recesso escolar nas redes pública e privada. Um dos textos assinados por Witzel também abriu uma brecha para a internação compulsória em caso de suspeitas do contágio pelo Covid-19.

Preocupado em sinalizar agilidade na reação à crise atual, Witzel não chegou a debater com outros governadores as medidas que adotaria no Rio —embora tenha proposto a antecipação, para a próxima quarta-feira, de uma reunião do Fórum de Governadores marcada para o dia 24. O primeiro decreto seguiu a linha de uma lei sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro, em fevereiro, que autoriza a “realização compulsória” de exames e “tratamentos médicos específicos” em casos de suspeita de coronavírus. Por conta de uma resistência no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a internação compulsória, o decreto de Witzel substituiu a expressão por uma frase que afirma que essas medidas “poderão ser adotadas” pelo governo do estado.

Aliados do governador entendem que o significado é o mesmo. O segundo decreto, publicado em edição extra do Diário Oficial na sexta-feira, foi costurado de véspera em reunião entre Witzel e seu secretariado. Ao justificar a necessidade de adotar medidas mais amplas e vetar qualquer evento com aglomeração de pessoas, o governador citou o jogo entre Flamengo e Barcelona de Guayaquil, no Maracanã, que reuniu 60 mil pessoas na noite de quarta-feira. Na quinta, o ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta citou a partida como um exemplo de evento que não seguia protocolos como a distância mínima entre pessoas.

— Foi o passo mais antecipado entre todos os governadores. Vão dizer que as medidas atrapalham a economia, mas o prejuízo lá na frente, sem essa contenção do vírus, seria dez vezes pior — defendeu o secretário de Casa Civil do Rio, André Moura. Dezesseis dias após o primeiro caso de coronavírus confirmado em São Paulo, o governador João Doria anunciou medidas restritivas ao público para tentar controlara transmissão no estado. Ele vinha evitando adotar ações como fechamento de escolas e universidades e proibição de grandes eventos públicos há dias, alegando que não era ainda o momento para endurecer contra o Covid-19. Na sexta-feira, quando o primeiro caso de transmissão comunitária foi confirmado em São Paulo, Doria assinou um decreto estabelecendo um “toque de recolher” gradativo para a rede pública de ensino.

A partir do dia 23, escolas vão fechar sem data para retomar o funcionamento. A orientação se estende a universidades públicas e particulares. Eventos públicos com mais de 500 pessoas estão cancelados e a recomendação é que o mesmo seja feito pela inciativa privada. O governador paulista tem preocupação com o impacto que as medidas restritivas causarão à economia do estado.

— Desde o início dissemos que a avaliação da situação seria diária e as decisões fundamentadas em orientações médicas. Fatos relevantes se apresentaram a nós hoje e, por isso, vamos anunciar novas medidas — afirmou o governador na sexta-feira. Em Minas Gerais, o governador Romeu Zema decretou ontem a suspensão de eventos oficiais com mais de cem pessoas pelos próximos 30 dias. A recomendação é que a medida, que será revista semanalmente, também seja adotada pela iniciativa privada. Zema citou o coronavírus na lista de motivos pelos quais não poderia concedera recomposição salarial de 41,7%, até 2022, para as forças de Segurança que ele mesmo enviou como proposta à Assembleia Legislativa.

O governador sancionou o reajuste de 13% relativo a este ano. O processo de tramitação do projeto e os vetos levaram Z ema a uma situação de desgaste político. Na última sexta-feira, compras de insumos, medicamentos e aparatos médicos, além da contratação de profissionais, foram dispensadas de licitação no estado.

Prejuízo seria maior, diz chefe da Casa Civil do governador Wilson Witzel