Valor econômico, v.21, n.5033, 01/07/2020. Política, p. A10

 

STF só deve decidir foro de Flávio depois do recesso do Judiciário

Isadora Peron

Luísa Martins

01/07/2020

 

 

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), solicitou informações ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) sobre a decisão que garantiu foro privilegiado ao senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ). Gilmar também pediu para que a Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifeste sobre o caso. Na prática, ao adotar esse procedimento, o ministro adia um desfecho para o caso, por causa do recesso do Judiciário. A Corte entra em regime de plantão a partir de amanhã e só retoma as atividades em agosto.

Até que Gilmar se manifeste, fica mantida a decisão da 3ª Câmara Criminal do TJ do Rio que, na semana passada, determinou que o processo que investiga a prática de “rachadinha” no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) saísse da primeira instância e fosse para o Órgão Especial do TJ.

A reclamação apresentada pelo Ministério Público Estadual do Rio foi distribuída a Gilmar por “prevenção”, porque ele já era relator de um outro processo apresentado pela defesa de Flávio, em setembro de 2019, para suspender as investigações que tramitavam na Justiça estadual do Rio.

Uma outra ação, impetrada pelo Rede, e que tem como relator o decano Celso de Mello, também trata do assunto, mas não exatamente do caso concreto de Flávio. Na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), o partido questionou a interpretação de dispositivo da Constituição do Estado do Rio que trata do foro por prerrogativa de função dos deputados estaduais.

A expectativa, porém, é que não haja divergência caso Gilmar e Celso decidam ambos se manifestar em suas respectivas ações. Hoje, o sentimento de ministros do STF ouvidos pelo Valor é que a situação precisa ser resolvida pelo Supremo, para que a investigação de Flávio volte à primeira instância.

Reservadamente, ministros do STF criticaram a decisão da 3ª Câmara Criminal. Em maio de 2018, o plenário da Corte decidiu que a prerrogativa de foro seria aplicada apenas aos crimes cometidos durante o exercício do mandato e relacionados às funções desempenhadas. Quando um político deixa o cargo, perde o direito ao foro especial - mesmo que, como é o caso de Flávio, ele tenha sido eleito para uma vaga no Senado.

Flávio, é investigado pelos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa, que teriam sido praticados a partir do desvio de salários de funcionários (“rachadinha”), quando era deputado estadual.

Na prática, a decisão da 3ª Câmara Criminal retirou o caso da alçada do juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal da Capital. Considerado rigoroso, Itabaiana já determinou a quebra de sigilo e a busca e apreensão em endereços de dezenas de pessoas ligadas a Flávio, além de ordenar a prisão de seu ex-assessor Fabrício Queiroz, apontado como operador do esquema.

De acordo com o documento enviado pelo MP do Rio ao Supremo, a 3ª Câmara Criminal promoveu uma “‘inovação’ indevida” e descumpriu decisões proferidas pelo STF “usurpando, assim, a competência da Suprema Corte para definir os limites do foro por prerrogativa de função de senadores da República e estendeu foro por prerrogativa de função a ex-ocupante do cargo de deputado estadual”.