Valor econômico, v.21, n.5036, 06/07/2020. Política, p. A10

 

Alcolumbre trabalha alianças no Congresso e STF por reeleição

Vandson Lima

Renan Truffi

06/07/2020

 

 

Em alta após ser protagonista nas aprovações do novo marco do saneamento, da mudança de data das eleições municipais e do projeto das ‘fake news’, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), quer aproveitar o momento para ganhar aliados em seu projeto mais ousado: uma mudança que permita a ele ficar mais dois anos à frente da Casa. Antes improvável, a manobra passou a ser considerada possível nos bastidores, com Alcolumbre tendo estabelecido importantes vínculos com lideranças do Congresso Nacional e com a Suprema Corte.

Neste momento, a hipótese mais provável é a apresentação, nos próximos meses, de um parecer jurídico que reinterprete o parágrafo 4º do artigo 57 da Constituição. O trecho atesta que o mandato para a presidência das duas Casas do Congresso é de dois anos, vedada a recondução na eleição imediatamente subsequente. A contestação será de que, na Câmara, esses dois anos equivalem à metade do mandato de quatro anos, mas que os senadores eleitos ficam na cadeira por oito anos. Logo, seria preciso reequilibrar a regra, dando ao menos a chance de que os senadores possam presidir sua respectiva Casa por período equivalente ao dos deputados.

A partir daí, as possibilidades se abrem: uma seria de a questão ser remetida ao Supremo Tribunal Federal (STF). Aliados de Alcolumbre atestam que ele ganhou pontos com os ministros, mostrando liderança ao encaminhar o adiamento em seis semanas do pleito municipal - trabalho feito em estreita parceria com o ministro Luís Roberto Barroso -, bem como se mostrou uma figura confiável aos olhos da Corte ao fazer passar o projeto que combate a disseminação de conteúdos falsos ou caluniosos. O ministro Alexandre de Moraes anunciou a extensão por mais seis meses do inquérito das ‘fake news’, tocado pelo STF, um dia depois de o Senado aprovar a proposta sobre o mesmo tema.

Interlocutores confirmam que o presidente do Senado pediu também a técnicos e assessores que elaborem uma proposta de emenda à Constituição (PEC), que torne possível sua recondução. O Congresso decidiria nesta hipótese se é cabível ou não a alegação do parecer jurídico. Um aliado de Alcolumbre, ainda não escolhido, mas que seria de outro partido, protocolaria a PEC.

Essa hipótese era, até poucos meses atrás, considerada absurda e de difícil aceitação no Senado. Mas fato é que a liderança mostrada por Alcolumbre nas últimas votações mudou seu patamar na Casa. Antes visto como um novato, egresso do baixo clero e que chegou à presidência pela ajuda do então ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, Alcolumbre mostrou musculatura para articular a aprovação de matérias complexas.

No caso do saneamento, o presidente pôs em prática uma estratégia considerada inteligente e muito elogiada: ele negou um pedido de adiamento de votação feito pela oposição, mas recorreu da própria determinação, jogando a decisão para o plenário. Nada menos que 61 dos 81 senadores deram razão a ele e disseram que queriam votar a matéria naquele dia. Isso fez com que quase todos os pedidos de destaque, que poderiam depois alterar a proposta, fossem retirados, já que estava claro que a proposta tinha amplo apoio.

Ao fim, Alcolumbre ouviu de Tasso Jereissati (PSDB-CE), um dos senadores mais respeitados da Casa: “Davi, tenha certeza de que a história do Senado muda com essa votação e a sua história pessoal também. Você deixou de ser aquele menino novo, de quem se tinha aquela imagem do menino inexperiente lá do Amapá. Você mudou de status perante o Senado”.

Todos esses movimentos têm ficado cada vez mais claros aos parlamentares. Por isso, lideranças partidárias que também têm interesse em presidir o Senado no próximo ano têm defendido a volta dos trabalhos presenciais. Segundo uma fonte, Alcolumbre estaria jogando sem concorrentes. Uma ala do MDB, ligada a Renan Calheiros (AL), acha que é o momento de mostrar que o presidente do Senado não tem condições de representar o Legislativo, caso a crise institucional se aprofunde. Os mais críticos gostam de lembrar em tom jocoso que, apesar de ter subido de patamar, Alcolumbre ainda atua como “vereador de Macapá”.

Se no Congresso e no STF Alcolumbre melhorou sua interlocução, no caso do Executivo é o Palácio do Planalto quem tem interesse em estreitar laços com ele. O motivo é a possibilidade de abertura de um pedido de cassação de mandato do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro, no Conselho de Ética do Senado por desdobramentos da investigação do caso das “rachadinhas”.

O conselho é presidido por Jayme Campos (DEM-MT), colocado no posto por Alcolumbre. Desvencilhar Flávio de eventuais constrangimentos, por consequência, aumenta o cacife do presidente do Senado junto ao governo.

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Para Maia, Moro é 'fortíssimo' em 2022, com 'muita chance de chegar ao 2º turno'

Vandson Lima 

06/07/2020

 

 

Ex-ministro da Justiça, Sérgio Moro “virou político” e tem muita chance de chegar ao segundo turno da eleição presidencial caso seja candidato em 2022. A avaliação é do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), feita ontem em longa entrevista à Globonews.

“Virou político, né?”, disse Maia, esclarecendo que não considerava a mudança necessariamente ruim. “Acho bom que ele venha para o debate político, dá legitimidade ao que ele defende. Acho que ele fez uma boa gestão [no ministério]”. Indo mais longe, Maia afirmou que Moro desponta como uma dos favoritos na corrida presidencial. “Acho que se for candidato [a presidente], é fortíssimo, tem muita chance de chegar ao segundo turno”.

A fala contrastou com críticas do presidente da Câmara à atuação de várias alas da Justiça. Procuradores da Operação Lava-Jato, apontou, não querem estar sob qualquer controle e prestar contas de seu trabalho. O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) “tem pouca eficiência”. “O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) pune muito mais juízes do que o CNMP seus procuradores”.

Em um tom mais conciliador, Maia afirmou que a relação com o governo do presidente Jair Bolsonaro melhorou nas últimas semanas. “Ainda não é de harmonia”, ponderou, mas disse que cabe ao presidente promover um pacto entre todos os poderes, incluindo governos estaduais e municipais, para uma atuação integrada e que supere divergências no enfrentamento da pandemia da covid-19.

“Deveríamos fazer uma reunião, sentar à mesa com todos dispostos a abrir mão de parte do que acreditam. Precisamos estar unidos, só uma pessoa tem legitimidade para isso, o presidente, que tem mandato até 2022 e deve coordenar essa conversa”.

Para ele, a versão “paz e amor” de Bolsonaro nas últimas semanas é fruto da compreensão do presidente de que precisa dialogar para encontrar soluções para a crise; “Bolsonaro chegou [à Presidência] desconfiando demais da política. Nunca tinha sido líder de partido, presidido uma comissão. Talvez ele tenha visto que as coisas não acontecem como ele imagina, com conspirações, que ele foi vendo que não é dessa forma. Fico com a tese que o presidente entendeu que, sem um bom diálogo, as coisas não vão andar”. Maia atestou que sua relação com o presidente “hoje é boa. Sou muito transparente, falo o que acredito de forma aberta”.

O presidente da Câmara afirmou que é fundamental também que Bolsonaro afaste do entorno do governo “lunáticos” que interferem nos rumos da gestão. “Tem a questão dos apoios dos movimentos mais radicais, que o levaram a este caminho. Essas redes querem viralizar o ódio para manter sua influência sobre o presidente”.

Questionado sobre quem seriam os lunáticos, exemplificou citando o ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub. Maia foi mais longe e aconselhou o Banco Mundial a rejeitar a indicação do ex-ministro para uma diretoria do órgão. “Espero que os lunáticos deixem de ser relevantes. Um deles está nos Estados Unidos. O Banco Mundial não merece esse tipo de política. Tivemos um dano de um ano e meio na Educação”. Mirando outro bolsonarista, o ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, Maia afirmou que a equipe econômica foi alertada das perdas que o país vem tendo e poderá ter por conta da gestão da Pasta.

Não há qualquer chance, enquanto Maia estiver no comando da Casa, de se aprovar um novo imposto nos moldes da antiga CPMF, garantiu. “Sou radicalmente contra CPMF ou um imposto disfarçado. Até 1º de fevereiro, enquanto eu for presidente, não contem com a presidência da Câmara, não será pautada criação de imposto”.

Para Maia, “a aprovação de uma reforma tributária é prioridade” para que o país tenha condições de futuramente retomar o crescimento, bem como uma reforma administrativa que privilegie a meritocracia no serviço público. “Prioridade número um para Brasil voltar a ser competitivo é a reforma tributária. Precisamos retomar esse debate nesta semana. Impacto de médio e longo prazo, ganho de captação de investimentos”.

Questionado sobre o Renda Brasil, programa de distribuição de renda com o qual o governo pretende substituir o Bolsa Família, Maia disse que ele não ataca a questão mais importante, que é promover a mobilidade social das famílias. “Renda Brasil é mais do mesmo, unificar o que já existe, aumentar o valor. Precisamos ir além da transferência de renda, ter uma variável que estimule a mobilidade social das famílias”. Neste ponto, e lembrando os efeitos da pandemia, Maia previu que o desemprego no Brasil pode chegar a 17% da população economicamente ativa.

Maia previu ainda que a Câmara fará esta semana as discussões finais para regulamentar a criação do novo Fundo Nacional da Educação Básica (Fundeb). “Texto melhorou muito, está muito bom. Temos mais uma semana de debate e depois devemos votar. Essa matéria é fundamental”.