O globo, n. 31702, 24/05/2020. País, p. 10

 

Situação de Weintraub é considerada delicada no governo após vídeo

Naira Trindade

24/05/2020

 

 

Ministro da Educação já estava sendo atacado por discordar de estratégia de entregar cargos a deputados do centrão 

 

PABLO JACOB/29-4-2020Rota de colisão.

 Enquanto ministros do Palácio do Planalto minimizaram os impactos das declarações do presidente Jair Bolsonaro durante a reunião com o conselho, em 22 de abril, acendeu no governo uma preocupação com a possibilidade de o ministro da Educação, Abraham Weintraub, responder criminalmente pelas falas agressivas aos magistrados do Supremo Tribunal Federal (STF). Weintraub vinha sendo “fritado” por aliados de Bolsonaro por discordar da orientação do presidente de ceder espaço no ministério para indicados do centrão. Após a divulgação do vídeo, interlocutores do governo analisam como “delicada” a situação do ministro, mas não veem disposição do presidente em substituí-lo neste momento.

Na reunião, em 22 de abril, Weintraub afirmou que os ministros do Supremo deveriam estar na cadeia. “Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia. Começando no STF”, disse o ministro da Educação, no encontro. No Planalto, aliados do presidente afirmam não haver dúvidas de que algum dos magistrados vai acionar Weintraub judicialmente. A preocupação é que uma ação judicial contra um ministro de Bolsonaro acirre os ânimos entre Executivo e Judiciário. No governo, há quem defenda que o presidente abra mão de manter Weintraub na Educação se a situação entre os Poderes ficar insustentável. Porém, na avaliação de aliados, a troca neste momento demonstraria “sacrifício” que o presidente não está disposto a fazer.

A pessoas próximas, Bolsonaro afirmou ontem que Weintraub saiu fortalecido após ter suas declarações reveladas. Aliados do presidente, no entanto, consideraram que os ataques do ministro são “conversas reservadas”, que não deveriam ter sido divulgadas. Um aliado da ala ideológica argumenta ainda que — por se tratar de uma reunião fechada — não caberia sequer ações judiciais. Ministros da articulação política já reclamaram de Weintraub com deputados. Até mesmo o presidente da Câmara, Rodrigo Maia

O ministro Abraham Weintraub no Planalto: ele sugeriu que todos os ministros do STF fossem presos (DEM-RJ), já manifestou insatisfação com o ministro da Educação. Porém, nome forte da militância bolsonarista, Weintraub se mantém firme no governo. Outra preocupação no governo após a revelação do vídeo da reunião dos ministros é com a parte em que Bolsonaro xinga os governadores João Doria (São Paulo) e Wilson Witzel (Rio de Janeiro).

A já estremecida relação de Bolsonaro com Doria e Witzel havia dado sinais de melhora após a reunião de governadores nesta quinta-feira. Na ocasião, integrantes do Palácio do Planalto enalteceram o comportamento de Doria e a cordialidade ao tratar da situação do enfrentamento ao novo coronavírus e do apoio em torno da manutenção dos vetos que o presidente pretende fazer ao projeto que permite reajuste a servidores no período da pandemia.

REAÇÃO A SALLES

Com a divulgação do vídeo, o temor de aliados do presidente é que convívio volte a ficar insustentável após Bolsonaro usar adjetivos como “bosta” e “estrume” para se referir aos governadores de São Paulo e Rio. Os comentários do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, durante a reunião ministerial do dia 22 de abril foram criticados na imprensa internacional . Para ele, o governo deveria aproveitar o momento em que o foco da imprensa está voltada para o novo coronavírus para fazer uma “baciada” de mudanças nas regras ligadas à proteção ambiental.

O jornal espanhol “El País” diz que “o então recém-nomeado Ministro da Saúde, Nelson Teich, olha horrorizado para seu parceiro Ricardo Salles quando ele defende aproveitar o fato de a imprensa estar focada no coronavírus para tornar as leis ambientais mais flexíveis”. O argentino “Clarín” descreveu Salles como um “aliado do agronegócio brasileiro” e enfatizou sua intenção de aproveitar o momento da pandemia para emplacar flexibilizações.