Título: Mau desempenho na OAB provoca reações
Autor: Castro, Grasielle
Fonte: Correio Braziliense, 17/01/2013, Brasil, p. 8

Enquanto candidatos criticam o nível de dificuldade da última edição da prova para advogados, entidade reforça que o resultado reflete a baixa qualidade dos cursos de direito do país. Dos 114.763 que fizeram a avaliação, só 19.134 foram aprovados - 1.064 no Distrito Federal

O índice de reprovação de 83% na primeira fase do último exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), recorde das últimas seis edições, reacendeu o debate sobre o nível de dificuldade do conteúdo cobrado e a qualidade do ensino superior brasileiro. Especialistas se dividem nas possíveis explicações para a piora no índice, entre elas, uma maior rigidez da banca e o impacto da proliferação de instituições no país. Dos 114.763 que fizeram a prova em 15 de dezembro, apenas 19.134 — 1.064 do Distrito Federal — foram considerados aptos para a segunda etapa do processo, que será em 24 de fevereiro.

A bacharel em direito, Valéria Bodas, 24 anos, fez o exame pela segunda vez e ficou indignada com o resultado. “Essa prova foi muito mais rígida que a anterior. Na edição passada, eu tirei 57 na primeira fase e nesta, 38. Por essa análise, parece que, de uma hora para a outra, eu joguei meu conhecimento fora. Muito pelo contrário, eu aprendi mais nesse período. Fiz cursinho. Estava melhor preparada”, argumenta. Formada em julho do ano passado, Valéria destaca que muito pouco do ensinado em sala de aula foi cobrado. “A banca foi desleal com quem acabou de sair da faculdade. Não acho que a exigência da OAB para o exercício da profissão tem que acabar, mas a avaliação precisa mudar.”

O advogado e professor de direito Maurício Gieseler concorda com a estudante sobre a diferença entre o conteúdo cobrado nas edições anteriores. Segundo ele, houve um incremento no grau de dificuldade. “A OAB nem divulgou a lista preliminar, porque o número de reprovação deve ter sido bem maior, antes da anulação de três questões. E o resultado foi catastrófico. Geralmente, os dirigentes da OAB dizem que a análise reflete a qualidade ruim das faculdades. Realmente, há cursos ruins, alunos despreparados. Mas isso já se tornou um clichê e usá-lo como justificativa não tem cabimento”, avalia.

A OAB reconhece que há variações entre o grau de dificuldade. De acordo com o presidente da ordem, Ophir Cavalcante, toda edição a banca tenta calibrar em torno de um padrão, mas há variações. Cavalcante, no entanto, reforça que tudo que foi cobrado constava no edital e na grade curricular do curso de direito. Gieseler concorda que o conteúdo cobrado era o previsto. “O edital não é específico. Pode cair de tudo na primeira fase e, dessa vez, foi muita minúcia da lei. Se o nível se mantiver assim, os estudantes podem se preparar mais”, alerta.

Capacitação Apesar de destacar que o padrão da prova pode sofrer alterações, o presidente da OAB frisa que o motivo mais forte para o baixo rendimento é a proliferação de cursos de direito. “Na década de 1990, tínhamos 300 faculdades, hoje são quase 1,3 mil. Na China, onde são 1,3 bilhão de habitantes, não existem mais de 300. A ordem é favorável, prestigia e incentiva a ascensão social pelo saber, mas não a qualquer custo, com profissionais de baixa qualidade. O advogado cuida de um bem fundamental, que é a liberdade pessoal e precisa estar bem capacitado. Essa qualificação vem de um bom curso de direito, que informe e forme. Lamentavelmente, isso não vem ocorrendo”, critica.

A opinião de Ophir é compartilhada pelo professor do curso preparatório para OAB Vestcon Sérgio Bautzer. Ele afirma que todo histórico da prova é marcado pela dificuldade dos estudantes. “Eu também tive problemas para passar na OAB, porque é difícil. É preciso que os estudantes se foquem para desenvolver um método de estudo. Apesar da dificuldade, as provas seguem um padrão. O resultado acaba, sim, refletindo a má qualidade dos cursos jurídicos. É preciso uma reavaliação no currículo das faculdades, especialmente nos anos finais”, sugere o professor.