Valor econômico, v.21, n.5037, 07/07/2020. Política, p. A12

 

Juiz negou pedidos da força-tarefa em SP para ampliar busca e apreensão

Maria Cristina Fernandes 

07/07/2020

 

 

Juiz responsável pela autorização da Operação Revoada da força-tarefa da Lava-Jato, Diego Paes Moreira resistiu a autorizar a operação de busca e apreensão em endereços do senador José Serra (PSDB-SP) e de sua família. Chegou a negar a extensão da operação a uma casa em Angra dos Reis, por avaliar que não estava relacionada com os fatos relacionados na denúncia. A decisão está em segredo de justiça.

Juiz substituto da 6ª Vara Criminal Federal em São Paulo, Moreira estabeleceu, entre advogados, a reputação de juiz técnico e deferente aos direitos dos réus. Juiz de um dos processos da JBS, foi ele quem liberou o passaporte de Joesley e Wesley Batista e permitiu que os irmãos conversassem. Só não os deixou que voltassem a tomar decisões na empresa.

Mais discreto que seus congêneres, no Rio, Marcelo Bretas, ou que o ex-juiz da operação em Curitiba Sergio Moro, Moreira chegou a ter conflitos de competência com o juiz titular da Vara, João Batista Gonçalves. O Tribunal Regional Federal acabou por determinar sua competência no caso.

Desde que começou a atuar na Lava-Jato, Moreira já declinou de várias denúncias para a justiça eleitoral. É para lá que a defesa do senador paulista quer voltar a remeter o processo, uma vez que a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal já decidiu nesse sentido, em 2018, por entender que as supostas propinas pagas pela Odebrecht a Serra se destinavam ao caixa dois de campanha.

“Mais do que subverter a competência da Justiça Eleitoral, definida por decisão do Supremo Tribunal Federal, a operação revela-se não só desnecessária, mas profundamente atentatória do Estado de Direito”, diz a nota da defesa do senador, assinada pelos advogados Flávia Rahal e Sepúlveda Pertence,

Por isso, o MPF achou por bem instruir o juiz com um documento adicional em que se vale da própria prescrição para contestar a competência da Justiça Eleitoral no caso. “Prescritas as pretensões punitivas atinentes aos supostos crimes eleitorais praticados antes de 2014, falece, por consequência, qualquer competência da Justiça Eleitoral para processar os crimes que lhes seriam eventualmente conexos”, diz o documento.

As evidências apresentadas parecem ter convencido o juiz de que os recursos, supostamente pagos pela Odebrecht, não foram usados nas campanhas de 2006 ou 2010 e teriam seguido sucessivamente lavados até 2014. Os procuradores sustentam que os valores transferidos à conta offshore da qual Serra teria sido beneficiário oculto totalizaram € 936 mil.

Este valor, segundo o documento, foi mantido em sua integralidade, até 2014, não tendo, portanto, como ter sido usado para campanha. “A mera menção, quando de um pedido de propina, a uma suposta finalidade eleitoral não tem, por si só, o condão de transmutar um crime de corrupção em crime eleitoral. Afinal, muitas vezes, tais referências são somente um eufemismo do agente corrupto para disfarçar o real destino da vantagem indevida, qual seja, seu proveito pessoal”, diz o documento, antecipado pelo site “Antagonista” e tornado público pelo site do MPF na tarde de ontem.

Pesa ainda contra a remissão do processo para a Justiça Eleitoral a manifestação do promotor do Ministério Público Eleitoral, em São Paulo, Fabio Bechar, pela competência da Justiça Federal.

A instrução em nada impede a defesa de recorrer ao Tribunal Regional Federal e, em caso negativo, ao Supremo Tribunal Federal. Como a Corte está em recesso, qualquer decisão liminar caberia ao presidente, Dias Toffoli.

O fato de o processo tramitar na 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, no entanto, com várias instâncias recursais, favorece a que uma decisão final, ainda que condenatória, possa levar anos, o que, somado à idade do senador (78 anos) tucano joga a seu favor.