Valor econômico, v.21, n.5040, 10/07/2020. Política, p. A14

 

Toffoli manda forças-tarefa da Lava-Jato compartilharem dados com a PGR

Luísa Martins

10/07/2020

 

 

Ao identificar o que chamou de “transgressões” dos procuradores da Operação Lava-Jato na primeira instância, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, mandou as forças-tarefas de Curitiba, no Rio de Janeiro e em São Paulo compartilharem todos os dados das investigações com a Procuradoria-Geral da República (PGR).

A decisão atende a pedido feito pela própria PGR, diante da “resistência” dos procuradores em repassar informações e em se submeter a procedimentos de supervisão. A origem do desgaste foi uma viagem da subprocuradora-geral Lindôra Araújo, ligada a Aras, até Curitiba, a fim de acessar os documentos sigilosos dos autos da Lava-Jato.

Segundo a decisão de Toffoli, devem ser entregues à PGR “todas as bases de dados estruturados e não estruturados utilizadas e obtidas” na instrução das investigações em primeiro grau. A mesma medida deverá ser tomada em processos futuros. As informações serão recebidas pela Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise do gabinete de Aras.

O ministro disse, ainda, que a PGR deve analisar com “profundidade” a existência de investigações indevidas no primeiro grau sobre os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). Os procuradores teriam se referido aos parlamentares mediante o uso de codinomes, na intenção de driblar o foro especial que ambos têm no Supremo.

“Necessário, portanto, coarctar, no seu nascedouro, investigações, ainda que de forma indireta, de detentores de prerrogativa de foro, em usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal. Aliás, o que se busca garantir, além da preservação da competência constitucional da Corte, é o transcurso da investigação sob supervisão da autoridade judiciária competente, de modo a assegurar sua higidez”, escreveu Toffoli.

A medida também está em apuração no âmbito do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), em um pedido de providências protocolado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) contra supostos abusos cometidos pelos procuradores de Curitiba. Ontem, o conselheiro Otávio Luiz Rodrigues Júnior pediu que Aras preste mais informações e que Dallagnol, caso queira, se explique.

Contra a força-tarefa coordenada por Dallagnol, além do caso das “camuflagens” em nomes de pessoas com foro no Supremo, pesam suspeitas de outras condutas ilegais, como cooperações informais com o FBI, agência de inteligência americana, e a instalação de um sistema próprio de gravações telefônicas.

Na petição, a OAB diz que essas suspeitas “são graves” e que “causa espécie” a reação dos procuradores a diligências realizadas por órgão hierarquicamente superior - a PGR -, “notadamente diante dos inúmeros questionamentos lançados, em diversas instâncias e em várias oportunidades, sobre a legalidade de certas condutas”.

Na semana passada, em novo capítulo da chamada Vaza-Jato, a Agência Pública publicou mensagens em que Dallagnol se nega a cumprir o decreto que determina que toda cooperação internacional seja autorizada pelo Ministério da Justiça (MJ). Ele sugere que, ao passar pelo Executivo, a parceria com os Estados Unidos corria “risco” de não prosperar.

Conforme antecipou o Valor PRO, serviço de tempo real do Valor, a defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva solicitou acesso aos registros do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional do MJ para verificar o caso, mas o ministro André Mendonça negou. Cabe recurso.

Em nota, a força-tarefa de Curitiba afirmou que vai cumprir a decisão, mas disse que ela “parte de pressuposto falso, pois inexiste qualquer investigação” sobre autoridades com foro. A nota traz uma crítica a Aras ao dizer que não lhe cabe exercer “função correicional” dos atos de outras instâncias. Também diz que a determinação de Toffoli desrespeita o princípio do juiz natural. Já a força-tarefa de São Paulo só disse que irá cumprir as medidas.

Já a força-tarefa do Rio emitiu nota na qual afirma que vai “tomar as providências para cumprir na íntegra a decisão monocrática do presidente do STF, em plantão, disponibilizando os meios necessários para o compartilhamento dos dados pretendidos pela Procuradoria-Geral da República, embora entenda a decisão incabível e buscará sua revisão.” A PGR não comentou. (Colaborou André Guilherme Vieira, de São Paulo)