Correio braziliense, n. 20881 , 25/07/2020. Cidades, p.13

 

Maioria das vítimas tinha comorbidades

Walder Galvão

25/07/2020

 

 

CORONAVÍRUS » Quase 90% das pessoas mortas por complicações da covid-19 no Distrito Federal apresentavam doenças preexistentes. Especialistas alertam que o tratamento e o controle dessas enfermidades podem evitar óbitos de pacientes

Desde o primeiro caso confirmado da covid-19 no Distrito Federal, em 5 de março, mais de mil brasilienses morreram devido à doença. Além disso, a quantidade de infecções, que cresce diariamente, ultrapassa os 90 mil registros. Dados da Secretaria de Saúde mostram que quase 90% das vítimas do novo coronavírus da capital tinham doenças preexistentes, que complicaram o quadro clínico dos pacientes. Cardiopatas e acometidos por distúrbios metabólicos, como a diabetes, são os que mais vieram a óbito. Especialistas ouvidos pelo Correio explicam como o vírus age em conjunto com essas enfermidades e que o controle e o tratamento delas podem evitar mortes.

O Distrito Federal atingiu a marca de 1.133 pessoas mortas pela covid-19 ontem. Dos óbitos registrados, 992 tinham comorbidades, ou seja, 87,6% das vítimas da capital apresentavam doenças preexistentes. A mais comum, segundo monitoramento da Secretaria de Saúde, é a cardiopatia. No total, 701 pacientes que perderam a vida para a covid-19 tinham a enfermidade. Em seguida, estão distúrbios metabólicos (447), pneumopatia (173) e obesidade (130).

André Moraes Nicola, médico e professor de imunologia médica da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília (UnB), explica que o coronavírus pode agir diretamente em outras partes do corpo, além dos pulmões. “O vírus tem uma ação direta de infectar as células e atrapalha o funcionamento de outros órgãos. Caso eles estejam doentes, aumentam as chances de eles pararem de funcionar. É o caso de enfermidades cardíacas e pulmonares”, detalhou.

Segundo o especialista, outro motivo que pode provocar a morte de pacientes é a inflamação. “O que mata não é o dano que o vírus causa, mas a resposta do sistema imune, que provoca dano no pulmão e leva a pessoa à morte”, explicou. O médico acrescenta que algumas doenças causam o aumento desse fator no corpo, como a diabetes. “Um diabético tem um nível de inflamação que pode aumentar as chances de a pessoa ter uma resposta muito forte contra a covid-19, o que causa complicações”, alertou.

Nicola comenta que estudos sugerem condições como hipertensão e doenças cardíacas como capazes de aumentar a produção de uma proteína na célula, que é receptora do vírus. “Devido a esse fator, a covid-19 consegue entrar mais rapidamente. É como se fosse uma fechadura em que a chave do vírus se encaixa para entrar na célula”, exemplifica.

Idade

Outro fator de risco para o novo coronavírus é a idade. No Distrito Federal, 823 pessoas — 72% do total de óbitos — tinham mais de 60 anos. O grupo etário que mais registrou mortes é o de pessoas com mais de 85 anos (181). O segundo lugar revela-se de pacientes entre 80 e 84 anos (140), e o terceiro, entre 75 e 79 (138). No total, 62 pessoas com menos de 39 anos faleceram por complicações da covid-19.

O parasitologista do Instituto de Biologia da Universidade de Brasília (UnB) Jaime Santana explica que crianças, adolescentes e jovens adultos, dificilmente, têm problemas com o novo coronavírus. De acordo com ele, a covid-19 é uma doença inflamatória e, como qualquer processo desse tipo, o corpo começa a produzir substâncias para destruir o agente invasor e o ambiente onde ele está. “Essa reação natural é importante, porque passa uma informação ao sistema imune para a produção de anticorpos. É como se fosse uma vacina”, comentou.

Entretanto, segundo Jaime, quanto mais avançada a idade, mais processos inflamatórios são encontrados no corpo: as placas de gordura vão se depositando nas placas de artérias e veias, como no coração e nos pulmões. “Esse processo ocorre a partir dos 30 ou 40 anos e vai se agravando. Por exemplo, pessoas entre 70 e 80 anos têm vasos sanguíneos muito entupidos. Quando chega o coronavírus, ele provoca outra reação inflamatória no corpo humano, o que gera uma exacerbação, que pode comprometer os órgãos”, salientou.

Devido a esses riscos, o parasitologista alerta que pessoas com comorbidades devem tratar bem essas doenças. “Apenas evitar a infecção do coronavírus pode não ser o ideal, porque ela pode acontecer a qualquer minuto. As pessoas precisam se preparar e procurar atendimento médico e seguir as orientações”, aconselhou. Segundo o especialista, quanto maior o cuidado com as enfermidades preexistentes menos receptivo o paciente será ao coronavírus.

Superação

Apesar de ter diabetes e estar no grupo etário considerado de risco para o novo coronavírus, o morador da Asa Norte Joel Carreiro dos Santos, 64, superou a doença. Em 7 de maio, ele deu entrada no Hospital Regional da Asa Norte (Hran) com sintomas da covid-19. “Antes de receber o diagnóstico, o protocolo usado foi o do tratamento de pneumonia. Quando testei positivo, fui para a ala específica. Precisei ficar nove dias internado e de oxigênio em um deles. Graças a Deus, o meu quadro evoluiu bem e fui para a UTI (unidade de terapia intensiva)”, lembrou.

Joel conta que precisou ajudar o irmão dele, de 70 anos, também acometido pela doença. Dias depois, ele começou a sentir os sintomas. “Tive dores no corpo, perdi o apetite e, em seguida, começou a febre. O primeiro exame de coronavírus deu negativo e chegaram até a suspeitar de dengue”, contou. Apesar de ter superado a doença, Joel relata que continua tomando cuidados. “A gente não sabe se está imune, então, precisa continuar preservando a saúde. Fui muito bem tratado no hospital e agradeço a Deus por essa bênção”, ressaltou.

Risco

São doenças que podem levar ao aumento de risco de problemas cardiovasculares. Pressão alta, alterações no colesterol, triglicérides e glicemia são alguns exemplos dessa síndrome.

__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

154 mortes na semana no DF

Walder Galvão

25/07/2020

 

 

Apesar de o Distrito Federal estar na fase de estabilização de casos do novo coronavírus e de mortes, a Secretaria de Saúde contabilizou 11.251 registros da covid-19 e 154 óbitos nesta semana. Ontem, houve o óbito de 22 pessoas, e 2.391 exames deram positivo. Com essas notificações, a quantidade de vítimas subiu para 1.133 e a de diagnósticos, para 92.414. Ainda assim, cresce a quantidade de recuperados. No total, 77.114 pessoas estão curadas. Por isso, 14.055 notificações são consideradas ativas.

Ceilândia segue na liderança das cidades com maior incidência da doença, com 11.041 infectados. Em seguida, aparecem o Plano Piloto (7.167) e Taguatinga (6.450). Das mortes contabilizadas ontem, todos os pacientes tinham mais de 30 anos. As cidades que mais registraram vítimas foram Planaltina e Ceilândia, cada uma com três óbitos. Ao todo, quatro pessoas que perderam a vida para a covid-19 não tinham comorbidades. De acordo com a Secretaria de Saúde, as mortes aconteceram entre 26 de junho e quinta-feira, mas foram computadas ontem.

O levantamento da Secretaria de Saúde ainda traz informações sobre trabalhadores que estão na linha de frente do combate à doença. Ao todo, 3.515 profissionais da saúde testaram positivo para a covid-19 e 16 perderam a vida devido à doença. Na área da segurança, ocorreram 948 diagnósticos e cinco óbitos. Além disso, a pasta ainda registra 1.634 diagnosticados no sistema carcerário e três vítimas.

UTIs

Levantamento da Secretaria de Saúde mostra que o DF tem 771 pacientes internados em unidades de terapia intensiva (UTIs). Devido ao crescimento diário de casos, o sistema encontra-se próximo à capacidade máxima. A rede pública de saúde tem 671 leitos de UTI exclusivos para pacientes com o novo coronavírus. Desses, 524 estão ocupados, ou seja, a taxa de ocupação é de 82,39%. Na rede privada, 92,51% das vagas estão preenchidas: são 247 pacientes para 268 leitos.