Correio braziliense, n. 20884 , 28/07/2020. Economia, p.10

 

BB é desafio para Guedes

Vera Batista

Vicente Nunes

28/07/2020

 

 

Ministro procura nome no mercado para o comando do Banco do Brasil, após a renúncia de Rubem Novaes. Ideia é mostrar prestígio junto à iniciativa privada, após saída de vários colaboradores da pasta. Substituto também deve entender o papel do banco na pandemia

A despeito de não descartar uma solução caseira para a presidência do Banco do Brasil, o ministro da Economia, Paulo Guedes, pretende buscar alguém de mercado para substituir Rubem Novaes, que deixará o cargo em agosto, e, com isso, mostrar que continua com prestígio no setor privado. Guedes está incomodado com a debandada de integrantes de sua equipe e quer resolver o imbróglio do BB o mais rapidamente possível. O ministro tem o aval do presidente Jair Bolsonaro, com quem se reuniu ontem.

No mercado, as reações à saída de Novaes foram divergentes. A unanimidade é que, seja qual for o escolhido, será um nome com conhecimento técnico — o que não descarta, totalmente, uma indicação política para o cargo.

O economista Cesar Bergo, presidente do Conselho Regional de Economia do DF, disse que a ideia do governo é “acomodar a questão política de cargos com o centrão”. “Deve ser alguém com condições de intermediar os desejos de privatização de Guedes e a resistência a se desfazer de tudo, de Bolsonaro”, afirmou.

Novaes não tinha perfil político, mas era perfeitamente capaz de levar a cabo os projetos de desinvestimento e as operações do banco digital, assinala Bergo. “Prova disso é a expectativa de resultados bastante positivos do BB nessa temporada de balanços do segundo trimestre. Como é amigo do ministro e do presidente, Novaes — fritado em banha quente pelos chegados do Planalto — preferiu sair antes que fosse tarde. Mas com a consciência de que o BB sempre foi uma boa moeda de troca”, reforça Bergo. 

Jason Vieira, economista-chefe da Infinity Asset, tem opinião diferente. Rubem Novaes é que era, na análise de Vieira, de certa forma, uma indicação política. Tinha ligação com a ala olavista (dos seguidores do guru Olavo de Carvalho) do governo. “Por isso, não creio que a saída dele abra espaço para o centrão, o qual não tem nenhum interesse em profissionais de alto nível que não sentem na cadeira para beneficiar A, B ou C.”

O que o mercado não deseja, diz Vieira, “é o retorno à velha política de presidencialismo de coalizão”. “Nesse quadro, acho que Hélio Magalhães, presidente do Conselho de Administração do BB, é o mais indicado para sentar sem traumas na cadeira de Novaes. Os outros que vêm sendo citados pela mídia também são bons”, reitera Jason Vieira.

Guedes, no entanto, já descartou Hélio Magalhães, porque o considera estratégico na função em que está hoje. Para André Perfeito, economista-chefe da Necton Investimentos, de tudo o que vem sendo ventilado, pouca coisa é consistente. “A única conversa que faz sentido é de que a mudança não significa enfraquecimento de Paulo Guedes. Pelo contrário”, afirma.

Quem assumir o comando do Banco do Brasil terá as demandas do governo. Novaes sai em meio a críticas do Planalto de que não teria entendido a missão do BB diante da mais grave recessão da história do país, mesmo diversas vezes cobrado para incentivar a liberação de empréstimos e financiamentos.

Se Guedes lançar mão da saída caseira, entre os principais cotados estão os vices-presidentes Carlos Hamilton (Gestão Financeira e Relações com Investidores), Walter Malieni (Negócios de Atacado), Carlos Motta (Varejo) e Mauro Ribeiro Neto (Corporativo).

Desfalques

A saída de figuras importantes do Ministério da Economia tem chamado a atenção. Primeiro foi o secretário Tesouro, Mansueto Almeida. “Vamos entrar em uma temporada de debandada. O ministro está tentando segurar, mas muita gente, como Novaes, não quer mais aturar certas coisas”, disse uma fonte do ministério, sem especificar, exatamente, a que se referia.

O diretor de Programas da Secretaria de Fazenda, Caio Megale, que entrou em janeiro, vai deixar o cargo na próxima sexta-feira, alegando motivos pessoais. Megale ocupou as funções de secretário de Desenvolvimento da Indústria, Comércio, Serviços e Inovação e de assessor de Paulo Guedes. Foi um dos responsáveis pela proposta de socorro a estados e municípios na crise do novo coronavírus.

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Analistas veem excesso de lives do BC

Rosana Hessel

28/07/2020

 

 

Às vésperas da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) marcada para 4 e 5 de agosto, que deve definir novo patamar para a taxa básica de juros, diretores do BC não param de realizar videoconferências com agentes financeiros e operadores do mercado.

O volume de lives chamando a atenção. Ontem, o diretor de Política Monetária, Bruno Serra, e o de Política Econômica, Fábio Kanczuk, áreas que costumam interagir com o mercado, tiveram reuniões virtuais com investidores. Na sexta-feira passada, apenas Kanczuk realizou quatro lives com o mercado financeiro.

As conversas são constantes, inclusive, com diretores de áreas técnicas, que são não interlocutores habituais dos agentes financeiros. Essa frequência elevada de falas da diretoria colegiada tem ajudado a aumentar a volatilidade da Bolsa de Valores de São Paulo (B3) e do câmbio, na contramão do que um órgão regulador deve fazer, segundo analistas.

O período de silêncio dos diretores do BC começa sempre na quarta-feira da semana anterior ao Copom e termina no dia de divulgação da ata da reunião, na terça-feira seguinte. A assessoria do órgão não comentou sobre o excesso de lives da diretoria.

Devido às últimas declarações de diretores, as previsões para a taxa básica da economia (Selic) estão convergindo apenas para um corte residual de 0,25 ponto percentual, o que resultaria no novo piso histórico de 2% ao ano. A dúvida é se o ciclo de cortes será fechado ou ainda haverá uma janela aberta para outras reduções.

O ex-diretor do BC Carlos Thadeu de Freitas Gomes, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), defende que a diretoria fale o menos possível. “O Bacen devia se resguardar. Ele precisa ser mais prudente, já que as informações sobre taxas de juros e câmbio mexem com todos os ativos”, afirmou. Ele lembrou que o Banco Central Europeu (BCE) e o Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos) têm evitado falas constantes como as do BC brasileiro.

“Esse excesso de falas deixa a impressão de que o BC baixou os juros desnecessariamente e, agora, não quer ou não pode subir, o que será um problema”, comentou o economista e ex-diretor do BC Carlos Eduardo de Freitas. Na avaliação dele, a Selic já está muito baixa e existe uma desconfiança de que há uma bolha na Bolsa.

A economista-chefe da ARX Investimentos, Solange Srour, também considerou excessivo o número de falas dos diretores do BC brasileiro. “Nesse período de crise, devido ao aumento da volatilidade, os diretores do Fed têm falado menos e unificado o discurso. Aqui, ocorre o contrário. Estão falando demais e assumindo que há divisão entre a diretoria, o que tem aumentando a volatilidade”, comparou.

“A situação é muito incerta, mas, como não há uma coesão no discurso, a comunicação do BC está confusa”, lamentou. Assim como Gomes, ela aposta em um corte na Selic de 0,25 ponto percentual na semana que vem.

De acordo com o economista Sidnei Nehme, da NGO Corretora de Câmbio, os diretores do BC tentam buscar massa crítica para medir o termômetro do mercado, mas o excesso de otimismo da equipe econômica e dos operadores da Bolsa preocupa.

“O Copom não incluiu no balanço de riscos uma segunda onda de contaminação da covid-19, mas o Brasil corre o risco de entrar nela sem ter saído da primeira. E, se isso vier, vai ser um desastre, com forte aumento do desemprego. Não é possível encontrar lastro em tanto otimismo”, alertou.