Correio braziliense, n. 20887 , 31/07/2020. Brasil, p.6

 

Isolamento poupou R$ 17,5 bi na saúde

Bruna Lima

Maria Eduarda Cardim

31/07/2020

 

 

Estudo revela que distanciamento social, além de ter evitado mais de um milhão de casos graves de covid-19, representa uma economia importante para o sistema hospitalar. Sem essa medida, país poderia estar com 13 milhões de infectados  

Diante de um isolamento social cada vez mais fraco, pesquisas mostram que a medida salvou vidas, mas também economizou dinheiro. A continuação de um estudo da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) aponta que o setor de saúde como um todo, público e privado, economizou, no mínimo, R$ 17,5 bilhões ao evitar mais de 1,095 milhão de casos graves do novo coronavírus por meio da quarentena aplicada desde o início da pandemia.

Na avaliação de Joilson Cabral, um dos pesquisadores responsáveis pelo levantamento e professor do programa de pós-graduação em economia regional e desenvolvimento da UFRRJ, a economia pode ser ainda maior, já que os autores levaram em conta o custo de uma diária de internação na unidade de terapia intensiva (UTI) do Sistema Único de Saúde (SUS), que é de R$ 1,6 mil. “Falamos que foi uma poupança para o setor de saúde como um todo, público e privado, adotando como premissa os gastos do SUS. O valor possivelmente é maior porque o gasto por um dia de internação na emergência do sistema privado é R$ 4.035 reais, por exemplo”, disse.

O especialista explica que a conta pode ter outras variações, como o número de dias que o doente precisaria ficar internado. “Em média, um paciente de caso grave fica 10 dias na UTI, logo calculamos que ele custaria R$ 16 mil ao sistema de saúde e multiplicamos isso pelo número de casos graves que foram evitados com o isolamento”, resumiu.

O estudo, que está na fase final de redação para ser enviado à uma revista acadêmica, tem como objetivo de mostrar a importância do isolamento social nas diferentes vertentes. “Os pneumologistas falavam muito que a medida era necessária para o achatamento da curva e para evitar o colapso do setor de saúde. Nós tentamos dar um cunho mais econômico”, explicou Joilson.

Pouco efetivo

De acordo com o estudo publicado pelos pesquisadores da UFRRJ, o país teria até 13 milhões de infectados e 118 mil mortos sem a aplicação das medidas de restrição social. No entanto, mesmo com a economia de vidas e diminuição de casos, o isolamento feito no país é visto como pouco efetivo. Enquanto o estudo mostra que o número de óbitos no Brasil seria cinco vezes maior sem as medidas restritivas, outras pesquisas indicam que, na Europa, o número de fatalidades seria 25 vezes maior caso não houvesse quarentena. “Isso mostra que o isolamento (na Europa) foi muito mais eficiente do que o nosso”, ressalta Joilson.

O professor acredita que o recurso poupado seria gasto em algum momento, mas indica que uma quarentena ainda mais eficaz do que o feito no país poderia criar um ambiente mais favorável para compras de insumos pelos gestores. “O que a gente pode concluir é que se o isolamento fosse bem-feito, os estados poderiam fazer suas contratações e compras de produtos em um ambiente mais favorável para eficiência dos gastos. Acredito que esse recurso seria gasto em algum momento, mas a gente poderia evitar a corrupção que vem ocorrendo nas compras de emergência, por exemplo”, avalia.

Para o pesquisador, a falta de um distanciamento social eficaz é resultado da falta de coordenação da pandemia de covid-19. “O STF (Supremo Tribunal Federal) disse que os governadores e gestores municipais tinham a competência de gerir o fechamento de atividades, mas essa gestão tem que ser coordenada e quem faz isso é o Ministério da Saúde. Algumas prefeituras necessitavam de uma ajuda para implementar o isolamento, por exemplo”, criticou.

________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

TCU quer fiscalizar uso de R$ 76 bilhões

Maíra Nunes

Bruna Lima

31/07/2020

 

 

Diante da disparada dos números da covid-19 no Brasil, explodem também suspeitas de fraudes em contratos ligados ao combate da pandemia em vários estados. Neste cenário, a Secretaria de Macroavaliação Governamental (Semag) do Tribunal de Contas da União (TCU) defende que a fiscalização dos repasses da União, que estão na casa dos R$ 76 bilhões, fique a cargo dos órgãos de controle federais — como o próprio TCU e a Controladoria-Geral da União (CGU) —, e não por conta dos Tribunais de Conta Estaduais (TCEs) e dos Municípios (TCMs).

Uma representação assinada pelo ministro do TCU Bruno Dantas argumenta que os recursos para enfrentamento do novo coronavírus devem ser contabilizados como despesas da União e não como transferências aos entes. Isso tiraria das mãos dos tribunais regionais o poder de monitorar o uso da verba, já que, na prática, possuem a fama de sofrer grandes interferências políticas dos gestores locais.

“A Semag defende que os repasses em questão teriam natureza jurídica federal, ademais de não possuírem os contornos jurídicos de recursos financeiros originários de entes subnacionais, constitucionalmente definidos”, diz o despacho do ministro.

Outra implicação seria retirar do governo federal a possibilidade de deduzir os gastos com a covid-19 do cálculo da Receita Corrente Líquida (RCL) do Governo Central, que é o somatório das receitas tributárias de um governo, em 2020. Segundo os técnicos do TCU, o possível impacto das deduções atípicas dos auxílios financeiros na metodologia de cálculo da RCL federal de 2020 deve superar os R$ 76 bilhões já aprovados e empenhados — “o que corresponde a 8,91% da RCL apurada no 1º quadrimestre de 2020. Soma-se a isso a frustração da arrecadação federal, com previsão de queda de 8,19% este ano”.

Outro ponto é que, diferentemente de atender à finalidade de reduzir as desigualdade sociais, característica típica dos fundos de participação dos estados e municípios, o repasse da União se concentra em locais com maior incidência de casos do vírus e não nas áreas mais pobres, dando a estados de alto poder aquisitivo uma grande parcela deste montante.

Por determinação do ministro do TCU Bruno Dantas, o Ministério da Economia, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), a Advocacia-Geral da União (AGU) e a Controladoria-Geral da União (CGU) têm 20 dias, a contar desde o último dia 20 de julho, para se manifestarem sobre os repasses bilionários. O objetivo do despacho é justamente promover um debate entre os órgãos federais diante do contexto inédito vivido e que “passou a suscitar uma série de discussões jurídicas acerca dos limites, competências, atribuições e responsabilidades executivas sobre as ações de enfrentamento à covid-19”.

20 dias

é o prazo dado pelo ministro Bruno Dantas ao governo para se manifestar sobre os repasses bilionários