Valor econômico, v.21, n.5049, 23/07/2020. Mundo, p. A17

 

EUA fecham consulado e elevam tensão com a China

Tsukasa Hadano

Ken Moriyasu

23/07/2020

 

 

Os EUA ordenaram que a China feche seu consulado em Houston em três dias no máximo. Segundo Washington, a medida visa defender os EUA. Pequim, porém, criticou o que chamou de “escalada sem precedentes” das tensões.

A porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Morgan Ortagus, disse que o fechamento visa “proteger a propriedade intelectual” e a informação confidencial americana, sem explicar por que o alvo foi o consulado em Houston.

A expectativa  agora se volta para possíveis medidas de retaliação da China. A agência de notícias Reuters informou ontem que Pequim avalia ordenar o fechamento do consulado dos EUA em Wuhan.

A ordem de fechamento do consulado em Houston ocorreu no mesmo dia em que o Departamento de Justiça dos EUA anunciou uma nova denúncia contra dois cidadãos chineses por suposta ciberespionagem contra fornecedores de produtos ou serviços de defesa do governo americano, pesquisadores do coronavírus e outros.

“A escolha do momento sugere que não se trata de coincidência”, disse James Carafano, professor-visitante de segurança nacional e de política externa na conservadora Heritage Foundation. “Os EUA estão emitindo um sinal de que os chineses estão passando dos limites com sua atividade recente.”

Na sua acusação, o Departamento de Justiça alegou que Li Xiaoyu, 34, e Dong Jiazhi, 33, realizaram uma campanha de ciberataque que começou em 2009, visando desde a pesquisa de vacina contra a covid-19 até senhas de e-mail de dissidentes chineses que moram nos EUA e em outros países. Os dois atuaram com o Ministério de Segurança de Estado da China em alguns casos, alega a denúncia.

Na noite de terça-feira, horas após o anúncio do fechamento, a polícia e os bombeiros de Houston receberam telefonema que relatava fogo no prédio do consulado chinês. “Foi observada fumaça numa área de pátio. Os policiais não foram autorizados a entrar no prédio”, disse a polícia. Imagens de vídeo mostraram pessoas, aparentemente funcionários, queimando o que parecia ser documentos.

No Texas fica a sede americana da Huawei Technologies. O Departamento de Estado americano acusa a gigante chinesa de telecomunicações de espionagem econômica e vem pressionando aliados dos EUA a não usarem equipamentos chineses em sua infraestrutura 5G.

Críticos da posição do presidente Donald Trump em relação à China descreveram a medida como arbitrária e contraproducente.

“Precisamos de uma estratégia inteligente, abrangente, para conter, dissuadir e engajar a China”, tuitou ontem o ex-embaixador americano na Rússia Michael McFaul. “Fechar consulados, porém, ajuda autocracias fechadas mais do que as democracias abertas.”

Wang Wenbin, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, criticou a ordem de fechamento como “provocação política” e “sabotagem deliberada” unilateral dos EUA. “A China condena [a medida] energicamente”, disse. “A China conclama os EUA a revogarem imediatamente a decisão equivocada. Caso contrário, dará a devida e necessária resposta.

Embora existam precedentes para determinar o fechamento de uma missão estrangeira - os EUA ordenaram que a Rússia fechasse seu consulado em San Francisco três anos atrás - esses atos são raros. O consulado em Houston é um dos mais antigos da China nos EUA. Foi aberto em 1979 após os países terem reatado relações.

“Esta é uma medida tresloucada”, tuitou Hu Xijin, editor do jornal em inglês “Global Times”, do Partido Comunista chinês.

Mas, se a China fechar a missão americana em Wuhan como retaliação, segundo Carafano, o impacto será muito menor para os EUA. “A perda de acesso a Houston para os chineses é muito maior.”

Além da ordem de fechamento segue, o governo Trump estaria estudando uma proibição que, se adotada, impedirá que membros do Partido Comunista Chinês e suas famílias viajem para os EUA.

“Os EUA não tolerarão violações de nossa soberania e intimidação da nossa população [pela China], assim como não toleramos as práticas comerciais desleais, o roubo de empregos americanos e outros comportamentos graves da China”, disse Ortagus. “O presidente Trump insiste em lealdade e reciprocidade na relação EUA-China.”

John Demers, secretário-assistente de Justiça dos EUA para assuntos de segurança nacional e a autoridade que fez as denúncias contra os dois cidadãos chineses, comparou a China à Rússia, ao Irã e à Coreia do Norte, ao acusar o país de tolerar e apoiar ciberataques.

A China entrou “na vergonhosa associação de países que oferecem um refúgio seguro para cibercriminosos em troca de esses criminosos ficarem ‘de prontidão’ para trabalhar em benefício do governo, nesse caso para alimentar a fome insaciável do Partido Comunista Chinês pela propriedade intelectual tão duramente obtida por empresas americanas e outras empresas não chinesas, inclusive sobre pesquisa contra a covid19", disse Demers no comunicado divulgado na noite de terça-feira.