Correio braziliense, n. 20889, 02/08/2020. Economia, p. 10

 

Negócios que reagem na contramão da crise

Vera Batista 

02/08/2020

 

 

A crise sanitária causada pelo novo coronavírus abalou o dia a dia dos cidadãos e das empresas de todos os setores da economia. Houve demissões em massa e muitos empreendimentos, alguns tradicionais, fecharam as portas. Outros, ao contrário, passado o primeiro susto, ampliaram os negócios e estão contratando funcionários. Executivos à frente das organizações de sucesso apontam que a fórmula para se equilibrar no mercado tem como base o princípio de que, não apenas nesse momento de contaminação pelo novo coronavírus, os desafios fazem parte da vida — e que renovação, investimentos em tecnologia e descoberta de novos nichos são permanentes.

Em meio à pandemia, Unigel, produtora de chapas de acrílico, reabriu fábricas de fertilizantes e estima contratar mais 1,5 mil empregados. “A oportunidade para crescer surgiu pela alta demanda por material plástico para equipamentos de proteção individual e contra a proximidade física — nas incubadoras de pacientes em hospitais, bloqueios em caixas de lojas, supermercados e farmácias, divisórias seguras para as empresas, entre outros produtos para agora e para o período pós-pandemia”, observa Wendel de Souza, diretor-geral e de operações comerciais da Unigel. Nas três unidades de produção (Cast, Omipa 1 e Omipa 2), no município de Candeias, interior da Bahia, foram 500 empregos diretos e indiretos, com estimativa de movimentação de cerca de R$ 5 milhões mensais na economia local.

Também serão reativadas as fábricas de fertilizantes da Petrobras na Bahia e em Sergipe, arrendadas por R$ 177 milhões, e que devem gerar pelo menos 1 mil empregos. “Nossa estratégia foi não demitir, mesmo quando o pavor tomou conta do mercado. Chegamos a interromper a atividade em alguns locais e dar férias coletivas, em março”, salienta Wendel. O faturamento caiu 70% em março e abril, e 25% em maio, em relação ao ano passado. Mas, em junho, o tombo foi menor, de 15%, no confronto com 2019.

“O diferencial foram os projetos encaminhados. Mantivemos o plano de negócios e, por isso, as vendas retomaram. Temos pedidos até o fim deste mês e a previsão é de que a demanda continue alta até dezembro”, sinaliza Wendell.

Qualificação

Em janeiro de 2021, mais 500 funcionários serão necessários, segundo ele. No entanto, para o executivo, o mercado de trabalho mudou para sempre. “Não haverá retorno ao antigo normal. O novo normal vai exigir qualificação da mão de obra e das empresas. A princípio, o desemprego vai subir e pequenas firmas desaparecerão”.

Independentemente do aumento de impostos para o setor de serviços (de 3,65% para 12% sobre o faturamento), com a fusão de dois tributos federais (PIS e Cofins), proposta pelo governo, a VestCasa, rede especializada em artigos de cama, mesa, banho e utilidades para o lar vai se expandir. Ahmad Yassin, fundador da rede, sobreviveu à covid-19 fechando 35 lojas, das 200. De março para cá, dispensou 250 profissionais.

Yassin conseguiu dar a volta por cima e está lançando o Clube VestCasa, no qual o cliente paga R$ 50 ao ano e tem acesso a descontos e promoções exclusivas. Com essa estratégia, repôs 150 novas vagas de trabalho. Outra saída que encontrou foi expandir a empresa por meio das megalojas, uma espécie de “atacarejo” –– que vende mercadorias no atacado e no varejo ––, segundo Yassin. Em junho, com a flexibilização, a VestCasa abriu três unidades de 10 mil m² em Boituva e Ibitinga (ambas cidades em São Paulo) e Guaramirim (SC). O plano é encerrar 2020 com 57 megalojas.

Sem exploração

Para passar de um cenário de demissão a um horizonte de contratação, foi preciso observar os movimentos dos clientes. Quando surgiram as notícias sobre os primeiros infectados no Brasil, a VestCasa vendeu álcool em gel e ração para animais a preço de custo, na contramão do caminho escolhido pelos concorrentes. Enquanto algumas lojas ofereciam meio litro do desinfectante a R$ 40, a VestCasa oferecia por R$ 8,79. “Não achávamos ético lucrar com um produto que, sabíamos, teria grande importância para evitar a propagação do vírus e, por consequência, salvar vidas”, explica Yassin.

A mesma medida foi tomada em relação às rações para bichos de estimação. Rações para cachorros eram encontradas por cerca de R$ 90, mas, na rede, custavam R$ 36,95. “Com isso, fidelizamos os clientes e também os pequenos empreendedores. Foi esse retorno que nos permitiu criar, agora, esses ‘atacarejos’ de produtos para casa e para pets”, conta o fundador da VestCasa. Em março, o faturamento da rede caiu 40%; em abril, registrou tombo de 95%; e, em maio, de 50%. “Em junho, a melhora foi sensível. Tivemos, pelo menos, o mesmo resultado de 2019”, assinala o empresário, de 40 anos.

“Sou descendente de libaneses. Trabalho desde cedo. E aprendi que, quem trabalha certo, com qualidade e competitividade, sai na frente. A receita é estar sempre preparado para a crise”, aconselha Yassin. Ele lembra que a empresa espera ajudar milhares de pessoas que perderam renda com a crise e encontraram no empreendedorismo o caminho para o sustento das famílias e a realização de sonhos. “As crises que estamos atravessando (de saúde e econômica) são gravíssimas e, infelizmente, teremos que conviver com elas por mais algum tempo. Mas, para superarmos os desafios, a cooperação entre todos será fundamental”. (Colaborou Jailson R. Sena)

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Direito e ondotologia, caminho aberto 

02/08/2020

 

 

Com 749 unidades espalhadas pelo Brasil, o Urbano Vitalino Advogados, escritório de advocacia empresarial, contratou mais de 100 profissionais e está com 10 vagas abertas na unidade de Recife.

“A expectativa é de crescimento de 35%, até dezembro, com os efeitos da pandemia. Ou seja, percebemos que aumentaram os litígios contra empresas de energia e as ações judiciais confidenciais por questões econômicas, como fusões e aquisições”, conta Christiano Sobral, diretor executivo do escritório.

Medidas do governo, como a que flexibilizou as regras do trabalho no estado de calamidade, também começam a render efeitos judiciais. “As demandas trabalhistas tomam força. Muitas empresas não conseguiram seguir corretamente as regras. Particularmente, percebo que os empregados iniciaram a busca por compensação”, afirma Sobral.

Estética

A rede de franquias Orthodontic, especializada em ortodontia –– que corrige a posição de dentes e do maxilar ––, viu o faturamento crescer 12,74%, na comparação entre junho de 2019 e junho 2020, e aumentou em 10% o número de clínicas no período. Com 242 unidades no Brasil (199 ativas e 43 em implantação), e há 18 anos no mercado, a rede foi criada em um contexto econômico tão difícil quanto o atual. A marca atende a mais de 4 milhões de pessoas e emprega mais de 7 mil no país. Segundo Fernando Massi, sócio-diretor da Orthodontic, no início de março, todas as unidades foram fechadas. Mas, em abril, reabriram.

“Nossa atividade é considerada de saúde e estética. Atendemos às classes C e D e, para evitar paralisações na manutenção dos aparelhos, ou inadimplência, fizemos planos de 36 prestações para que esse público não perdesse a oportunidade de bom tratamento da função mastigatória”, conta Massi. O auxílio emergencial de R$ 600 do governo para os mais carentes ajudou a manter os pagamentos em dia, explica.

Com a necessidade das companhias em simplificar ou mudar procedimentos para se adaptar ao momento, a tecnologia se mostrou eficaz e necessária para quem oferece serviço de administração de documentos. Fabrício Ramos, sócio da Lexio, uma legaltech (ou startup), percebeu um aumento da demanda para digitalizar contratos. Somente nos primeiros meses da pandemia, entre março e abril, a alta na procura foi de 31,5%, conta.

“O crescimento neste momento expõe que as pessoas estão atrás de ferramentas de facilitação, para agilizar todas as etapas dos processos e ter maior controle do que está sendo feito”, afirma Ramos.  (VB e JRS)