Título: Rose na mira da CGU
Autor: Lyra, Paulo de Tarso ; Braga, Juliana
Fonte: Correio Braziliense, 24/01/2013, Política, p. 2/3

Planalto decide enviar para a Controladoria-Geral da União o resultado da comissão de sindicância criada para apurar o envolvimento da ex-chefe de gabinete com a quadrilha. A medida resultará na abertura de um processo administrativo disciplinar

A Casa Civil decidiu enviar para a Controladoria-Geral da União (CGU) o relatório final da sindicância criada para investigar os envolvidos na Operação Porto Seguro e que pede a abertura de processo administrativo disciplinar (PAD) contra a ex-chefe do gabinete da Presidência em São Paulo Rosemary Noronha. Rose, como é conhecida, foi indiciada pela Polícia Federal por formação de quadrilha, corrupção ativa, falsidade ideológica e tráfico de influência.

O relatório final da sindicância, contudo, ainda não foi encaminhado porque não expirou o prazo dado pela própria Casa Civil para análise do material. A comissão, criada para investigar a ação da quadrilha dentro do Palácio do Planalto, concluiu seus trabalhos em 7 de janeiro. A partir de então, a Casa Civil estipulou um prazo de 20 dias corridos para analisar juridicamente as conclusões do grupo de apuração.

O governo criou várias comissões em diversas pastas para investigar os desdobramentos da Operação Porto Seguro, deflagrada a partir da denúncia de venda de pareceres técnicos e jurídicos nas agências reguladoras para beneficiar empresários que atuam nos setores regulados pelas agências.

Dentro do Planalto, contudo, os trabalhos foram conduzidos em duas frentes: além da comissão criada pela Casa Civil, a Secretaria de Controle Interno (Ciset), ligada à Secretaria-Geral da Presidência da República, também fez uma auditoria nos contratos firmados na área de portos e na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), dois dos principais focos de atuação da quadrilha.

Os integrantes da Ciset também investigaram a participação de Rose no esquema, pedindo, inclusive, informações sobre reuniões das quais ela participou no escritório da Presidência em São Paulo. Dentro da amostragem dos atos na Anac, foram rastreadas as ações do ex-diretor Rubens Vieira — indicado por Rose para o cargo — e da filha da ex-chefe de gabinete Mirelle Noronha.

Segundo apurou o Correio, Dilma determinou que a Casa Civil, sob o comando da ministra Gleisi Hoffmann, investigasse o tema, apesar da existência da Ciset, para evitar suspeitas de que a Secretaria-Geral, comandada por Gilberto Carvalho e, consequentemente, ligada ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tentasse diminuir o alcance das investigações.

Isenção Aliados da presidente não quiseram fazer juízo de valor sobre a isenção dos trabalhos, mas garantiram que “faz parte do perfil de Dilma pedir que mais de um agente investigue um assunto para ter total segurança dos resultados finais apresentados a ela”.

O próprio encaminhamento do relatório final para a CGU é uma prova de que a presidente Dilma incentiva a isenção nas investigações. A manobra evita interferência nas apurações realizadas pela Casa Civil. Especialistas em controle interno ressaltam o “status” alcançado pela Controladoria-Geral da União na apuração de irregularidades dentro do próprio governo — nos últimos 10 anos, mais de 4 mil servidores foram demitidos por suspeitas de irregularidades.

Ao ser aberto o processo administrativo disciplinar (PAD), os investigados têm direito ao contraditório — podendo, inclusive, constituir advogados para apresentação da respectiva defesa. Não há um prazo definido para a conclusão dos trabalhos. Os PADs recentes têm durado, segundo informações da CGU, cerca de oito meses.

Procurada pelo Correio, a Secretaria-Geral nega que haja qualquer auditoria em andamento na Ciset investigando Rosemary Noronha. Afirmou que o órgão atualmente revisa e monitora os atos administrativos da Anac, onde trabalhavam Rubens Paiva e Mirelle Noronha.

A pasta disse ainda que as investigações feitas na agência são “rotineiras” e não têm relação com a Operação Porto Seguro. Integrantes da base, contudo, afirmam que não há como dissociar a atuação da quadrilha, isolando a investigação dos atos cometidos pelos indiciados pela Polícia Federal.

A insistência de Dilma em avançar nas investigações sobre os integrantes da quadrilha que atuava nas agências reguladoras deve irritar ainda mais o PT. Petistas têm reclamado nos últimos meses de que a presidente agiu de maneira impulsiva ao exonerar Rose — que teve ligação próxima ao ex-presidente Lula —, minimizando os desdobramentos do caso. Segundo apurou o Correio, nas primeiras semanas após a deflagração da Operação Porto Seguro, a relação entre ambos ficou estremecida. Lula também criticou a atuação do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, na condução do caso.

Como funciona

O processo administrativo disciplinar (PAD) é o meio de apuração e punição de faltas graves dos servidores públicos e demais pessoas sujeitas ao regime funcional de determinados estabelecimentos da administração O PAD está previsto na Lei nº 8.112/1990 e obedece às seguintes fases: instauração; início do inquérito, que pressupõe: instrução, defesa e relatório; julgamento Se convencida da inocência do servidor, a comissão do PAD elaborará, diretamente, sem necessidade de indiciamento, o relatório final; Se, em caráter preliminar, apontar a provável responsabilidade administrativa do servidor, a comissão elaborará o termo de indiciamento. As penalidades disciplinares previstas são suspensão; demissão; cassação de aposentadoria ou disponibilidade; destituição de cargo em comissão Fontes: www.jus.com.br/revista e Manual do PAD – Controladoria-Geral da União

Memória Venda de pareceres

A Operação Porto Seguro da Polícia Federal, deflagrada em 23 de novembro do ano passado, investigou a venda de pareceres técnicos e jurídicos em agências reguladoras para empresários que tinham interesses em negócios nessas áreas. Foram presas seis pessoas e indiciadas outras 24 pelo Ministério Público.

Entre os envolvidos no caso apareceram a ex-chefe do escritório da Presidência da República em São Paulo Rosemary Noronha; o ex-chefe da Agência Nacional de Águas (ANA) Paulo Vieira; o ex-diretor da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) Rubens Vieira; e o ex-número dois da Advocacia-Geral da União José Weber Holanda Alves.

No dia seguinte à deflagração da operação, a presidente Dilma Rousseff exonerou todos os envolvidos no caso e pediu que os diversos órgãos abrissem comissões de sindicância para apurar a responsabilidade dos servidores. A Advocacia-Geral da União (AGU) determinou um pente-fino em todos os contratos assinados com base nos pareceres fraudulentos emitidos pelos integrantes da quadrilha.

O Congresso convidou os ministros da Justiça, José Eduardo Cardozo, e da AGU, Luís Inácio Adams, para prestar esclarecimentos sobre o tema. Cardozo foi às duas Casas, enquanto Adams compareceu em sessão conjunta com o colega de Esplanada na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.

A oposição continuou tentando a convocação de Rose, mas a base aliada manteve a blindagem para não constranger o ex-presidente Lula, com quem a ex-chefe de gabinete tinha uma forte ligação. Por um descuido dos aliados, o Senado aprovou o convite para que Rubens Vieira comparecesse à Casa. A data ainda não foi marcada. Paulo Vieira se mostrou disposto a ir ao Congresso.

As investigações apontaram ainda o envolvimento do deputado Valdemar Costa Neto com a quadrilha. O Correio revelou conversas telefônicas entre os irmãos Paulo e Rubem Vieira buscando estratégias de defesa para que Costa Neto escapasse da punição pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do mensalão. Ele acabou condenado a sete anos e 10 meses de prisão e pagamento de multa de R$ 1,08 milhão.

Invasão do Instituto Lula

» Moradores do assentamento Milton Santos, na região de Americana (SP), invadiram (foto) ontem a sede do Instituto Lula, em São Paulo. Criado pelo ex-presidente em 2005, o assentamento agrário reúne 68 famílias, que são ameaçadas de despejo. Cerca de 100 pessoas participaram da ocupação com o objetivo de pedir o apoio de Lula para manter as famílias no local. Elas exigem do governo federal a desapropriação da área por interesse social. Diretor do Instituto Lula, o ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência Luiz Dulci deu entrevista ontem sobre a invasão e disse que “a causa do movimento é justa”. Ele, entretanto, afirmou que a entidade ligada ao ex-presidente não tem poderes para interferir no caso. O presidente do instituto, Paulo Okamotto, esteve no local e conversou com os invasores. Ele ligou para o ministro do Desenvolvimento Agrário, Pepe Vargas, que contou já haver uma ação em defesa da permanência das famílias no assentamento. Okamotto disse que Lula ficou “chateado” com a ocupação do prédio. O líder petista teve que mudar a sua agenda de trabalho por conta da invasão.