Correio braziliense, n. 20895, 08/08/2020. Brasil, p. 5

 

Desmatamento ilegal sobe 34% em 12 meses

Simone Kafruni 

08/08/2020

 

 

Os alertas de desmatamento na Amazônia Legal, de 1º de agosto de 2019 a 31 de julho de 2020, atingiram a marca dos 9.205km², um aumento de 34,4% na comparação com os 12 meses anteriores, quando foram 6.844km², até então o maior número da série histórica. Os dados atuais, divulgados, ontem, pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), registraram o maior número de alertas dos últimos cinco anos.

Segundo o sistema Deter, do Inpe, o número total de avisos aos órgãos ambientais no período foi de 44.121. Os alertas são uma prévia dos dados que serão confirmados, até o final do ano, por outro sistema do Inpe, o Prodes –– este, sim, consolida o dado oficial de desmatamento na Amazônia e segue o calendário de agosto de um ano a julho do ano seguinte. Entre agosto de 2018 e julho de 2019, o Prodes mostrou que a Amazônia perdeu 10.129km², alta de 34% em relação ao ano anterior e o maior valor desde 2008.

“É um recorde trágico, que evidencia o completo descontrole sobre atividades ilegais na região e indica que a promessa do governo Bolsonaro em desmontar as políticas socioambientais, entre elas os mecanismos de combate ao desmatamento, está sendo colocada em prática”, apontou Raul Valle, diretor de Justiça Socioambiental do WWF-Brasil.

Enquanto os desmatadores agem rapidamente, a fiscalização nas mãos dos militares da operação Brasil Verde 2 anda a passos lentos. Mesmo com o dispositivo da Garantia da Lei e da Ordem (GLO) em pleno vigor, a atuação do governo no combate ao desmatamento  ilegal não surtiu efeito.

Segundo Valle, o desmatamento não vai diminuir apenas “com pirotecnia e palavras de ordem”. “Enquanto a sensação de impunidade continuar alta, vai subir. As pessoas enxergam claramente a contradição entre discurso e prática. De nada adianta mobilizar militares se, na outra ponta, o mesmo governo tenta anistiar invasores de terras públicas e pune fiscais do Ibama reconhecidos por atuarem contra infratores ambientais”, afirmou.

O desmatamento ocorreu em todos os estados da Amazônia Legal, mas foi pior no Pará, em Rondônia e no Mato Grosso. Entre os municípios da Amazônia Legal que mais desmataram nos últimos 12 meses estão Altamira (PA), com 717km²; São Félix do Xingu (PA), com 513km²; Porto Velho (RO), com 403km²; e Lábrea (AM), com 380km² sob alerta no período. Em julho, foram 1.654km² contra 2.255km² no mesmo período de 2019.

Pressão

O aumento descontrolado do desmatamento já vem causando problemas comerciais ao Brasil, manchando a imagem do país no exterior. Empresas estrangeiras anunciaram boicote aos produtos agropecuários e investidores prometeram a retirada de recursos de companhias que compram produtos de áreas abertas irregularmente.

Internamente, representantes dos maiores bancos comerciais do país foram ao coordenador do Conselho da Amazônia, o vice-presidente da República, Hamilton Mourão, cobrar medidas concretas para acabar com o desmatamento. O assunto já não é mais tratado pelo Ministério do Meio Ambiente desde que os militares tomaram para si a responsabilidade pelo combate ao desmatamento.

Esta semana, um grupo de 62 organizações não governamentais, entre elas o WWF-Brasil, elaborou uma lista de cinco medidas emergenciais para tentar conter o problema. O documento foi enviado ao Congresso Nacional e ao Parlamento Europeu, investidores e autoridades internacionais, como mostrou o Blog 4Elementos (https://blogs.correiobraziliense.com.br/4elementos/).

A carta pede ações rigorosas. Entre elas, a moratória do desmatamento da Amazônia Legal por, pelo menos, cinco anos, o endurecimento das penas a crimes ambientais e a retomada imediata do Plano de Acão para Prevencão e Controle do Desmatamento na Amazonia Legal.

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Para Mourão, acompanhamento é falho

08/08/2020

 

 

Após o Brasil indicar alta de 34% no desmatamento da Amazônia este ano em relação aos 12 meses anteriores, o vice-presidente Hamilton Mourão afirmou que os sistemas de monitoramento brasileiros “não são os melhores” e precisam ser aprimorados. Ele também disse que é preciso resolver o “problema fundiário” da Amazônia para controlar a devastação ambiental na região.

“Óbvio, temos que tratar do problema fundiário da Amazônia. Se não resolvermos, vamos continuar nesse eterno jogo de gato e rato em relação a índice de desmatamento”, disse o vice durante videoconferência, ontem.

Mourão também reforçou que existe pressão para o governo atuar para diminuir os índices de desmatamento. Os alertas do Deter, o Sistema de Detecção do Desmatamento em Tempo Real do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), devem fechar em mais de 9.170km² para o período de agosto de 2019 a julho de 2020. O valor indica um avanço de 34% na devastação em relação ao período anterior, o maior desde 2016.

“Há muito desencontro, porque nós temos uns sistemas de monitoramento que não são os melhores. Se ressente de uma melhor qualidade, é uma tarefa que nós precisamos avançar”, defendeu Mourão, para acrescentar.

“Os satélites que nós temos são satélites óticos, que não enxergam durante período das chuvas, não enxergam durante o período de nuvens. Precisamos avançar para ter uma tecnologia radar, temos aeronaves não tripuladas de melhor nível, em que possam manter um acompanhamento da situação da cobertura vegetal com melhor qualidade, do que só pura e simplesmente a imagem satelital”