Correio braziliense, n. 20900, 13/08/2020. Cidades, p. 18

 

Fila de espera por vaga especial

Alan Rios 

13/08/2020

 

 

O acesso à saúde em meio à pandemia preocupa as autoridades de saúde e a população do Distrito Federal. A espera por vagas em leitos de unidade de terapia intensiva (UTI), por exemplo, chega a até sete dias. Na manhã de ontem, a lista da Sala de Situação da Secretaria de Saúde mostrava que um paciente com covid-19 aguardava a uma semana a transferência para uma vaga especial. Esse era o quadro mais crítico, resolvido no começo da tarde, após denúncia do Correio. Porém, o documento indica que mais 45 pessoas aguardam esse leito na capital, contabilizando apenas infecções ou suspeita da doença. Somando com pacientes que enfrentam outras enfermidades, a lista de espera por uma UTI tem hoje 115 nomes. Um deles está no aguardo desde 30 de julho.

A avaliação médica de cada caso indica o grau de prioridade do paciente, separando-os nos níveis 1, 2, 3, 4A e 4B. No total, 35 pessoas com covid-19 ou suspeita são dos dois graus de maior prioridade (1 e 2), o que aumenta a urgência pelo leito adequado. O vice-presidente da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, Alexandre Cunha, alerta que deixar pacientes esperando leito fora da UTI aumenta a mortalidade. “Pacientes com indicação de UTI não podem esperar por leitos. Eles são críticos, precisam de monitorização contínua, reavaliações com alta frequência e suporte de equipamentos e drogas que só podem ser feitos em uma UTI. Além disso, precisam de uma equipe acostumada a lidar com as peculiaridades desses casos”, explica.

Entre as estatísticas da lista de espera, passam histórias de moradores do DF que perderam a batalha para o vírus enquanto aguardavam uma UTI, como José Pereira, 72 anos. A filha, Luciana Dias, 27, conta que o pai enfrentava uma arritmia cardíaca enquanto estava internado, mas não conseguiu o atendimento necessário. “Ele morava em Sobradinho, então, quando sentiu os sintomas da doença, foi para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Sobradinho 2. Lá, ficou seis dias internado, e eu tive de levar até remédio, porque a médica dizia que não tinha. Depois, ele foi encaminhado ao Hospital de Campanha do Mané Garrincha, onde colocaram uma máscara para melhorar a oxigenação. Disseram que ele passaria por exames e informaram sobre um problema no coração”, relata a advogada.

Luciana lembra que conseguia falar com o pai por televisitas, auxiliadas pelos assistentes sociais do hospital, mas que se surpreendeu com a piora repentina. “A médica disse que não tinha cardiologista de prontidão para o caso dele, então, ele teria de ser transferido. Os resultados dos exames estavam muito ruins, e ele chegou a ser intubado”, detalha. Em 25 de julho, os médicos chamaram a filha ao hospital e relataram o óbito. “Eles falaram o que meu pai precisou de uma UTI, mas que não tinha conseguido, porque era necessário o exame mostrando a infecção do coronavírus, que demorou oito dias para ficar pronto e mostrar que estava positivo”, lamenta.

José Pereira era servidor público aposentado. Técnico de enfermagem, ele trabalhou por mais de 10 anos no Hospital das Forças Armadas (HFA) e passou pelo Hospital Regional de Sobradinho. “É uma situação horrível, fiquei em estado de choque. Vi falta de humanidade, porque nem me falaram que ele estava precisando do leito, só contaram depois. O meu pai trabalhava na área da saúde e não conseguiu uma UTI no fim da vida”, desabafou Luciana.

Redirecionamento

O subsecretário de Vigilância à Saúde, Eduardo Hage, negou que exista uma longa fila de espera para UTI no Distrito Federal. “Há casos de pacientes que estão em um leito de UTI e evoluem para quadros de saúde que dependem de suporte específico: cardíaco, neurológico, entre outros. Os pacientes são regulados pela Central de Regulação até o direcionamento a esses leitos. Hoje, 34 pacientes aguardam transferência, dos quais apenas sete não estão em leitos de UTI. É bom frisar que a data que aparece na lista refere-se ao dia de internação do paciente e, portanto, não é a data de quando ele aguarda o leito. O tempo, em média, para o redirecionamento desses casos não está passando de 48 horas”, disse. (Colaborou Jéssica Eufrásio)

No detalhe

Lista de espera por leitos de UTI para covid-19

45 pacientes aguardam leitos

15 estão no estágio mais grave entre os graus de prioridade

24 ocupam leitos comuns e precisam ser levados para a UTI

21 estão em UTI, mas precisam da transferência para leitos específicos

77,6% do total estão ocupados

15,9% ficam ocupados, em média, por mais de 16 dias

5 hospitais têm vagas em leitos de UTI com suporte para hemodiálise

8 unidades de saúde estão com todos os leitos de UTI com suporte para hemodiálise ocupados

Ocupação de leitos privados de UTI para covid-19 

93,9% do total de leitos de adultos estão ocupados

8 hospitais têm pelo menos uma vaga em leitos de UTI

12 unidades de saúde não têm uma vaga em leitos de UTI