O globo, n. 31756, 17/07/2020. País, p. 6
Alckmin é indiciado por caixa 2, lavagem de dinheiro e corrupção
Cleide Carvalho
17/07/2020
Os crimes teriam sido cometidos em obras do Rodoanel e do Metrô de São Paulo, segundo a PF: ex-governador nega
O ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB) foi indiciado ontem pela Polícia Federal por suspeita de caixa 2 eleitoral, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A investigação se baseou em delações de executivos da Odebrecht, que fechou acordo com o Ministério Público Federal em 2016. Alckmin nega, diz nunca ter recebido “um centavo de dinheiro público” e reclama de não ter sido ouvido.
Segundo a Polícia Federal, a investigação foi concluída e, além da colaboração dos executivos da empreiteira, foram colhidas provas em sistemas de informática e analisados extratos telefônicos, além de conversas por telefone e por meio do aplicativo Skype. Os crimes, afirma a PF, teriam sido cometidos em obras do Rodoanel e do Metrô de São Paulo.
Também foram indiciados Marcos Monteiro, ex-tesoureiro do PSDB, e Sebastião Eduardo Alves de Castro, advogado, que teria atuado para recebimento de valores da Odebrecht. A investigação faz parte da Lava-Jato que ocorre no âmbito da Justiça Eleitoral. Alckmin foi governador de São Paulo em dois períodos, de 2001 a 2006 e de 2011 a 2018.
As investigações foram iniciadas em 2017. Em abril de 2018, Alckmin deixou o governo do estado para concorrer à presidência, perdeu o foro privilegiado no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o caso foi enviado à Justiça Eleitoral de São Paulo. Seu nome apareceu na delação de três executivos da Odebrecht. Benedicto Júnior, que atuava no departamento de Operações Estruturadas, conhecido como “departamento de propina”, disse que a empreiteira repassou R$ 10,3 milhões para as campanhas de 2010 e 2014, sem registro na Justiça Eleitoral, o que configura caixa 2 eleitoral.
Nas planilhas da Odebrecht, Marcos Monteiro era identificado pelo codinome de “M&M”. Segundo as delações, os pagamentos foram feitos em dinheiro, em nove ocasiões, a um emissário de Monteiro, que se identificava por meio de senhas como “Marceneiro”, “Cedro”, “Pudim” e “Tesoura”. As quantias variaram de R$ 300 mil a R$ 1,5 milhão e a empreiteira chegou a usar transportadoras de valores. No total, foram cerca de R$ 8 milhões. Duas entregas, feitas em 7 de agosto de 2014 e 11 de setembro de 2014, ocorreram num hotel no bairro de Moema, em São Paulo.
Nas eleições de 2010, o repasse da empreiteira somou R$ 2 milhões e teria sido feito, segundo os delatores, com a intermediação de Adhemar Ribeiro, cunhado de Alckmin. Ribeiro não foi indiciado porque tem mais de 70 anos e possíveis crimes já prescreveram. O inquérito foi encaminhado ao Ministério Público de São Paulo, que pode arquivar a denúncia, pedir novas diligências ou denunciar à Justiça.
Alckmin diz que não foi ouvido, mas que prestará contas. Ressaltou que não recebe “um centavo de dinheiro público.” Os advogados do ex-governador afirmaram, em nota, que o indiciamento é precipitado e injustificável, pois feriu o direito do contraditório e da ampla defesa. “O ex-governador sequer foi chamado a prestar esclarecimentos que poderiam ter evitado o seu indevido e imerecido indiciamento”, disseram.
As defesas de Monteiro e Castro se manifestaram ao jornal “O Estado de S.Paulo”. A de Monteiro diz que seu cliente não foi ouvido, se colocou à disposição das autoridades e afirmou que confia que a Justiça avaliará corretamente os fatos. A de Castro informou que só tomou conhecimento pela imprensa e que seu cliente nega quaisquer ilícitos.
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), disse por meio do Twitter que tem “convicção de que o ex-governador Geraldo Alckmin saberá esclarecer todos os pontos levantados sobre doações de campanha eleitoral. A trajetória de Alckmin é marcada pelo compromisso com valores éticos e dedicação à causa pública.”
MAIS UM ABALO NO PSDB
O presidente do diretório municipal do PSDB, Fernando Alfredo, afirmou em nota que Alckmin sempre levou uma vida modesta e de dedicação ao serviço público. “É uma referência de correção e retidão na vida pública. Tem toda a confiança do PSDB”. O diretório estadual do PSDB também se manifestou em nota assinada pelo presidente estadual Marco Vinholi. “A história do governador Geraldo Alckmin não deixa dúvidas sobre a sua postura de retidão, coerência e compromisso com o rigor da lei”.
Este é o segundo abalo recente do PSDB. No começo do mês, o ex-governador José Serra e sua filha Verônica Serra foram denunciados pelo Ministério Público Federal, também com base na Lava-Jato. O tucano foi acusado de lavagem de dinheiro de obras do Rodoanel, entre 2006 a 2014, por meio de contas no exterior.