O globo, n. 31757, 18/07/2020. País, p. 6
Farda no governo
Vinicius Sassine
18/07/2020
Gestão Bolsonaro mais que dobrou presença de militares em cargos civis
A quantidade de militares da ativa e da reserva que ocupam cargos civis no governo mais do que dobrou nos dois primeiros anos da gestão de Jair Bolso naro. Éo que revela um levantamento do Tribunal de Contas da União (TCU), concluído ontem. Em 2018, havia 2.765 militares em cargos civis da administração federal. Em 2019, o número chegou a 3.515. E, em 2020, o total chegou a 6.157, com um aumento de 122%. O levantamento mostra pela primeira vezo tamanho da militarização no governo. A expansão da presença das Forças Armadas na administração federal tem sido objeto de críticas de adversários de Bolsonaro, e também de preocupação do comando militar da ativa, no sentido de que eventual desaprovação à atual gestão contamine e avaliação sobre as Forças. Setor mais crítico no atual momento por causa das dezenas de milhares de mortes decorrentes da pandemia de coronavírus, a Saúde é comandada interinamente pelo general do Exército Eduardo Pazuello, o único da ativa no primeiro escalão do governo. Cerca de um terço do total (1.969 militares da reserva) atua no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Eles têm contratos temporários que foram assinados como parte de uma estratégia para reduzir a fila de processos de aposentadoria e outros benefícios. Antes de 2020, no período considerado na comparação, não havia esse tipo de contratação.
Um dos aumentos mais expressivos ocorreu entre militares que passaram a ocupar cargos comissionados. Eram 1.965 em 2016, número que foi caindo até 2018, para 1.934. Já no primeiro ano do governo Bolsonaro, a quantidade subiu para 2.324, um aumento de 20%. Neste ano, são 2.643 militares ocupando esses cargos, ou 34,5% a mais. A quantidade de militares que acumulam cargos de profissionais de saúde na esfera civil quase dobrou no período: de 642 para 1.249. Entre os professores, houve uma pequena redução, de 197 em 2016 para 179 neste ano. O levantamento inclui ainda 37 militares que acumulam a função com cargos temporários e outros 72 que foram para a reserva antes de dezembro de 1998 e acumulam outros cargos, como era permitido até aquela data.
PRESENÇA INÉDITA
Uma outra novidade do governo Bolsonaro, segundo os dados dos últimos cinco anos, é a presença de militares em conselhos de administração de estatais, função pela qual recebem pagamentos adicionais, e em “cargos na alta administração” do Executivo. Oito militares estão nessas posições. Nenhum as ocupou desde 2016, afirma o tribunal. O levantamento sobre o tamanho da presença de servidores da caserna em cargos civis do governo foi feito a pedido do ministro do TCU Bruno Dantas. Os dados foram repassados ao presidente da Corte, José Mucio Monteiro, e enviados aos gabinetes de todos os integrantes do tribunal. Caso algum deles entenda ser necessário adotar alguma providência, como uma auditoria ou questionamentos sobre possíveis irregularidades das contratações, poderá fazer um pedido nesse sentido. Na última semana, o ministro Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) formalizou sua ida para a reserva. Ele faz a articulação política do governo e havia insatisfação entre os pares com tal atuação por parte de um militar da ativa. Bolsonaro também é pressionado a afastar Pazuello da Saúde. Há uma semana, o ministro do STF Gilmar Mendes mostrou que a pressão vai além das Forças: ele declarou que a presença de Pazzuello e outros militares na pasta, há dois meses, associava o Exército a um “genocídio” pela Covid-19. Em transmissão ao vivo na internet anteontem, Bolsonaro rebateu críticas:
—É proibido militar entrar na política? É proibido militar assumir funções no nosso governo? Não.