Título: Receio na doação de pele
Autor: Mader, Helena; Mariz, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 02/02/2013, Brasil, p. 8

O custo anual de R$ 20 milhões no atendimento às vítimas de incêndio é subestimado. Se fosse considerada a manutenção de estruturas importantes envolvidas na assistência aos feridos, a cifra seria bem maior. O serviço de transplante de pele, por exemplo, é um item crucial para grande parte das vítimas. Apesar disso, o Brasil ainda engatinha no que diz respeito a bancos com tecidos disponíveis. Não foi surpresa para os médicos que o país tenha recorrido a doações feitas por Argentina e Chile após a tragédia de Santa Maria.

“A demanda é maior que a oferta. Temos muito menos pele do que precisamos”, afirma David Gomes, chefe da Unidade de Queimaduras do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo. Além do banco paulista, há um em Porto Alegre e outro no Recife, de acordo com a Sociedade Brasileira de Queimaduras. “São pouquíssimos para uma população do tamanho do Brasil. Na Argentina tem seis. Estados Unidos, cerca de 60”, afirma Maria Cristina Serra, presidente da entidade.

Uma das grandes dificuldades de aumentar esse número é a recusa dos familiares de doadores de órgãos em autorizar a retirada da pele. Dados do Registro Brasileiro de Transplantes mostram que, de janeiro a setembro de 2012, houve 32 doadores do tecido no Brasil. No caso de órgãos sólidos, os números do mesmo período são bem maiores. Foram 168 doadores de coração, 49 de pulmões e 90 de pâncreas. “Os familiares acham que vamos desfigurar a pessoa, arrancando toda a pele, quando na verdade retiramos camadas superficiais de áreas não expostas”, diz David Gomes.

Para ele, seria necessária uma campanha que estimulasse a doação. A resistência de familiares também ocorre em relação a ossos. O médico destaca que o Brasil precisa investir em laboratórios de pele. David comenta que, enquanto outros países estão avançados na produção do insumo , aqui as iniciativas ainda são tímidas. “Você tem algumas experiências muito iniciais. É preciso avançar”, afirma o médico.

Os serviços de reabilitação, que envolvem o atendimento ao paciente depois que ele sai do estado crítico, também têm custos elevados. “As pessoas queimadas ficam com uma espécie de morte social. Por isso as unidades de assistência precisam ter gente preparada, como assistente social, psicólogo. Essa parte do tratamento é muito importante, não deve ser negligenciada”, diz Maria Tereza.