O globo, n. 31754, 15/07/2020. País, p. 12
Militares e centrão pressionam Bolsonaro por troca na saúde
Natália Portinari
Daniel Gullino
15/07/2020
Cobrança por saída de Pazuello ocorre em meio ao embate entre Gilmar Mendes e integrantes das Forças Armadas
Em meio aos recentes embates entre militares que integram o governo e o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente Jair Bolsonaro vem sendo pressionado pela ala militar e pelo centrão a escolher o sucessor do atual ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. Interino no cargo, o general da ativa tem dito a aliados que já está de saída do ministério e que quer voltar à carreira nas Forças Armadas para se aposentar como general quatro estrelas.
Na semana passada, Bolsonaro disse a jornalistas que Pazuello “é um nome que n ão va i ficar para sempre ”e que“ já deu uma excelente contribuição ”. Desde o início, o plano era que ele ficasse à frente da pasta durante a crise do coronavírus, mas depois voltasse para o Exército. Pazuello assumiu o cargo em maio, depois da saída de Nelson Teich.
A pressão para a trocado ministro aumentou neste fim de semana. No sábado, Gilmar Mendes disse que o Exército se associou a um “genocídio”, em alusão à condução do governo Bolsonaro frente à epidemia da Covid-19. O Ministério da Defesa classificou a declaração de “leviana” e, ontem, enviou uma representação para a ProcuradoriaGeral da República. Caberá ao procurador-geral, Augusto Aras, decidir se abre uma investigação ou arquiva o caso.
O episódio, no entanto, reforçou a opinião da ala militar do Palácio do Planalto de que Pazuello deve ser substituído, para que não haja associação entre a gestão na Saúde e o Exército brasileiro.
No Congresso, líderes de partidos do centrão se desentenderam com o ministro da Saúde após a publicação de uma portaria distribuindo a estados e municípios verbas para o combate ao coronavírus. Parlamentares se queixaram de que os repasses não atenderam as indicações prometidas pelo governo, criticando o ministério pela falta de experiência em lidar com políticos.
— Não há motivo para desgaste nesse caso. Pazuello acertou, já que seguiu critérios técnicos e não políticos — argumentou o senador Eduardo Gomes (MDB-TO), líder do governo no Congresso.
GILMAR E MOURÃO
O prazo para a permanência do ministro interino é agosto, segundo integrantes do governo. Caso queira continuar depois disso, integrantes da ala militar defendem que ele vá para a reserva — o que Pazuello já sinalizou que não quer fazer, já que ainda é general três estrelas.
Enquanto o impasse não é resolvido, segue acrise que teve como origem a declaração de Gilmar sobre presença das Forças Armadas na Saúde. Ontem, o vice-presidente Hamilton Mourão cobrou uma retratação do ministro:
— Com certeza (tem que pedir desculpas). Se ele tiver grandeza moral, tem que se retratar.
Em nota, Gilmar afirmou que respeita as Forças Armadas e que a sua crítica foi restrita à participação na Saúde. O ministro do STF acrescentou que que as Forças Armadas, “ainda que involuntariamente”, estão sendo chamadas a cumprir uma missão “avessa ao seu importante papel enquanto instituição permanente de Estado”. O ministro disse não ter atingido a honra do Exército, da Marinha ou da Aeronáutica e destacou que apenas refutou “a decisão de se recrutarem militares para a formulação e a execução de uma política de saúde que não tem se mostrado eficaz para evitar a morte de milhares de brasileiros”.
Ao deixar o Palácio do Planalto,Mourão disse que a nota divulgada por Gilmar não tinha “nada a ver” e não era suficiente. O vice-presidente voltou a dizer que o ministro do STF deveria pedir ele deveria pedir desculpas, se tiver “grandeza moral”.