O globo, n. 31753, 14/07/2020. País, p. 7

 

Serra ganha solidariedade tucana após denúncia

Silvia Amorim

14/07/2020

 

 

PSDB deve se abster de um processo interno contra o senador de 78 anos, acusado à Justiça pela Lava-Jato por suposto crime de lavagem de dinheiro; para aliados, situação é diferente do caso de Aécio Neves, sobre quem haveria mais provas

 A de­nún­cia apre­sen­ta­da pela for­ça-ta­re­fa da La­va-Ja­to na se­ma­na pas­sa­da con­tra o se­na­dor Jo­sé Ser­ra por la­va­gem de dinheiro te­rá um en­ca­mi­nha­men­to po­lí­ti­co no PSDB di­fe­ren­te da­que­le des­ti­na­do ao ex-se­na­dor e atu­al de­pu­ta­do fe­de­ral Aé­cio Ne­ves, no ano pas­sa­do. En­quan­to o ca­so do mi­nei­ro le­vou se­to­res da le­gen­da, es­pe­ci­al­men­te em São Pau­lo, a tra­ba­lhar por sua ex­pul­são, des­ta vez Ser­ra tem ti­do a so­li­da­ri­e­da­de dos co­le­gas de si­gla.

Pas­sa­dos al­guns di­as des­de o sur­gi­men­to da de­nún­cia, nin­guém su­ge­riu nem em con­ver­sas re­ser­va­das ini­ci­ar con­tra o se­na­dor al­gum pro­ces­so pa­ra afas­tá-lo ou le­vá-lo ao Con­se­lho de Éti­ca do par­ti­do — con­se­lho este que com­ple­ta­rá um ano em ju­lho sem ter jul­ga­do ne­nhum fi­li­a­do. No ca­so de Aé­cio, o pro­ces­so in­ter­no foi ini­ci­a­do, mas ar­qui­va­do pela Exe­cu­ti­va tu­ca­na an­tes mesmo de ser apre­ci­a­do.

Ape­sar de ad­mi­ti­rem que o epi­só­dio Ser­ra apro­fun­da o des­gas­te de ima­gem do PSDB com mais uma li­de­ran­ça nas pá­gi­nas po­li­ci­ais do no­ti­ciá­rio, po­lí­ti­cos ou­vi­dos pe­lo GLO­BO afir­mam que o ca­so do se­na­dor de SP é di­fe­ren­te do mi­nei­ro e, por is­so, de­ve re­ce­ber tra­ta­men­to di­fe­ren­te.

Aé­cio Ne­ves foi fla­gra­do nu­ma con­ver­sa com o em­pre­sá­rio Jo­es­ley Ba­tis­ta, do gru­po J&F, pe­din­do dinheiro. O diá­lo­go foi gra­va­do pe­lo em­pre­sá­rio e en­tre­gue ao Mi­nis­té­rio Pú­bli­co Fe­de­ral. Sua di­vul­ga­ção trou­xe um pro­fun­do des­gas­te po­lí­ti­co ao mi­nei­ro e ao par­ti­do, ain­da que Aé­cio ne­gue ter co­me­ti­do ilí­ci­tos. Já a de­nún­cia con­tra Jo­sé Ser­ra afir­ma que ele va­leu-se de seu car­go e in­fluên­cia po­lí­ti­ca pa­ra re­ce­ber pro­pi­na da Ode­bre­chet por meio de uma so­fis­ti­ca­da re­de de no ex­te­ri­or — es­que­ma que te­ria con­ta­do com a par­ti­ci­pa­ção da fi­lha de­le, Verô­ni­ca. O se­na­dor tam­bém ne­ga as acu­sa­ções.

RE­LA­ÇÃO COM DO­RIA

Pa­ra tu­ca­nos, no en­tan­to, a de­nún­cia con­tra Ser­ra não apre­sen­ta pro­vas de en­vol­vi­men­to di­re­to de­le no cri­me de la­va­gem de dinheiro. A ida­de e a con­di­ção de saú­de do se­na­dor são ou­tros fa­to­res que in­flu­en­ci­a­ram na re­a­ção ame­na dos tu­ca­nos sobre a de­nún­cia da La­vaJa­to. Ser­ra es­tá com 78 anos e tem apre­sen­ta­do uma con­di­ção fí­si­ca de­bi­li­ta­da. Ele já ca­mi­nha com al­gu­ma di­fi­cul­da­de, tem a au­di­ção um pou­co pre­ju­di­ca­da e te­ve câncer na prós­ta­ta em 2018.

Por úl­ti­mo, há um as­pec­to po­lí­ti­co. Ser­ra já não é ame­a­ça a nin­guém no par­ti­do, não há pla­nos que ame­a­çam o pro­je­to dos no­vos lí­de­res do PSDB e, por­tan­to, is­so o aju­da a não ter ad­ver­sá­ri­os in­ter­nos.

O go­ver­na­dor de São Pau­lo, João Do­ria, tem uma re­la­ção de pro­xi­mi­da­de pro­to­co­lar com o se­na­dor, com quem tro­ca te­le­fo­ne­mas es­po­rá­di­cos. O go­ver­na­dor de­mons­tra ter res­pei­to pela tra­je­tó­ria po­lí­ti­ca de Ser­ra quan­do fa­la de­le com au­xi­li­a­res. A dis­cre­ta re­a­ção que ado­tou em re­la­ção à de­nún­cia con­tra o se­na­dor na sex­ta-fei­ra pas­sa­da foi re­sul­ta­do de to­dos es­ses fa­to­res e mais um: o pau­lis­ta apren­deu no epi­só­dio Aé­cio que não é do­no do par­ti­do.

Em agos­to do ano pas­sa­do, o gru­po de Do­ria foi der­ro­ta­do na Exe­cu­ti­va Na­ci­o­nal na ten­ta­ti­va de afas­tar o de­pu­ta­do mi­nei­ro da si­gla. De fo­ra de São Pau­lo, tu­ca­nos di­zem que, se qui­ses­se re­pe­tir a do­se com Ser­ra, o go­ver­na­dor pau­lis­ta ca­va­ria uma der­ro­ta ain­da mais aca­cha­pan­te.

UNI­DA­DE IN­TER­NA

Além dis­so, des­de a elei­ção pre­si­den­ci­al de 2018, o PSDB nun­ca es­te­ve tão ali­nha­do in­ter­na­men­te. Com ex­ce­ções pon­tu­ais, to­dos no par­ti­do en­con­tra­ram um ini­mi­go em co­mum: Bol­so­na­ro. O dis­cur­so da neu­tra­li­da­de que o par­ti­do ado­tou nos pri­mei­ros me­ses de go­ver­no caiu por ter­ra e a si­gla assume hoje pa­pel de opo­si­ção ao pre­si­den­te sem sub­ter­fú­gi­os.

Is­so aju­dou a unir as di­fe­ren­tes li­de­ran­ças tu­ca­nas, dos “ca­be­ças bran­cas” aos “ca­be­ças pre­tas”. As ex­ce­ções são os se­na­do­res Roberto Ro­cha, que é lí­der do PSDB no Se­na­do, e Izal­ci Lu­cas. Am­bos fler­tam com Bol­so­na­ro. Ro­gé­rio Ma­ri­nho, que vi­rou mi­nis­tro do De­sen­vol­vi­men­to Re­gi­o­nal no iní­cio des­te ano, pe­diu des­fi­li­a­ção do PSDB.