Título: Nem um copinho de cerveja
Autor: Bernardes, Adriana
Fonte: Correio Braziliense, 02/02/2013, Cidades, p. 23

Pesquisa feita pelo Correio com o auxílio do bafômetro confirma que até mesmo 200ml da bebida são suficientes para a prisão do motorista flagrado em uma blitz

Um único copo de cerveja vale a suspensão da carteira de motorista por um ano, além do pagamento de multa de R$ 1.915,40? Essa é a pergunta que todo condutor deve fazer antes de se arriscar pelas ruas depois de ingerir qualquer quantidade de bebida alcoólica. E é bom não confiar no metabolismo do organismo, baseado na altura, no peso e no hábito de beber. O álcool pode demorar a evaporar mais tempo do que se imagina. E com a tolerância zero regulamentada pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran) nesta semana, qualquer vestígio rende punição pesada para o infrator.

A novidade era prevista em lei, mas só foi regulamentada agora. Além disso, traz de volta a polêmica do bombom de licor. Afinal, depois de comer a guloseima, o cidadão corre o risco de ir parar na delegacia acusado do crime de dirigir embriagado? E o enxaguante bucal, também é detectado pelo bafômetro? Para responder a esses e a outros questionamentos, o Correio foi às ruas na tarde da última quinta-feira em busca de voluntários para fazer o teste. E os resultados surpreenderam muita gente.

Com a ajuda de dois arquitetos, uma auxiliar de serviços gerais, uma agente administrativo e uma equipe de fiscalização do Departamento de Trânsito (Detran), a reportagem promoveu o exame do bafômetro antes e após um participante ingerir um único copo de cerveja; outro, um bombom de licor; e o último lavar a boca com enxaguante bucal (leia ilustração).

No caso da cerveja, ficou evidente que os efeitos da bebida realmente dependem do organismo de cada um. E não há receita. Aquela história de que as características da pessoa a deixam mais resistente não é suficiente para isentá-la do teste positivo do bafômetro. Nesse caso, o exame foi feito com um homem e uma mulher. Ambos bebem socialmente, mas tiveram resultados completamente diferentes. Após ingerir um copo de cerveja, a agente administrativo Rejiane da Silva Alves, 23 anos, assoprou o aparelho e o resultado foi 0,34mg/l de ar expelido dos pulmões. “Nossa, deu isso tudo?”, disse, surpresa.

Seria o suficiente para ela ser punida administrativa e criminalmente, com o recolhimento da habilitação, a retenção do veículo até a chegada de alguém apto a dirigir, multa de R$ 1.915.40 e a suspensão do direito de dirigir por 12 meses. Além disso, Rejiane seria levada para a delegacia. Rejiane repetiu o teste duas vezes. E, nove minutos após o primeiro, estava apta a dirigir sem ser flagrada pela fiscalização. “Eu acredito que a lei seca ajuda a evitar acidentes. Eu mesma fui vítima de um motorista que estava alcoolizado e muito cansando. Ele acabou batendo o carro em que eu estava. Não me machuquei por sorte”, relatou.

Metabolismo O arquiteto Márcio Túlio Beltrão Barros, 36 anos, também ingeriu um copo de cerveja. Mesmo mais alto e pesado do que Rejiane, o resultado dele no bafômetro foi maior (0,59mg/l). Cinco minutos após o primeiro teste, o nível baixou para 0,11mg/l, mas subiu para 0,14mgl/l após 12 minutos do primeiro resultado. “Isso acontece porque o organismo dele começou a metabolizar o álcool mais tarde”, explicou o agente de trânsito Marcelo Madeira.

Enquanto fazia os testes, Márcio Túlio aproveitou para tirar uma dúvida: “Saí à noite e bebi. Volto para casa, durmo e quanto tempo depois eu posso dirigir sem cair na blitz?” Mais uma vez, é impossível precisar o intervalo necessário para o organismo metabolizar todo o álcool. “Quanto mais a pessoa bebe, mais satura o organismo, mais sobrecarrega o fígado e mais tempo leva para processar o álcool. Ingerir comida gordurosa agiliza o processo. Mas, ainda assim, o reflexo fica alterado”, esclareceu o também agente de trânsito Helder Athan.

Depois de 31 minutos do primeiro exame, o arquiteto ainda seria punido com multa e suspensão do direito de dirigir por um ano. Márcio Túlio se coloca na parcela de brasileiros que abandonaram o hábito de dirigirem alcoolizados após a lei seca. Mesmo antes da norma, ele diz que dois chopes eram o suficiente para entregar as chaves do veículo para a mulher. “Inicialmente, eu parei por medo da punição. Conheço o meu limite, mas a maioria não tem consciência”, avalia.