O globo, n. 31747, 08/07/2020. País, p. 9
Protocolo individual
08/07/2020
Governo não fixa normas, e ministros tem agendas
No dia em que o presidente Jair Bolsonaro anunciou ter contraído o novo coronavírus, a Secretaria-Geral da Presidência da República informou que o governo não recomenda medida de isolamento para quem teve contato com casos positivos por não haver protocolo do Ministério da Saúde ou da Organização Mundial da Saúde (OMS) nesta direção. Assim, alguns ministros e auxiliares que estiveram com o presidente ficaram reclusos, enquanto outros seguiram suas agendas, inclusive sem usar máscaras.
Segundo a Secretaria-Geral, a orientação aos servidores é que a assistência médica seja procurada se eles apresentarem sintomas da doença. Já com relação aos casos considerados suspeitos, os funcionários da Presidência devem ficar em casa até o resultado do exame. Segundo a pasta, foram registrados até agora 108 casos entre os quase 3,4 mil servidores da presidência. Não houve nenhum óbito.
A OMS informa que o “período de incubação” do vírus varia em um intervalo de 1 a 14 dias, geralmente ficando em torno de 5 dias. Segundo os especialistas, o período em que o novo coronavírus tem maior potencial de transmissão é antes do surgimento dos primeiros sintomas da doença.
— A maior transmissão (do novo coronavírus) acontece de dois a três dias antes do aparecimento dos sintomas. Os chamados pacientes pré-sintomáticos têm o maior potencial de contágio — explica a microbiologista Natalia Pasternak, pesquisadora do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP).
Diversos integrantes da cúpula do governo recorreram a testes rápidos para verificar se estão com a doença. Foi o caso de três ministros que despacham no Palácio do Planalto: Walter Braga Netto (Casa Civil), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e Jorge de Oliveira (Secretaria Geral da Presidência).
Após resultado negativo eles mantiveram suas agendas. Ramos inclusive recebeu três deputados, Dr. João (PROS/BA), JHC (PSB-AL) e Wilson Santiago (PTBPB). Fotos publicadas por sua assessoria mostram que o ministro despachou com os parlamentares sem usar máscara.
O teste rápido, porém, não é o mais indicado para diagnóstico e tem baixa precisão, com risco de dar falsos negativos. Isso porque ele identifica anticorpos produzidos pelo corpo após a exposição ao vírus. Assim, deve ser feito depois do 8º dia de sintomas. Antes disso, sua sensibilidade é baixa. O exame usado para fechar diagnósticos é o do tipo molecular (RT-PCR), feito em laboratório a partir da coleta de secreções do aparelho respiratório do paciente, conforme diretrizes internacionais adotadas no Brasil.
Além dos ministros do Planalto, outros ministros recorreram a testes rápidos e mantiveram sua agenda intacta diante de resultados negativos. É o caso do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, que despachou com a deputada Luísa Canziani (PTB-PR), também sem usar máscara.
Alguns dos integrantes do governo que estiveram com o presidente recentemente nem se submeteram a testes, como o vice-presidente Hamilton Mourão. Sua última agenda com Bolsonaro foi no dia 30 de junho e ele avaliou não ser necessário fazer o exame nem respeitar o isolamento. Mourão, inclusive, cumprirá agenda hoje em Belém (PA).
— Tive contato com o presidente na terça passada, portanto fora do prazo de manifestação da doença. Estava com máscara — afirmou Mourão ao GLOBO.
Outros ministros, como Paulo Guedes (Economia), Ernesto Araújo (Relações Exteriores), André Mendonça (Justiça) e José Levi (Advocacia-Geral da União), optaram por cumprir medidas de isolamento enquanto aguardam o resultado do teste molecular.
Parlamentares que tiveram contato com o presidente também pretendem se submeter ao teste. O líder do governo na Câmara, Vitor Hugo (PSL-GO), está em isolamento e fará o exame hoje. Os senadores Espiridião Amin (PP-SC) e Dario Berger (MDB-SC) também cancelaram suas agendas e farão o teste amanhã.
No Planalto, o governo destacou medidas tomadas desde o início da pandemia, como orientações sobre a higienização das mãos, uso correto de máscaras e distanciamento social, a implementação do trabalho remoto — em especial, para quem integra grupos de riscos —e do rodízio de funcionários, além da intensificação da limpeza de instalações e equipamentos. Foram instalados 494 unidades de dispenser para álcool em gel para todas as dependências do Palácio do Planalto.
“A Presidência da República está seguindo as orientações do Órgão Central do Sipec (Ministério da Economia) contidas na Instrução Normativa nº 19, de 12 de março de 2020, e alterações, no que se refere ao trabalho remoto. Nesse sentido, não há ainda previsão ou orientação de retorno dos servidores que estão em trabalho remoto para o trabalho presencial”, informou a SecretariaGeral, que disse garantir o ambiente de trabalho “sempre o mais seguro possível para todos os servidores”.
‘Tive contato com o presidente na terça passada, portanto fora do prazo de manifestação da doença. Estava com máscara”
Hamilton Mourão, vice-presidente, sobre o contato com Bolsonaro