O globo, n. 31742, 03/07/2020. País, p. 7
Wassef tinha controle sobre vida de Queiroz em Atibaia
03/07/2020
Mensagens obtidas pelo MP e testemunha localizada pelo Jornal Nacional vão de encontro à versão do ex-advogado de Flávio
Mensagens apreendidas pelo Ministério Público do Rio (MP-RJ) e uma testemunha encontrada pelo Jornal Nacional apontam que o advogado Frederick Wassef mantinha controle sobre a rotina de Queiroz em Atibaia (SP), o que incomodava a mulher do ex-assessor de Flávio Bolsonaro, Márcia Oliveira de Aguiar. Em mensagens enviadas em novembro do ano passado, reveladas ontem pelo jornal “O Estado de S. Paulo”, Márcia reclama com a advogada Ana Flávia Rigamonti que não queria mais viver como “marionete do Anjo”. Segundo investigadores, “Anjo” é a maneira como elas se referiam a Wassef, que defendeu o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) no caso da rachadinha na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).
“A gente não pode mais viver sendo marionete do Anjo. ‘Ah, você tem que ficar aqui, tem que trazer a família’. Esquece, cara. Deixa a gente viver nossa vida. Qual o problema? Vão matar? Ninguém vai matar ninguém. Se fosse pra matar, já tinham pego um filho meu aqui”, escreveu Márcia, que está foragida.
As mensagens e a testemunha contrariam as declarações iniciais de Wassef, que negava ter atuado na proteção e abrigo de Queiroz e sua família. O advogado deixou a defesa de Flávio Bolsonaro e admitiu mais tarde, em entrevista à revista Veja, que escondeu o ex-assessor de Flávio porque ele poderia ser assassinado por “forças ocultas”. O diálogo descoberto pelo MP-RJ indica que Wassef planejava alugar uma casa em São Paulo para abrigar a família de Queiroz. A opção não agradou Márcia.
“Ele (Queiroz) não quer ficar mais aí, não. Ele (Anjo) vai fazer terror, né?”, disse ela a Ana Flávia. OMP-RJ teve acesso às conversas em dezembro de 2019, por meio de mandados de busca e apreensão em endereços ligados a Queiroz. Na ocasião, um celular de Márcia foi apreendido.
De acordo com o Jornal Nacional, o advogado ficava irritado ao descobrir que Queiroz estava fora de sua casa em Atibaia. A reportagem entrevistou um homem que se tornou amigo do ex-assessor de Flávio Bolsonaro enquanto ele esteve na cidade. Daniel Bezerra Carvalho é dono de uma loja de conveniência e diz ter se aproximado de Queiroz há cerca de um ano. A TV Globo exibiu gravações dos dois comemorando o último réveillon na casa em que o ex-assessor estava escondido. Márcia também estava presente nas imagens.
Carvalho contou que Queiroz, Márcia e a advogada Ana Flávia Rigamonti costumavam almoçar ou jantar em seu estabelecimento. Ao Jornal Nacional, ele relatou que às vezes Queiroz demonstrava apreensão com telefonemas. Os investigadores suspeitam que seriam telefonemas de Frederick Wassef para o celular de Ana Flávia.
— Eles ficavam tranquilos, sempre muito tranquilos e em alguns momentos eu percebia que ficavam um pouco apreensivos e iam embora. Às vezes iam embora. Não sei por que. Às vezes tocava o telefone e eles iam embora. Mas eu não sei detalhar o que, quem era ou porquê —diz Carvalho.
Ao jornal “O Estado de S. Paulo”, Wassef afirmou que “jamais articulei qualquer rotina de ocultação do paradeiro de Fabrício Queiroz, assim como nunca dei ordens a ele ou à sua família. Da mesma forma, nunca o escondi”.
DEPOIMENTO EM BANGU
Fabrício Queiroz, que está preso em Bangu 8, prestou depoimento ontem por cerca de 2h30m ao Ministério Público Federal (MPF) sobre o suposto vazamento do relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras que integrava as investigações da Operação Furna da Onça — a acusação foi feita pelo empresário Paulo Marinho. Segundo o promotor Eduardo Benones, que ouviu Queiroz, o ex-assessor disse que as investigações precisam continuar e afirmou que não soube de nada.
—Ele não negou que houve ou que não houve vazamento. Disse que, a ele, não chegou nada —afirmou Benones.
Em depoimento à Polícia Federal, na segunda-feira, Queiroz afirmou que desconhece o vazamento das informações da operação e negou ter conhecimento de irregularidades sobre esse assunto. Segundo o ex-assessor, ele próprio pediu para ser exonerado porque estava “cansado”.