Título: Estruturas precárias
Autor: Valadares, João
Fonte: Correio Braziliense, 03/02/2013, Brasil, p. 7

Além do fato de serem cidade estudantis, Santa Maria (RS) e Lavras (MG) conservam outra semelhança: ambas se focam em cursos de ciências agrárias. “Se estivesse acontecendo um congresso lá, com certeza estaríamos naquela festa”, afirma o estudante do décimo período de ciências biológicas da Universidade Federal de Lavras (Ufla), Daniel Domingos, de 28 anos. No município, estruturas frequentadas por universitários são precárias e não há cumprimento de requisitos básicos para evitar incêndios ou combatê-los.

Em evento promovido na boate Sertaneja, na madrugada de sábado, quem vendeu os convites foram as próprias repúblicas estudantis. “Vamos esperar todos que compraram antecipado entrarem para ver se vai caber mais gente para venda avulsa. Posso te adiantar que não serão vendidos mais convites, ainda mais depois do que aconteceu no Rio Grande do Sul”, diz um segurança que controlava a entrada. O fraco movimento que durou até 0h30 de sábado rapidamente começou a dar lugar a uma aglomeração de estudantes, que não paravam de chegar. Segundo seguranças, mais de 300 pessoas entraram na área fechada destinada aos shows, que fica no primeiro andar de um sobrado com dois pavimentos. Lá dentro, não havia extintores posicionados em lugar visível nas paredes, e a fiação elétrica passava exposta sem isolamento para ligar equipamentos de som.

“(A Sertaneja) É uma caixa de sapatos, não tem ventilação e a preocupação aumentou bastante depois da tragédia em Santa Maria. Mas é o que temos para fazer”, diz uma aluna da Ufla. Além dos problemas mencionados, as luzes de sinalização das saídas de emergência estavam apagadas e uma porta de emergência para saída do público estava trancada. A administração municipal informou apenas que todos os estabelecimentos de recepção de público em Lavras estão sendo vistoriados para apresentarem alvarás de funcionamento e sanitário, Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB) e a inclusão da classificação “casa de eventos” no CNPJ daqueles que ainda não têm esse tipo de registro. O assessor especial para o desenvolvimento econômico da prefeitura de Lavras, Helio Teixeira Filho, informou que o prazo para apresentação desses documentos é de 10 dias, sob pena de fechamento dos locais. Uma das casas noturnas de Lavras, a Paddock Sport Bar, que fica dentro do Lavrashopping, foi fechada na semana passada pelo Corpo de Bombeiros.

Irregulares como regra A menos de uma semana do carnaval, das mais de 300 repúblicas estudantis de Ouro Preto (MG) menos de um terço têm regularizado o Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB). Outras 15 receberam notificação em algum item que deve ser readequado, como validade, localização e número de extintores de incêndio, sinalização de saídas de emergência e altura de corrimãos. Segundo o tenente Márcio Toledo, da 3ª Companhia de Bombeiros de Ouro Preto, a corporação tem recebido denúncias sobre locais com problemas de segurança. “Nem toda república necessita ter o AVCB, mas todas que fazem festas abertas precisam”, afirma. Uma outra preocupação dos bombeiros é o número de casas históricas que não têm o AVCB, segundo o tenente, em torno de 65% delas.

“Depois do incêndio de dezembro (no dia da véspera de Natal, que atingiu dois cômodos de uma pousada na Praça Tiradentes), alguns comerciantes nos procuraram espontaneamente, mas vários tinham o sentimento de que ‘isso nunca vai acontecer comigo’”, conta Toledo.

Com o susto que a tragédia de Santa Maria provocou, a secretaria de Cultura de Ouro Preto convocou uma reunião na quarta-feira com a Defesa Civil, a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros para avaliar como estão as condições para receber o carnaval. Foi acordado com os blocos que eles não terão mais do que 400 pessoas cada e que a folia deve ser descentralizada este ano, com vários palcos, cumprindo determinação do Ministério Público para preservar o centro histórico. Das repúblicas que realizam festas, será exigido um alvará expedido pela prefeitura, além do AVCB e de um confeccionado pela vigilância sanitária. A própria Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) determina que as casas pertencentes a ela tenham toda a documentação exigida em dia.

O Centro Acadêmico da Escola de Minas, ou simplesmente Caem, como os estudantes o conhecem, é uma das únicas casas de shows da cidade, e, segundo estudantes, aparenta segurança. “O Caem tem o pé direito alto, o teto de concreto, e têm saída de emergência. Um perigo de incêndio aqui são as fiações antigas dos casarões, mas quase todas as repúblicas têm extintores e são seguras”, diz Gabriel Cordeiro, de 20 anos, aluno de engenharia civil e morador da república federal Lindo Amor.