Correio braziliense, n. 20905, 18/08/2020. Economia, p. 8
Guedes cede e admite remanejar recursos
Marina Barbosa
Ingrid Soares
18/08/2020
Após reunião na tarde de ontem com o ministro da Economia, Paulo Guedes, o presidente Jair Bolsonaro descartou, por meio das redes sociais, uma eventual saída do titular da pasta. “Chegamos juntos e sairemos juntos”, escreveu Bolsonaro. Os rumores de que o presidente poderia tirar Guedes do governo foram intensos durante o fim de semana, por conta da queda de braço entre o ministro e a área desenvolvimentista em torno do teto de gastos. Enquanto Guedes defende a manutenção da regra, outros setores pressionam Bolsonaro para mudanças que possibilitem a utilização de mais recursos públicos para o investimento em obras.
A publicação foi acompanhada de um vídeo com entrevista do presidente à CNN Brasil, na qual o chefe do Executivo diz que “Paulo Guedes é aliado de primeira hora” e que “a saída de Guedes nunca foi cogitada”. Bolsonaro afirmou ainda que a possibilidade de o governo furar o teto de gastos é “zero” e que existem outras maneiras de assegurar investimentos, como privatizações ou remanejamento de recursos.
Guedes, por sua vez, também procurou abafar os rumores. À noite, depois de duas longas reuniões com Bolsonaro e o ministro da Casa Civil, Braga Neto, ele disse manter uma relação mútua de confiança com o presidente e que segue no governo. Porém, admitiu que nem sempre está confortável à frente da equipe econômica. E confirmou que deve liberar recursos para as obras de infraestrutura que vêm sendo defendidas por outros ministros, como o do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, e o da Infraestrutura, Tarcísio Freitas — sem, no entanto, quebrar o teto de gastos.
“Estamos vendo o que pode ser remanejado no Orçamento”, disse Guedes. Antes desse discurso, assessores de Guedes chegaram a dizer que o ministro tinha ido ao Palácio do Planalto para lembrar Bolsonaro de que há limite fiscal para tudo e que, por isso, o presidente poderia chegar ao ponto de ter de escolher entre as obras públicas e a prorrogação do auxílio emergencial, que hoje sustenta o aumento da sua popularidade.
Custo
A ala desenvolvimentista, contudo, rebateu, dizendo que o auxílio custa R$ 51 bilhões por mês, e que seria possível fazer uma série de obras com um décimo disso. Guedes admitiu, então, estudar uma forma de remanejar parte dos R$ 15 bilhões que sobraram de duas medidas provisórias editadas durante a pandemia da covid-19. Seria mais que o suficiente para cobrir os R$ 5 bilhões que Marinho e Tarcísio pedem para obras. O governo, porém, ainda avalia a melhor forma de fazer esse remanejamento porque o Orçamento de Guerra, aprovado pelo Congresso só permite gastos de saúde ou de combate à covid-19.
“Não vamos fazer nada errado”, afirmou Guedes. Segundo o ministro, Bolsonaro está “absolutamente comprometido” e entende a importância de manter o teto de gastos, para que o “pesadelo” de desequilíbrio fiscal, inflação elevada e juros altos não volte a assombrar o Brasil. “Existe muita confiança do presidente em mim e existe muita confiança minha no presidente”, acrescentou.
O ministro admitiu, contudo, que não é fácil “estar sempre à vontade nesse cargo”, porque é “um cargo difícil”. E acrescentou que o presidente Bolsonaro é “uma pessoa sensível” e está “preocupado com a água no Nordeste”. “É absolutamente natural que um governo queira fazer obras públicas, queira levar água para o Nordeste brasileiro. E o teto tem restringido as obras de investimento público”, admitiu.
O ministro disse, contudo, que sua função é lembrar que o governo precisa cumprir as metas fiscais. Para garantir que o remanejamento não golpeie o teto de gastos, a ideia é desvincular alguns gastos do Orçamento e rever o pacto federativo para rebaixar o piso de algumas despesas para liberar recursos para investimentos públicos. A manobra está sendo discutida com o relator do Orçamento de 2021, senador Márcio Bittar (MDB-AC), com quem Guedes se reuniu após o encontro com Bolsonaro.
“Têm coisas que é possível cortar”, afirmou Bittar.
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Bolsa perde os 100 mil pontos
Jailson R. Sena
18/08/2020
O dólar começou a semana fechando em alta, cotado a R$ 5,497 para a venda, após valorização de 1,30%. Já o Ibovespa, principal indicador dos negócios da Bolsa de Valores de São Paulo (B3), perdeu a marca dos 100 mil pontos, teve queda de 1,73% e terminou o pregão aos 99.595 pontos. O dia foi marcado pela apreensão dos investidores sobre a possível saída do ministro da Economia, Paulo Guedes, um dos pilares da prometida agenda liberal do governo, em consequência das declarações sobre o risco de rompimento do teto de gastos que descontentaram o presidente Jair Bolsonaro.
O coordenador do curso de economia da Fundação Getulio Vargas em São Paulo, Joelson Sampaio, disse que essa situação gera dúvidas entre os investidores. “Existe um comprometimento de um plano de governo que é um ancorado no ministro da Economia. O mercado se pergunta se tem chance de fato dele sair, e caso saia, o que poderá mudar” explicou. Para o economista, “essa semana será de volatilidade na bolsa e no câmbio”.
Na B3, também contribuiu para a baixa o vencimento de opções, que levaram o giro de negócios a um total de R$ 45,4 bilhões. No entanto, a possibilidade de mudanças no governo foi a novidade que mais deixou marcas. “O mercado começa a refletir a possibilidade de o Guedes ter subido no telhado. Mas o que ocorreu hoje (ontem), em ajuste de preço tanto em ações, como dólar e juros, está muito longe de ser uma consumação de sua saída. Com o Guedes fora do governo, o Ibovespa iria abaixo dos 80 mil pontos”, disse Pedro Paulo Silveira, economista-chefe da Nova Futura.
“O mercado está começando a trabalhar com uma possibilidade que inexistia até a semana passada. A composição de risco agora é totalmente diferente, e os preços dos ativos estão respondendo a isso”, acrescentou, segundo a Agência Estado.
Dólar
No mercado de câmbio, o dólar alcançou um nível que não se via desde 22 de maio, quando a moeda norte-americana havia fechado em R$ 5,579. Na máxima do dia, a divisa americana subiu a R$ 5,514. Os profissionais das mesas de operação notaram o aumento da tensão provocado pelos rumores sobre a saída do ministro da Economia. “Por enquanto, são só rumores, uma vez que, se fosse verdade, as coisas no mercado estariam muito piores”, afirmou Paulo Sabat, gestor da mesa de Derivativos da Necton Investimentos.