Correio braziliense, n. 20905, 18/08/2020. Economia, p. 8

 

Reservas do BC vão pagar dívida pública

18/08/2020

 

 

O governo deve recorrer aos lucros cambiais do Banco Central (BC) para abater parte da dívida pública, que disparou neste ano devido aos gastos da pandemia do novo coronavírus. A ideia é transferir cerca de R$ 400 bilhões da reserva de resultados do BC para o Tesouro Nacional fazer frente às despesas da dívida. A medida foi discutida entre a diretoria da autoridade monetária e os ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) ontem.

O debate com o TCU foi solicitado pelo presidente do BC, Roberto Campos Neto. Segundo o executivo, “de forma extraordinária, a reserva de resultado do BCB poderá ser destinada ao pagamento da DPMFi (Dívida Pública Mobiliária Federal interna) quando severas restrições nas condições de liquidez afetarem de forma significativa o seu refinanciamento”.

A possibilidade está na Lei nº 13.820. A legislação interrompeu a transferência compulsória desses recursos em 2019 para, segundo Campos Neto, aprimorar a governança e a transparência da relação entre o BC e o Tesouro. Porém, prevê exceções, tanto quando o Tesouro sofre essas restrições de refinanciamento, quanto quando o BC precisa de recursos para cobrir um eventual resultado negativo.

O governo quer, contudo, ter certeza se a situação fiscal criada pela pandemia se encaixa nessa situação de “severas restrições”. No entendimento do BC, há espaço para essa discussão, visto que a pandemia pode levar a dívida bruta do governo a 90% do PIB neste ano. Além disso, essa dívida está cada vez mais curta e os investidores estão exigindo juros cada vez mais altos para financiar os títulos públicos, devido às incertezas fiscais que rondam o Brasil.

Relator dos processos relativos ao BC no TCU, o ministro Bruno Dantas, havia tratado desse tema como uma “zona cinzenta”. Segundo Dantas, o intuito de Campos Neto era dialogar sobre “algumas questões técnicas referentes a uma operação que o BC está estudando fazer em conjunto com o Tesouro Nacional”, mas ele recomendou que essa questão fosse discutida com todos os membros da Corte porque “são tão grandes que não cabem sobre os ombros de um único relator”. (MB)