Correio braziliense, n. 20905, 18/08/2020. Saúde, p. 13

 

Pequim registra vacina contra a Covid

18/08/2020

 

 

Primeiro imunizante com estudos de segurança e eficácia publicados é patenteado na China. O laboratório de biotecnologia CanSino tem planos de incluir o Brasil na terceira fase de ensaios clínicos, quando os testes abrangem milhares de pessoas.

Os estudos da Ad5-nCoV começaram em março e, por enquanto, demonstraram que essa é uma das vacinas mais seguras contra o Sars-CoV-2. A substância é uma das cinco que vêm sendo produzidas no país asiático — uma delas é a da Sinovac, em teste na Universidade de Brasília (UnB). A patente foi pedida para proteger a propriedade intelectual, pois os dados sobre o desenvolvimento do imunizante foram, e continuam sendo, divididos com a comunidade científica internacional.

Em 2017, a mesma tecnologia foi utilizada pelo CanSino para o desenvolvimento da primeira vacina já aprovada contra Ebola, vírus altamente letal que matou milhares na África Ocidental, três anos antes. A abordagem também é semelhante à da substância da Universidade de Oxford, testada no Brasil pelo Instituto Butantan.

Apesar de ter sido divulgada ontem, a patente da Ad5-nCoV foi registrada em 11 de agosto, mesmo dia do da vacina russa, segundo a imprensa chinesa. Os dois países, aliás, pretendem trabalhar juntos no desenvolvimento de imunizações de covid-19. No último domingo, o principal especialista em doenças respiratórias da China, Zhong Nanshan, participou de um simpósio com cientistas da Rússia e afirmou que há interesse em troca de informações.

“A China e a Rússia podem aprender uma com a outra. As tecnologias e estratégias russas (de combate à covid-19) merecem ser estudadas, enquanto a China tem métodos únicos para controle da pandemia, especialmente o uso da medicina tradicional”, afirmou. Nanshan não disse o nome de nenhuma vacina específica, mas a CanSino informou, em nota, que está em conversação com Moscou para os testes de fase III da Ad5-nCoV.

Na semana passada, a Arábia Saudita anunciou que os testes de fase III da vacina chinesa começarão, ainda neste mês, no país. Em um comunicado de imprensa, a CanSino anunciou que pretende fechar acordos também com Brasil e México para o estudo final da substância.

O laboratório chinês divulgou, em maio, os resultados preliminares dos estudos com a vacina. Em um artigo na revista britânica The Lancet, uma das publicações médicas mais respeitadas do mundo, cientistas liderados por Feng Cai Zhu, do Centro de Controle e Prevenção de Doenças da Província de Jiangsu, relataram que 108 adultos entre 18 e 60 anos, sem exposição prévia ao Sars-CoV-2, receberam doses baixas, moderadas e altas da substância e foram observados por 28 dias.

Ao fim da segunda semana, todos desenvolveram anticorpos específicos, com pico de produção em quatro semanas, quando até 97% dos participantes exibiam proteínas neutralizantes, além de células de defesa. As reações adversas mais comuns foram febre, fadiga, dor de cabeça e dor muscular.

No início de agosto, a companhia publicou, novamente na The Lancet, os resultados da fase II, que incluiu mais de 500 voluntários do exército chinês. “O estudo de fase II acrescentou mais evidências sobre a segurança e a imunogenicidade em um grupo grande de pessoas, maior que da fase I. Esse é um passo importante na avaliação dessa vacina experimental, e os ensaios III agora estão ocorrendo”, disse, em comunicado, Feng-Cai Zhu.

Os 508 participantes foram avaliados 14 e 28 dias depois da vacinação. Os resultados mostraram que 95% daqueles que receberam doses altas e 91% do grupo de baixa dosagem apresentaram anticorpos para o Sars-CoV-2 ao fim de quatro semanas. O percentual dos que tiveram níveis detectáveis de células T foi de 90% e 88%, respectivamente, no mesmo período. Assim como na fase I de testes, as reações adversas mais comuns foram febre, fadiga e dor no local da injeção. De acordo com os autores, é possível que populações em alto risco, como idosos, necessitem de uma segunda dose de reforço.