Título: Patrimônio corroído
Autor: Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 08/02/2013, Economia, p. 10

Rendimento da maioria das aplicações financeiras perde da inflação. Mesmo assim, os depósitos na poupança batem recorde

Os brasileiros que deixaram parte do seu patrimônio na poupança perderam dinheiro. A inflação de janeiro foi mais que o dobro da rentabilidade oferecida pela caderneta. Mesmo no acumulado de 12 meses, a carestia corroeu parte dos ganhos. Enquanto o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulou 6,15% no período, a caderneta nova obteve 5,70%. Para os aplicadores que ainda tinham recursos na poupança antiga, foi possível apenas empatar com a inflação.

Apesar desse desempenho frustrante, os depósitos na caderneta bateram recorde no primeiro mês do ano, alcançando R$ 2,3 bilhões. Segundo especialistas, isso ocorreu porque o investidor está sem opção, já que a maioria das aplicações perdeu para a inflação ou tem custos elevados demais para valer a pena. Mais do que nunca, na visão de especialistas em finanças, o brasileiro terá de estudar o mercado para conseguir vencer a carestia. O ganho fácil com títulos do governo ficou no passado e obter uma rentabilidade superior à inflação vai exigir paciência e conhecimento.

“O investidor tem de deixar o dinheiro investido por mais tempo”, disse Bolivar Godinho, professor de finanças da Fundação Instituto Administração (FIA). Na avaliação dele, mesmo perdendo para a inflação, a poupança, ao menos a “curtíssimo prazo”, é mais interessante do que a maioria dos investimentos. “A curto prazo ela apresenta a menor perda por não ter taxa de administração e Imposto de Renda”, explicou.

Comportamento Nesse cenário, o Banco Central terá de intensificar esforços para que o brasileiro mantenha seu capital na poupança ou em algum outro investimento. Caso os investidores percam o interesse por poupar e decidam gastar, a autoridade monetária terá dificuldades para manter a inflação na meta definida em 4,5%, com margem de erro de dois pontos percentuais. Quanto mais o brasileiro compra, explicam os economistas, maior a pressão sobre o custo de vida, principalmente sobre os preços dos serviços.

Felipe Chad, sócio-diretor da corretora DX Investimentos, pondera que o sucesso da caderneta, mesmo com uma rentabilidade tão ruim, se explica pelo comportamento do brasileiro. Ele lembra que a poupança é ainda uma das formas mais simples de guardar dinheiro. “É um fenômeno cultural. A poupança rende menos que a inflação e ainda assim as pessoas colocam seu patrimônio lá”, argumentou.

Pode sobrar para Dilma

Análise da notícia

Odail Figueiredo

A perda de atratividade dos investimentos financeiros, que estão ficando para trás na corrida com os índices de preços, complica a tarefa do Banco Central de manter a inflação dentro da meta e coloca uma questão delicada para a presidente Dilma Rousseff. Ninguém faz uma aplicação para perder dinheiro. Se a percepção de que poupar não compensa se disseminar, e as pessoas começarem a usar em compras o dinheiro que seria depositado num fundo ou na poupança, o impulso adicional ao consumo, que já está elevado, pressionaria ainda mais a inflação. Nesse cenário, como o mercado já percebeu, o BC teria que elevar os juros para conter a demanda, comprometendo o discurso e a popularidade da presidente, que fez da queda das taxas uma bandeira de governo.