Título: Nem manobra contábil salva o governo
Autor: Bancillon, Deco
Fonte: Correio Braziliense, 30/01/2013, Economia, p. 12

O governo não conseguiu cumprir a meta de economizar recursos suficientes para saldar os juros da dívida pública, e com isso fazer o chamado superavit primário. Mesmo tendo utilizado diversas manobras contábeis que permitiram ao Tesouro Nacional incorporar R$ 28,3 bilhões ao resultado fiscal de dezembro, no acumulado de 2012, as contas públicas (Banco Central, Tesouro e Previdência Social) encerraram o ano em R$ 88,5 bilhões. Faltaram, portanto, R$ 8,5 bilhões para que a União atingisse a meta cheia de guardar R$ 97 bilhões, estipulada na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

O resultado também indica que o esforço fiscal feito no ano ficou em 2,01% do Produto Interno Bruto (PIB), quando o exigido era economizar o equivalente a 3,1%. Em tese, um menor esforço fiscal aumenta a pressão sobre a demanda interna, um componente que interfere diretamente nos preços praticados ao consumidor. Em 2011, ainda que também não tenha cumprido o que determinava a LRF, o superavit primário realizado pelo governo central foi ligeiramente maior, de 2,26% do PIB.

Essa discrepância é ainda mais latente se levado em conta que, em 2012, a União valeu-se de mais artifícios contábeis do que os usados em 2011. Um exemplo foi o pagamento de dividendos por empresas estatais, que amargaram prejuízos nas bolsas. O repasse dessas bonificações ao Tesouro totalizaram R$ 28 bilhões em 2012. Um ano antes, com o país crescendo três vezes mais e as empresas mais saudáveis, essa conta foi de R$ 19,9 bilhões.

Outro mecanismo utilizado pelo governo para equacionar as contas públicas foi o abatimento de gastos com obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). No ano passado, foram incluídos R$ 25,6 bilhões dessa rubrica no superavit primário. Como nem mesmo essa ajuda seria suficiente para tapar o rombo causado nas contas públicas, no último dia do ano, o Tesouro Nacional autorizou uma operação envolvendo a troca de ações da Petrobras que estavam sob a guarda do Fundo Soberano por títulos públicos que estavam em poder do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

No ataque A operação rendeu, sozinha, R$ 12,4 bilhões ao caixa da União, o que reforçou a percepção do mercado de que as contas públicas estavam sendo manipuladas. Mentor intelectual da artimanha nas contas, o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, refutou completamente o termo “manobra contábil”, e avisou que o governo “cumpriu rigorosamente todas as determinações legais” da LRF. “Não houve manobra alguma”, disparou o secretário, que continuou: “Receber dividendo de banco é algo absolutamente normal nos setores público e privado”, disse.

Não satisfeito, o secretário do Tesouro propôs outro “aperfeiçoamento” nas contas públicas, que seria excluir do cálculo do superavit primário o resultado dos estados e municípios. Por determinação da LRF, eles também devem contribuir com o cumprimento da meta de guardar 3,1% do PIB. Para o Executivo federal, essa imposição prejudica o país, uma vez que, em anos difíceis como 2012, visando a não prejudicar o crescimento econômico, os estados e municípios foram aconselhados a utilizar o dinheiro do primário em investimentos em obras de infraestrutura. “Vamos avaliar qual é a melhor política para o futuro”, disse Augustin.

O secretário lembrou que “ajustes” no cálculo do primário já foram feitos outras vezes, sem que isso representasse prejuízo para as contas públicas ou para o país. “O resultado primário já foi alterado em vários momentos, primeiro com a instituição do Fundo Soberano, depois com a retirada da Petrobras e da Eletrobras. Portanto, de alguma forma, o resultado primário brasileiro já vem sendo alterado em alguns momentos”, justificou.

» Desoneração

O governo já avisou que vai seguir em 2013 com a política de reduzir impostos para incentivar o crescimento econômico, uma das medidas que contribuíram para que o saldo nas contas públicas caísse em 2012. “Vamos continuar com uma política forte de desonerações, porque achamos que isso melhora o Brasil”, disse ontem o secretário do Tesouro, Arno Augustin. Ele explicou que a previsão inicial da equipe econômica era de diminuir em até R$ 25 bilhões os tributos sobre a atividade produtiva, como foi feito nos últimos anos com o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). No entanto, esse número será ampliado em R$ 15 bilhões, fazendo com que o total de desonerações previstas para este ano chegue à casa dos R$ 40 bilhões.