Valor econômico, v. 21, n. 5081, 08/09/2020. Brasil, p. A2

 

Setores defendem constitucionalidade de manter desoneração até o fim de 2021

Marta Watanabe

08/09/2020

 

 

Ideia de grupo constituído por 17 segmentos é aliar os argumentos jurídicos aos econômicos, como preservação de empregos

Numa estratégia para ver derrubado o veto presidencial contra a prorrogação da desoneração de folha, os 17 setores beneficiados enviaram conjuntamente aos parlamentares um parecer jurídico defendendo a constitucionalidade da manutenção do incentivo até dezembro de 2021.

A ideia é aliar os argumentos jurídicos aos econômicos, como o de preservação de emprego e renda, na defesa da prorrogação do benefício. Criado em 2011, o incentivo é voltado especialmente a setores intensivos em mão de obra. A data para votação do veto do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ainda está em negociação. A expectativa é que entre na pauta do Congresso na próxima semana.

O benefício da desoneração chegou a contemplar 50 setores. Com a crise fiscal, seu alcance foi limitado. Hoje empresas de 17 setores podem calcular a contribuição previdenciária patronal com base num percentual do faturamento em vez de pagar 20% sobre a folha de salários. O incentivo vale até o fim deste ano. Com a pandemia, porém, os segmentos beneficiados defendem a prorrogação, que ajudaria a amenizar a pesada carga sobre folha, contribuindo para preservar empregos e facilitar a retomada após a crise sanitária.

A prorrogação foi incluída na MP 936, mas foi vetada pelo presidente na conversão para a Lei 14.020/20. Além de construção civil e transporte, também são beneficiados hoje os segmentos têxtil, de serviços de tecnologia, de calçados, call center e comunicação social, entre outros.

Sergio Paulo Gallindo, presidente-executivo da Brasscom, que reúne empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC), diz que a desoneração contribuiu para o aumento de 514 mil para 657 mil postos de trabalho nos segmentos de software e TIC de 2010 a 2019. Ao mesmo tempo, propiciou um crescimento das exportações de US$ 523 milhões em 2010 para US$ 2,5 bilhões em 2019, segundo ele. Isso ocorre porque a receita de exportação não é base de cálculo para os setores que estão na desoneração.

Luigi Nese, vice-presidente da Confederação nacional de Serviços (CNS), defende uma desoneração mais ampla, que atinja todos os setores, sendo financiada por um tributo sobre movimentação financeira cobrado a 0,81% sobre os saques, com potencial de arrecadação de R$ 230 bilhões ao ano.

A ideia de uma desoneração ampla, também defendida pela equipe econômica, é bem-vinda, diz Fernando Pimentel, presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit). “Não temos nada contra uma desoneração ampla. Mas não faz sentido deixar de prorrogar uma desoneração já existente dizendo que todos terão outra amanhã.” Uma desoneração mais ampla, avalia, requer consenso que demanda discussão e tempo. Ele diz que há muita incerteza na recomposição do capital de giro das empresas no pós-pandemia. “Ninguém religa uma economia como se acende uma lâmpada.”

Entre os argumentos para o veto presidencial, estava a falta de cancelamento equivalente de outra despesa obrigatória e de estimativa de impacto financeiro e orçamentário para o benefício, o que desrespeitaria a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Parecer jurídico do escritório Mattos Filho diz, porém, que decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) afastou a necessidade de compensação orçamentária para medidas emergenciais resultantes da pandemia. Além disso, afirma o parecer, o projeto de lei de conversão da MP 936 previa que o Poder Executivo deveria calcular o montante da renúncia fiscal para inseri-la no Orçamento. Ainda segundo o parecer, ao mesmo tempo em que prorrogou a desoneração, o projeto de conversão também estendeu até dezembro de 2021 a cobrança de PIS e Cofins na importação de produtos dos setores beneficiados. A medida, além de garantir maior isonomia de tratamento com a produção nacional, resultaria em receita compensatória.