Título: Nova postura no PMDB
Autor: Correia, Karla
Fonte: Correio Braziliense, 11/02/2013, Política, p. 3

Deputado diz que priorizará a bancada em detrimento do governo, faz alertas ao Planalto e avisa: a sigla não aceita perder espaço em 2014

“A própria presidente Dilma vai perder em um processo eleitoral com a forma com que Minas Gerais está se sentindo hoje. É isso que eu alerto”

A notícia da eleição de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para a liderança da segunda maior bancada da Câmara dos Deputados foi recebida com preocupação pelo Palácio do Planalto, que encara o deputado fluminense como um risco em potencial para a agenda legislativa do governo no Congresso. E a primeira atitude de Cunha no cargo não deixou por menos. Já na primeira reunião que teve com o líder da legenda, o deputado anunciou a intenção de impedir que a política de desonerações utilizada pela presidente Dilma Rousseff como instrumento para manter a economia em movimento, em meio a uma crise mundial, atinja a receita de estados e municípios. “Que a desoneração seja feita apenas sobre a parte da União”, prega o líder. Apesar de apontar problemas na relação entre a bancada e o governo, ele não vê motivo de tensão no Planalto por conta da mudança que pretende estabelecer na postura do partido na Câmara. “Agora, a bancada vai se posicionar”, afirma, deixando claro que o comportamento “obediente” do PMDB nos dois primeiros anos do governo Dilma se deu em função do projeto de eleição de Henrique Eduardo Alves para a presidência da Casa. Em entrevista ao Correio, o novo líder do PMDB fala sobre a relação do partido com o Planalto e cobra mais espaço no governo para a ala mineira da legenda, sob pena de quebrar a harmonia da aliança entre PT e PMDB para as eleições de 2014.

O primeiro posicionamento anunciado pelo senhor como novo líder do PMDB na Câmara vai contra a política de desonerações que o governo tem usado para enfrentar a crise… Eu falei estritamente sobre uma parte dessa política de desoneração, que é a redução da alíquota do IPI e do Imposto de Renda. A posição da bancada é que as desonerações não podem ser feitas atingindo as receitas compartilhadas, que são distribuídas por meio do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Então, se é para fazer a desoneração do Imposto de Renda e do IPI, que seja feita apenas sobre a parte da União, sem atingir estados e municípios. A gente não está discutindo o mérito da desoneração. A gente está discutindo que a desoneração tem de ser feita sobre aquilo que pertence à União.

Estamos vendo uma mudança na relação entre PMDB e governo, sob sua liderança? O que aconteceu foi que, nos últimos dois anos, o pensamento da bancada não estava sendo expresso por causa do processo de pré-candidatura do Henrique (Eduardo Alves) à presidência da Câmara dos Deputados. Houve muitas votações em que a bancada preferiu não fazer nenhum tipo de debate e seguir a orientação do governo para que a candidatura, que era um projeto do partido, não fosse prejudicada. Agora, a bancada provavelmente vai se posicionar de uma forma diferente.

E isso pode trazer discordâncias com o governo, mesmo que o PMDB seja um dos principais partidos da base? Certamente a bancada tem seus próprios interesses. Eu não vejo isso como uma mudança de posição da bancada, o que vai acontecer a partir de agora é que eu, como líder, serei porta-voz do que a bancada pensa. O líder não pode ter posição própria. Quando eu tiver um posicionamento, será o posicionamento que a bancada tomou por mim, e não um posicionamento pessoal meu.

A ala mineira da bancada tem reclamado de falta de representação no governo. São muitos os problemas na relação do partido com o Planalto, hoje? Eu diria que há problemas generalizados na bancada, mas não podemos limitar o debate a apenas cargos e emendas. O caso de Minas Gerais tem uma peculiaridade. Quando você não tem uma representatividade de um estado importante dentro do governo federal, efetivamente o discurso de uma candidatura mineira acaba ganhando força ainda maior nesse estado, que tem um sentimento bastante aprofundado no estímulo do nacionalismo, do bairrismo. O mineiro sempre se protege, sempre dá muito valor à sua representatividade, o que é muito justo.

A solução seria um ministério para essa ala do partido? Não é só pleito de ministério. É o pleito do reconhecimento de um estado importante como Minas Gerais dentro do contexto nacional, que precisa ser reconhecido por todos. Há uma queixa de falta de representação política e isso é uma postura correta de Minas Gerais. A gente tem que olhar isso com um olhar político de quem vai disputar uma reeleição.

Os próprios deputados mineiros do PMDB falam até na possibilidade de apoiar uma eventual candidatura presidencial do senador Aécio Neves (PSDB-MG) em 2014… O senador Aécio Neves é um grande parlamentar, foi um grande governador e tem todas as qualidades para disputar, mas não está em questão a possibilidade de o PMDB apoiá-lo, até porque o PMDB tem o vice-presidente da República e a intenção é repetir a chapa. Mas a própria presidente Dilma vai perder em um processo eleitoral com a forma com que Minas Gerais está se sentindo hoje. É isso que eu alerto. O problema da bancada de Minas Gerais é algo que a gente vai ter que debater. Agora, eles sentem uma situação de diminuição do poder de Minas Gerais no cenário, o que é muito ruim. Ainda assim, eu reforço que não há possibilidade de o PMDB não marchar em uma chapa apoiando a presidente Dilma em uma reeleição com o vice-presidente Michel Temer.

Isso quer dizer também que o partido não aceitaria a formação de uma chapa em que o PMDB fosse substituído, digamos, pelo governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB)? Essa formação de chapa não passa pela cabeça do PMDB e acredito que não passe pela cabeça do PT. O PMDB faz parte dessa chapa e dificilmente aceitará uma participação no processo eleitoral em que não esteja na vice. Essa hipótese não existe. O governador também é um grande gestor, é do Nordeste, sai com a base forte, é um bom nome para qualquer coisa, inclusive para disputar a Presidência. Mas o PMDB não vai aceitar uma aliança da qual ele não faz parte.

O senhor foi eleito em uma disputa contra o deputado Sandro Mabel (PMDB-GO) com um placar de 46 votos contra 32. Isso mostra um racha na bancada? A bancada sempre teve e sempre terá divergências pontuais. Houve uma disputa, uma sucessão de liderança difícil porque você tinha um líder há seis anos, que era candidato à presidência da Câmara. Não se formou uma liderança natural para sua substituição, então se abriu uma disputa. Saíram sete candidatos, em um primeiro momento. Quatro, desses sete, saíram da disputa e me apoiaram. Estamos todos conversando e montando uma unidade. É um processo. Em um mês, se não tiver 100% de unidade, vai ter 99%. Isso é natural. Um ou outro ainda pode ter ficado ainda ressentido, chateado ou frustrado, mas o tempo acaba curando.

A atitude do Sandro Mabel, de recorrer ao STF para anular a eleição da liderança, não mostra que esse processo de cura vai ser um pouco mais difícil? O Sandro Mabel sequer foi eleito pelo PMDB, ele foi expulso do PR e foi muito bem acolhido dentro do partido, apesar de ter saído candidato à presidência da Câmara contra nosso projeto de aliança. Nós o acolhemos, ele quis disputar. Ele perdeu e veio com um argumento de choro. Os nossos companheiros de partido é que vão julgar se esse processo é bom ou ruim. Isso não é bom para o partido. Ainda mais sem o vínculo partidário de ter disputado e sido eleito pelo PMDB. Então, a minha avaliação é que ele cometeu um erro político. Eu diria que foi uma infantilidade.

E como o senhor classificaria a sua relação com o Planalto? A minha relação com o Planalto é ótima. Eu era vice-líder da bancada do PMDB, estava acostumado a participar de negociações, não tenho nem nunca tive nenhum problema. Sempre votei com o governo, sempre defendi o governo em plenário. Então, se existe alguma divergência, ela não me foi comunicada. O pensamento da bancada, em sua maioria, me quis como representante. Então eu vou continuar representando a maioria da bancada e terei o melhor relacionamento possível com o Planalto. Só que sempre fazendo valer a vontade da maioria da bancada.O processo de eleição do líder do partido afastou o senhor do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves?A própria campanha causa um certo distanciamento. Ele estava na dele, e eu estava na minha. Em um momento, eu até falei publicamente que sentia que ele estava apoiando o Sandro Mabel. Houve uma discussão e ele evoluiu para uma posição de neutralidade e assim se manteve até o fim. Mas é natural, ele é presidente da Casa com toda a legitimidade, contou com o nosso apoio, foi eleito. Vamos ter o melhor relacionamento possível, até porque nós somos amigos.

“O PMDB faz parte dessa chapa (à Presidência) e dificilmente aceitará uma participação no processo eleitoral em que não esteja na vice. Essa hipótese não existe”

“O líder não pode ter posição própria. Quando eu tiver um posicionamento, será o que a bancada tomou por mim, e não um posicionamento pessoal meu”