Correio braziliense, n. 20914, 27/08/2020. Negócios, p. 7

 

A maior quarentena do mundo

Israel Medeiros 

27/08/2020

 

 

O setor de bares e restaurantes vive uma situação de “terra arrasada”. É o que revelou o presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci. Em entrevista ao CB.Poder — uma realização do Correio Braziliense e da TV Brasília —, ele avaliou que o combate à pandemia foi feito de forma equivocada por autoridades, e isso prejudicou o setor de forma acentuada. Ao todo, dos mais de 1 milhão de bares e restaurantes e 6 milhões de empregados, o setor perdeu 250 mil estabelecimentos e demitiu 1,5 milhão de trabalhadores em todo o país.

“A pandemia foi cruel com o setor de bares e restaurantes no mundo inteiro, mas, infelizmente, aqui no Brasil, tivemos uma gestão muito mais caótica. Acho que faltou equilíbrio entre os nossos prefeitos, governadores e até o próprio presidente, foi uma confusão danada. E o fato de o governador de São Paulo, João Doria, ter fechado o estado todo gerou uma referência. Outros estados acabaram seguindo o exemplo. O vírus não tinha chegado à maior parte do Brasil, e nós já fechamos o país todo. A partir daí, temos a quarentena mais longa do planeta. Em Belo Horizonte, por exemplo, teve por volta de 160 dias, quando a média da Europa era de 60 dias”, disse.

O que impediu o agravamento da crise, segundo Solmucci, foi a MP 936, que virou a Lei 14.020/2020. A medida permitiu flexibilidade na suspensão de contratos e redução de jornadas. Mas, ele destacou que, nas classes sociais A e B, ainda há muito receio do retorno a estabelecimentos. De acordo com o dirigente da Abrasel, a situação é outra em regiões onde há maior concentração de pessoas de baixa renda. “O comportamento diferente nas classes tem sido determinante. Nas classes A e B, por exemplo, o faturamento tem sido menor, em torno de 15 a 20%. Quem atua no mercado que contempla as classes C, D e E tem encontrado algo em torno de 50, 60%. Ou seja, há muito mais medo de consumir e voltar ao normal nas classes altas do que nas classes mais baixas”, afirmou.

O presidente da Abrasel explica que a retomada do setor está vinculada ao comportamento dos consumidores de diferentes faixas de renda. “Para se ter ideia, a periferia chega a fazer 80% do que faturava antes. Já em locais como a Avenida Brigadeiro Faria Lima, em São Paulo, o faturamento está em 10%. O home office afastou muito as pessoas. E o outro comportamento importante é que o consumo se deslocou para o bairro”, destacou.

O auxílio emergencial pode ter sido grande determinante para o início da recuperação do setor de bares e restaurantes. Para Paulo Solmucci, o benefício fez diferença para os pequenos estabelecimentos. “Isso é visível. Temos uma crise, hoje, que foi minimizada por causa desse auxílio. Cerca de 80% do setor fatura menos de R$ 20 mil por mês. Então, quando você tem um consumidor com R$ 600 na sua renda, faz muita diferença", avaliou.

Solmucci comentou, ainda, sobre o 32º Congresso da Abrasel, que começou ontem e vai até amanhã. O evento é anual e, desta vez, totalmente on-line. “Da noite para o dia, nos vimos em uma obrigação de reinventar esse congresso. A pandemia veio rápido, a gente estava cuidando de bares e restaurantes fechando e de ter que fazer a diferença para o setor. Buscamos fazer um congresso digital e temos 50 mil inscritos. É uma surpresa, nosso sonho era chegar a 30 mil. Conseguimos juntar várias pessoas que são referências no setor”, comemorou.