Correio braziliense, n. 20915, 28/08/2020. Cidades, p. 15

 

Prejuízo de R$ 18 milhões

Ana Maria Campos 

Jéssica Eufrásio 

Mariana Machado 

28/08/2020

 

 

O suposto superfaturamento dos contratos com as empresas Luna Park e Biomega Medicina Diagnóstica podem ter provocado um prejuízo de R$ 18 milhões aos cofres públicos. Com esses recursos, segundo os promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) e da Procuradoria-geral de Justiça do DF, seria possível adquirir 900 mil testes rápidos para covid-19. Tudo isso no decorrer de uma pandemia, que resultou em 156.863 casos confirmados de covid-19, sendo 1.610 novas infecções em relação ao dia anterior. Do total de casos notificados, 139.896 (89,2%) estão recuperados. Houve 2.425 mortes.

A investigação do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) aponta um sobrepreço de 146,57%  no comparativo com valores ofertados pelas demais concorrentes do contrato para compra de testes de covid-19. Esse é o foco da segunda fase da Operação Falso Negativo, deflagrada nesta semana, que provocou a decretação da prisão preventiva do secretário de Saúde, Francisco de Araújo Filho, apontado como líder de uma organização criminosa. O desembargador Humberto Adjuto Ulhôa decretou também a prisão preventiva de outros seis integrantes da cúpula da Secretaria de Saúde. Um deles, Iohan Struck, subsecretário de Administração-Geral, é considerado foragido, porque ainda não foi localizado. A defesa do servidor afirma que ele está isolado com sintomas de covid-19.

Segundo o Ministério Público, em outra dispensa de licitação, a empresa vencedora, Biomega Medicina Diagnóstica, apresentou preço que indica superfaturamento de 42,75% nas aquisições de testes. A empresa vendeu os exames a R$ 125 a unidade, enquanto outros órgãos pagaram, pelo mesmo produto, R$ 18. Segundo o MPDFT, o secretário de Saúde, que está afastado do cargo, decide quem será contratado. “Sem qualquer explicação, Francisco Araújo Filho declarou como vencedora a empresa que havia ofertado o valor mais alto — R$ 180 para cada teste rápido. A despeito da teratologia dessa decisão, para os investigadores, no entanto, não houve surpresas, uma vez que, conforme detalhado, tudo já estava acertado nos bastidores”, afirmam os promotores de Justiça no pedido de prisão contra os investigados.

Na apuração da compra de testes, o MPDFT afirmou que o pedido enviado à empresa Luna Park Brinquedos não teve dados técnicos que justificassem a aquisição ou o total necessário para atender à população. O pedido teria se baseado em “ilações genéricas” do diretor afastado do Laboratório Central do DF (Lacen/DF), Jorge Chamon. Contudo, o aviso de dispensa de licitação foi publicado sem que o projeto que dá base a ela fosse aprovado, nem que houvesse pesquisa de preço ou justificativa para tal.

Os valores cobrados variaram entre US$ 12,20 e R$ 180, valor praticado pela Luna Park. A Secretaria de Saúde chegou a alocar, segundo o MPDFT, R$ 16,2 milhões em recursos para comprar da empresa. No entanto, publicação no Diário Oficial do Distrito Federal mostrou um empenho no valor para R$ 3,6 milhões, suficientes para a aquisição de 20 mil testes. A entrega ocorreu seis dias depois, sem informações sobre a marca dos testes, que seriam do laboratório chinês Shenzhen Lvshiyuan Biotechnology Co. Ltd. O superfaturamento chegou a R$ 2 milhões, segundo as investigações.

Superfaturamento

Os prejuízos calculados pelo MPDFT no processo de contratação de serviços de testagem em sistema de drive-thru com a empresa Biomega Medicina Diagnóstica Ltda. chegaram a R$ 16 milhões. Segundo medida cautelar apresentada pelo MPDFT, o objetivo era a compra de serviços para realização de 90 mil testes, mas essa quantidade subiu para 100 mil. Cinco empresas apresentaram propostas.

O valor empenhado ficou, inicialmente, em R$ 19 milhões, destinado à Biomega. Mas chegou a R$ 29,8 milhões, devido a aditivos. “(A aditivação foi viabilizada) sem suporte de relatório quantitativo e qualitativo dos serviços que a empresa havia desempenhado até aquele momento, nem mesmo de quantas pessoas foram testadas, ou a indicação da eficiência dos testes”, apontou o MPDFT. Na comparação com serviços de testagem semelhantes fornecidos a outras unidades da Federação, como São Paulo, o superfaturamento no DF alcançou 42%.