Correio braziliense, n. 20916, 29/08/2020. Economia, p. 7

 

Renda Brasil ainda não tem data

Rosana Hessel 

29/08/2020

 

 

O ministro da Economia, Paulo Guedes, não conseguiu concluir até ontem um desenho para o programa Renda Brasil que agrade ao presidente Jair Bolsonaro, nem estimou a data na qual conseguirá apresentar a proposta. Fontes da equipe econômica confirmaram: nada está definido.

Em uma videoconferência para empresários da indústria do aço, Guedes minimizou os atritos com o presidente e fez uma analogia com o futebol sobre as críticas que recebeu do chefe do Executivo, quando propôs o fim do abono salarial para custear o novo programa.

Em tom de brincadeira, o ministro disse que Bolsonaro “cometeu uma falta grave fora da área que quase foi “pênalti”. Guedes reforçou várias vezes que o presidente “está ciente de que precisa respeitar o teto de gastos”, para evitar o descontrole fiscal após a pandemia.

“Passamos da fase de preservar o emprego. Temos que voltar para o trilho do desenvolvimento e da prosperidade. O caminho da miséria, já conhecemos”, afirmou. Para o ministro, a economia já está se recuperando em “V” e é preciso retomar a agenda de reformas estruturais e privatizações.  Segundo Guedes, caberá ao presidente bater o martelo sobre o valor do benefício e definir o “timing” político para o programa, que deve substituir o Bolsa Família.

Em meio ao impasse para a definição dos valores do Renda Brasil e do auxílio emergencial para os próximos quatro meses, Bolsonaro decidiu ouvir os líderes da base aliada para sentir o clima do Congresso, antes de decidir qual deve ser a melhor saída. O Correio apurou que, logo após ouvir as novas propostas da equipe econômica, em uma reunião que não constava na agenda oficial, na manhã de ontem, o presidente pediu para o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), convocar as lideranças aliadas para um encontro no Palácio do Alvorada na terça-feira.

Contudo, Guedes precisará incluir a previsão do Renda Brasil na proposta do Orçamento de 2021 ainda neste fim de semana, porque a peça orçamentária será entregue ao Congresso na segunda.

Com a demora do governo para lançar o Renda Brasil, parlamentares tentam articular a tramitação de propostas de renda básica nas duas Casas. A bancada do PT no Senado, por exemplo, quer acelerar a tramitação do projeto de lei que amplia o Bolsa Família, o PL nº 4.106/2020, elevando o valor do benefício para R$ 300 e a base de beneficiários, sem acabar com os programas assistenciais atuais.

Um dos autores do PL, o senador Rogério Carvalho (PT-SE) disse ao Correio que pretende apresentar na terça-feira, durante a reunião de líderes do Senado, um requerimento para debater melhor o assunto entre os parlamentares, por meio de uma audiência pública.

Segundo o documento, após a pandemia, o número de desempregados deve aumentar e o total de famílias que necessitam do benefício poderá chegar a 30 milhões. A proposta do programa Mais Bolsa Família prevê um gasto anual de R$ 230 bilhões para esse cenário e o custeio, de acordo com Carvalho, vai depender da aprovação da reforma tributária.

“É preciso que o Congresso faça uma reforma que tribute mais a renda e o patrimônio, inclusive, com uma tributação diferenciada para os setores produtivos. Ela é fundamental para o governo encontrar recursos de maneira consistente”, afirmou Carvalho.

Presidente da Frente Parlamentar Mista da Renda Básica, o deputado João Campos (PSB-PE) também defende que a renda básica seja financiada pela tributação da classe mais alta. E reforçou que, caso o governo deixe o Renda Brasil para depois, o Congresso pode dar o pontapé inicial sobre o assunto. “O auxílio emergencial protege quase 50% da população, hoje. Se acabar, só 20% continuarão protegidos. É perigoso não ter uma alternativa perene de renda básica. Então, o Parlamento pode aprofundar esse debate”, disse. (Com Marina Barbosa)