Valor econômico, v. 21, n. 5084, 11/09/2020. Brasil, p. A9

 

Planalto escolhe Barros e Ramos para negociar com o Congresso

Lu Aiko Otta

11/09/2020

 

 

Guedes fica com formulação de propostas

O novo arranjo do governo na articulação com o Congresso para permitir ao ministro da Economia, Paulo Guedes, ficar mais focado na formulação de propostas, segundo um interlocutor do ministro, começou há um mês, com a troca do líder do governo na Câmara dos Deputados. Saiu Major Vitor Hugo (PSL-GO) e entrou Ricardo Barros (PP-PR), num contexto de aproximação do presidente Jair Bolsonaro com o Centrão.

No novo formato, Guedes seguirá dialogando com congressistas, mas não terá mais a tarefa de formar uma maioria favorável a cada votação de matéria de interesse da economia. Essa missão ficará com Barros e o ministro-chefe da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos.

Saindo da articulação, o ministro vai formular propostas, encaminhá-las ao Planalto e dialogar com os líderes no Congresso pela sua aprovação. Será, como ele próprio descreveu esta semana numa live promovida na quarta-feira pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), um modelo semelhante ao que havia durante a gestão do ex-ministro Pedro Malan (1995-2003).

Algo que, afirmou, lhe garante um sono tranquilo, pois o governo agora tem um eixo político e uma base parlamentar. “Não preciso mais andar pela Esplanada, correndo pelo Congresso, e às vezes sendo mal entendido”, disse. “Tem uma via regular desse processo, o presidente está sentado com líderes, o governo consegue decidir e encaminhar da forma mais adequada.”

Essa é uma divisão de papéis clássica, mas que não funcionou no primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro. Avalia-se no entorno do ministro que Vítor Hugo era inexperiente. Com isso, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) tinha muito espaço para atuar. Nem sempre em concordância com os objetivos do governo - até porque não seria seu papel, reconhece-se.

Num cenário assim, que tinha como agravante a ausência de uma base parlamentar governista, Guedes ia a campo para articular as votações mais importantes para sua pasta. Como descreveu um auxiliar, batia o escanteio e corria para a área para cabecear.

A ideia é que ele fique restrito às cobranças de escanteio de agora em diante. E o ataque fique por conta de Barros e Ramos.

Essa arrumação vem no momento em que a relação de Guedes com Maia esgarçou-se a ponto de o presidente da Câmara anunciar, na semana passada, que sua interlocução com o ministro estava encerrada. Guedes fez um gesto de reaproximação esta semana, ao dizer que Maia sempre ajudou o governo nas reformas, com um olhar “generoso e amigo”.

Aparentemente, não foi suficiente para uma reconciliação. Mas Guedes segue empenhado em restabelecer o diálogo.

A relação do governo é particularmente difícil na Câmara. Maia fez da agenda de reformas econômicas uma das marcas de sua gestão. Se por um lado isso ajudou o governo a aprovar a reforma da Previdência, por outro lado surgem atritos.

A gota d’água que levou à interrupção do diálogo, relatou Guedes, foi a criação de fundos com recursos federais para dar suporte aos Estados nos primeiros dez anos após a reforma tributária.

A criação do tributo sobre pagamentos para desonerar a folha, outro ponto de divergência, segue como uma proposta central de Guedes. É a resposta à provável derrubada do veto do presidente Jair Bolsonaro à prorrogação da desoneração da folha salarial de 17 setores.