Valor econômico, v. 21, n. 5084, 11/09/2020. Política, p. A10

 

Lewandowski antecipa regras para candidaturas negras

Luísa Martins

Isadora Peron

11/09/2020

 

 

Decisão tem caráter liminar e depende de análise do plenário, que não tem data marcada para acontecer

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou ontem que as novas regras que beneficiam candidaturas negras já valham para as eleições municipais deste ano. A medida foi aprovada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em agosto, mas a corte entendeu que ela só deveria entrar em vigor em 2022. No julgamento, a corte determinou que os recursos do fundo eleitoral e o tempo de propaganda no rádio e na TV sejam divididos na mesma proporção entre candidatos negros e brancos de cada partido.

Em seu despacho, o ministro afirmou que a decisão liminar (provisória) terá que ser submetida ao plenário, mas ainda não há uma data para que isso aconteça. O primeiro turno da eleição será em 15 de novembro.

A decisão de Lewandowski deve provocar reação de líderes partidários, já que alguns consideraram as novas regras determinadas pelo TSE uma interferência indevida do Poder Judiciário.

Ao adiar a aplicação da nova norma, o TSE citou o artigo da Constituição que estabelece que qualquer lei que altere o processo eleitoral só pode ser posta em prática após o período de um ano. Na ação movida pelo Psol, a pedido da ONG Educafro, o argumento foi o de que esse trecho se refere apenas a leis aprovadas no Congresso, e não a resoluções editadas pela corte eleitoral.

Em seu despacho, Lewandowski afirmou que a mudança aprovada pelo TSE não implica qualquer alteração das “regras do jogo” em vigor. “Na verdade, a decisão da corte eleitoral somente determinou que os partidos políticos procedam a uma distribuição mais igualitária e equitativa dos recursos públicos que lhe são endereçados, quer dizer, das verbas resultantes do pagamento de tributos por todos os brasileiros indistintamente.”

Para ele, “é possível constatar que o TSE não promoveu qualquer inovação nas normas relativas ao processo eleitoral, concebido em sua acepção mais estrita, porquanto não modificou a disciplina das convenções partidárias, nem os coeficientes eleitorais e nem tampouco a extensão do sufrágio universal”.

O ministro disse que o tribunal “apenas introduziu um aperfeiçoamento nas regras relativas à propaganda, ao financiamento das campanhas e à prestação de contas, todas com caráter eminentemente procedimental, com o elevado propósito de ampliar a participação de cidadãos negros no embate democrático pela conquista de cargos políticos”.

Lewandowski destacou também que, segundo o calendário eleitoral, ainda se está no período das convenções partidárias, que vai até o dia 16 de setembro. “Tal cronograma evidencia que a implementação dos incentivos propostos pelo TSE, discriminados na resposta à consulta, desde já, não causará nenhum prejuízo às agremiações políticas, sobretudo porque a propaganda eleitoral ainda não começou, iniciando-se apenas em 27/9.”

O ministro comparou a decisão com o julgamento do STF que confirmou a constitucionalidade da fixação de cotas raciais para o ingresso de estudantes em universidades públicas, da qual também foi relator. Ele defendeu a importância de medidas como essa. “Para mim, não há nenhuma dúvida de que políticas públicas tendentes a incentivar a apresentação de candidaturas de pessoas negras aos cargos eletivos [...] prestam homenagem aos valores constitucionais da cidadania e da dignidade humana.”