Correio braziliense, n. 20920, 02/09/2020. Política, p. 4

 

Dallagnol deixa a Lava-Jato

Renato Souza 

Sarah Teófilo 

02/09/2020

 

 

Uma das faces mais conhecidas da Lava-Jato, o coordenador da força-tarefa da operação em Curitiba, Deltan Dallagnol, deixou o comando da equipe no Paraná, onde está o principal braço da operação, que devassou os casos de corrupção que por pouco não arruinaram a Petrobras e causou imenso impacto político e eleitoral para o PT. Alvo de ações no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), ele alegou que precisou deixar o posto para cuidar da filha, com problemas de saúde. O afastamento ocorreu no momento em que a Procuradoria-Geral da República (PGR) avalia se prorroga o grupo de trabalho até então liderado por ele. O substituto dele é Alessandro de Oliveira.

Dallagnol é um dos grandes defensores da manutenção da força-tarefa. Ele avalia que a permanência do grupo é essencial para o combate à corrupção, apesar das suspeitas de interferência na Polícia Federal e conflitos internos das equipes nos estados com a PGR. “Se você apóia a Lava-Jato, continue a apoiar. A operação vai continuar fazendo seu trabalho, vai continuar firme. Mas decisões que serão tomadas em Brasília afetarão seus trabalhos. A força-tarefa tem muito para fazer e precisa do seu suporte”, disse Dallagnol, em vídeo publicado em rede social.

Família

Ele acrescentou, na mesma mensagem, que a preocupação agora é cuidar da família. “Há algumas poucas semanas, eu e a minha esposa, identificamos uma série de sinais de regressão em nossa bebezinha, de um ano e dez meses de idade. Depois de anos de dedicação intensa a Lava-Jato, acredito que agora é a hora de me dedicar, de modo especial, à minha família”.

Seu substituto, Alessandro José Fernandes de Oliveira, tem experiência no combate ao crime organizado, corrupção e lavagem de dinheiro, e atualmente integra o Grupo de Trabalho Lava-Jato na Procuradoria-Geral da República (PGR). Ele é procurador desde 2004 e está lotado em Curitiba desde 2012.

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Subprocuradora prorroga operação

02/09/2020

 

 

A subprocuradora-geral da República Maria Caetana Cintra Santos, integrante do Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF), deferiu ontem uma liminar determinando a prorrogação dos trabalhos da força-tarefa da Operação Lava-Jato de Curitiba. A decisão pegou colegas da Procuradoria-Geral da República (PGR) de surpresa e, por isso, discute-se, internamente, a validade da decisão monocrática da subprocuradora.

Isso porque cabe ao procurador-geral Augusto Aras a decisão de prorrogar os trabalhos das forças-tarefa. É ele quem deve definir, até o próximo dia 10, se a equipe continua formada ou é dispersada. Mas como há dois procuradores-regionais da República –– Januário Paludo e Orlando Martello Júnior –– entre os 14 integrantes da equipe de Curitiba, a manutenção deles no grupo precisa passar pelo CSMPF. Caetana, que é a relatora do pedido feito pela força-tarefa, no último dia 19, em ofício enviado a Aras, decidiu pela manutenção da equipe inteira pelo prazo solicitado por eles –– um ano.

Para decidir sobre o tema, a procuradora destacou que a validade da força-tarefa se encerra no dia 10 deste mês. “Vê-se, assim, que o pleito está absolutamente justificado diante da evidente importância do trabalho e dos resultados alcançados, e da necessidade de não interromper investigações em prol do interesse público, do Erário e da sociedade brasileira, considerando igualmente o pleno atendimento aos requisitos legais, e normativos pertinentes”, escreveu Caetana.

Maioria

A decisão de Maria Caetana, que é aliada de Aras, cria um fato político importante dentro do CSMPF, e desfavorável ao procurador-geral. Com a mudança de dois dos membros neste semestre, Aras já havia perdido a maioria no colegiado. E, ontem, enfraqueceu-se mais ao não conseguir emplacar o vice-presidente, pois seu candidato, Alcides Martins, foi substituído pelo subprocurador-geral José Bonifácio, crítico à sua atuação.

Como a decisão sobre a Lava-Jato partiu de uma aliada, os rumores são de que o Aras não poderá culpar um grupo que se opõe a ele dentro do colegiado por ter prorrogado a operação e agravar o embate interno, uma vez que prometeu várias vezes, e publicamente, impor limites. Um subprocurador que conversou com o Correio, na condição de anonimato, observou que a ação de Caetana “tira das costas de Aras uma decisão difícil”. Com isso, a renovação se dá sem maiores pressões e abre a possibilidade de o Conselho discutir um formato para substituir as forças-tarefas. (RS e ST)