O globo, n. 31780, 10/08/2020. País, p. 6

 

Flávio diz desconhecer depósito de Queiroz

Juliana Castro

Juliana Dal Piva

10/08/2020

 

 

Ministério Público do Rio identificou pagamento de R$ 25 mil, em espécie, feito em 2011 na conta de sua mulher, Fernanda Bolsonaro; em depoimento, senador disse que ex-assessor “nunca depositou dinheiro”

 Segundo os dados, Queiroz fez um depósito de R$ 25 mil em dinheiro na conta da mulher do senador, Fernanda Bolsonaro, em agosto de 2011. A identidade de quem fez o repasse, no entanto, é mantida sob sigilo. Em outro trecho do depoimento, os promotores voltam ao tema e citam o depósito de Queiroz para a mulher de Flávio. Eles questionam se o senador sabe a origem do dinheiro e a razão da transferência.

— Não sei a origem do dinheiro. Mas dá uma checada direitinho que eu tenho quase certeza que não deve ter nada a ver com Queiroz. Queiroz nunca depositou dinheiro na conta da minha esposa, pelo que eu saiba —afirmou Flávio.

O MP do Rio mapeou, diante da quebra de sigilo, de onde veio o dinheiro que teria bancado a entrada de R$ 110,5 mil do apartamento do casal. Dias antes do pagamento, em agosto de 2011, houve um movimento de créditos na conta de Fernanda, sendo o primeiro no dia 15, vindo de Queiroz. Depois de dois dias, a mulher de Flávio recebeu R$ 74,7 mil de resgate de aplicações em fundos. Um novo depósito em espécie foi feito no dia 19, por uma pessoa cuja identidade está em sigilo. Nesses quatro dias, a conta ficou com crédito adicional de R$ 111,7 mil, suficiente par apagar a entrada.

O MP do Rio apontou, no pedido de prisão preventiva de Queiroz, em junho, imagens em que ele paga boletos nova lorde R $6,9 mil de mensalidades da escola das filhas de Flávio. Os promotores investigam ainda o pagamento de 114 boletos bancários das escolas das filhas e do plano de saúde da família de Flávio Bolsonaro cujos valores não foram debitados das contas do então deputado nem das de sua mulher. O valor total desses boletos chega aR $261,6 mil.

Ontem, o GLOBO revelou que o senador admitiu em depoimento que a compra de 12 salas comerciais em 2008 teve o uso de R$ 86,7 mil em dinheiro vivo. Flávio disse em depoimento que pegou o valor emprestado com o presidente Jair Bolsonaro e um irmão, sem identificar qual. Também obteve valores emprestados de Jorge Francisco, ex-chefe de gabinete do presidente e pai do ministro Jorge Oliveira. Francisco faleceu em 2018.

Em nota, a defesa de Flávio disse que “tem recebido com perplexidade as notícias de vazamento das peças e áudios do procedimento que tramita sob sigilo” e que “a partir deste momento não serão mais permitidos os registros audiovisuais do senador durante as suas manifestações”. Os advogados também informam que vão representar aos órgãos de correição do Ministério Público Federal (MPF) para que investiguem o episódio.

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Como nasceu relação entre o parlamentar e o miliciano

10/08/2020

 

 

Flávio contou pela primeira vez como conheceu Adriano da Nóbrega; mãe e ex-mulher do ex—capitão foram empregadas na Alerj

 O senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) contou pela primeira vez, em depoimento ao Ministério Público do Rio (MP-RJ), detalhes de como conheceu o ex-capitão do Bope Adriano da Nóbrega, morto em fevereiro após trocar tiros com a Polícia Militar da Bahia, onde estava escondido. Flávio disse que Adriano foi seu instrutor de tiro e que o exassessor Fabrício Queiroz os apresentou.

O senador foi ouvido no dia 7 de julho pelo MP no inquérito que apura a existência de “rachadinhas” em seu gabinete na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Danielle Mendonça, ex-mulher de Adriano, e Raimunda Veras Magalhães, mãe do miliciano, foram empregadas por Flávio. Há indícios de que ambas seriam funcionárias fantasmas.

—Conheci Adriano dentro do Bope, ele me dando instrução de tiro. (Conheci) Por intermédio do Queiroz, que serviu com ele no batalhão, não sei qual —disse Flávio. —Sempre fui um parlamentar que gostei de conhecer os policiais que iam para o combate, do dia a dia da rua, para o trabalho mais arriscado.

Queiroz e o ex-capitão se conheceram na época em que ambos trabalhavam no 18º Batalhão de Polícia Militar (Jacarepaguá). Os dois estiveram envolvidos na morte de um estudante na Cidade de Deus, durante operação policial em maio de 2003, mas nunca foram presos por isso. O MP aponta falhas na investigação e pediu a retomada do inquérito.

Adriano e outros sete policiais receberam de Flávio, na Alerj, uma “moção de louvor” em novembro de 2003. Alguns dias depois, porém, os integrantes do grupamento foram presos em flagrante pelo assassinato do guardador de carros Leandro dos Santos Silva e começaram a responder um processo criminal por homicídio, tortura e extorsão. Nesse período, Flávio os visitou na prisão, conforme noticiou O GLOBO em fevereiro. À época da reportagem, o senador disse em nota: “não há nenhuma relação de Flávio Bolsonaro ou da família com Adriano”.

O ex-capitão foi expulso da PM em 2014, por envolvimento com a contravenção, e se juntou com outros dois ex-policiais para formar o chamado Escritório do Crime, uma espécie de consórcio de matadores.

O senador disse que frequentou o Batalhão Especial Prisional (BEP), onde estavam os policiais, para para dar “esse apoio não só emocional, mas jurídico”. Afirmou que foi nesse contexto que conheceu Danielle e Raimunda.

—Elas acabaram formando um grupo de mulheres que passavam pela mesma situação —explicou, dizendo que as contratou para “fazer a função de ouvir quem passou por aquela situação” e interessava a ele “ter pessoas desse perfil”, ligadas ao segmento de pessoas que votavam nele, para trazer as demandas.