O globo, n. 31781, 11/08/2020. Pais, p. 7

 

Ministério da Justiça se recusa a enviar ao MPF dossiê de antifascistas

Vinicius Sassine

11/08/2020

 

 

 Recorte capturado

Em resposta a investigação na 1ª instância, pasta volta a negar abrir relatórios e diz que só atenderá a ofícios da PGR

 O Ministério da Justiça e Segurança Pública se recusou a entregar ao Ministério Público Federal (MPF) uma cópia do dossiê elaborado para monitorar grupos antifascistas e alegou que este assunto agora é de responsabilidade direta do ministro, André Mendonça. Por esta razão, o ministério afirmou que só aceitará ser oficiado pelo procurador-geral da República, Augusto Aras. É mais uma negativa do governo em abrir o conteúdo dos relatórios, cuja existência gerou a suspeita entre investigadores de possível perseguição a opositores do governo Jair Bolsonaro.

A posição da Justiça está num documento de 11 páginas encaminhado à Procuradoria da República no Rio Grande do Sul, que instaurou um procedimento preliminar — chamado notícia de fato — para apurar as circunstâncias da elaboração do relatório de monitoramento dessas pessoas.

O dossiê foi produzido pela Diretoria de Inteligência da Secretaria de Operações Integradas (Seopi) do Ministério da Justiça, na gestão de Mendonça. O relatório lista 579 servidores da área de segurança pública e professores que integram movimentos ou defendem ações contra o fascismo. Os dados dessas pessoas foram enviados a diferentes órgãos de persecução e investigação. A existência do relatório foi revelada pelo portal “Uol”.

O procurador regional dos Direitos do Cidadão Enrico Rodrigues de Freitas, com atuação no Rio Grande do Sul, instaurou o procedimento preparatório de apuração, que pode resultar na abertura de um inquérito, e pediu informações ao Ministério da Justiça. Entre os pedidos feitos, estava o de encaminhamento de uma cópia do relatório produzido pela Seopi. A pasta se negou a repassar o documento ao MPF na última quintafeira. Na semana passada, o ministério também deixou de encaminhar uma cópia do dossiê ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Em postura diferente, porém, Mendonça disse que vai enviar os relatórios à Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência do Congresso. A promessa foi feita em sessão sigilosa na última sexta-feira, na qual ele foi sabatinado por parlamentares sobre o assunto. Até o fechamento desta edição, os textos não haviam sido entregues.

JUSTIFICATIVAS

O parecer enviado ao MPF foi elaborado pela consultoria jurídica do ministério, formada por advogados da União.

“Não pairam dúvidas de que se revela equivocado o endereçamento da solicitação ao secretário de Operações Integradas, uma vez que, pela evolução dos acontecimentos, atemática foi alçada aos cuidados diretos do ministro de Estado da Justiça e Segurança Pública”, cita o parecer. O documento afirma que este fato “exige a adaptação e observância dos rigores procedimentais aplicáveis aos ministros de Estado, inclusive nas relações interinstitucionais”.

Assim, conforme a alegação dos advogados do ministério, o secretário de Operações Integradas, o delegado da Polícia Civil do DF Jeferson Lisbôa Gimenes, deixa de ser o responsável “imediato” pela questão. “Não resta alternativa além da devolução do expediente ao procurador da República para que, pelas vias internas adequadas, encaminhe solicitação ao procurador-geral da República (Augusto Aras).” Ministros de Estado têm foro privilegiado junto ao STF. A equipe do ministro da Justiça, assim, pediu que o assunto passe a ser tratado na Suprema Corte.

O parecer do Ministério da Justiça afirma que a Diretoria de Inteligência da Seopi é a “agência central” do subsistema de inteligência de segurança pública. E que os relatórios produzidos são sigilosos.

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Eduardo Bolsonaro entregou relatório aos EUA, diz deputado

Leandro Prazeres

11/08/2020

 

 

Douglas Garcia (PSL-SP) fez declaração em processo no qual foi condenado

 O deputado estadual Douglas Garcia (PTB-SP) disse à Justiça de São Paulo que o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) entregou um dossiê com o nome de pelo menos mil pessoas identificadas como militantes antifascistas ao governo dos Estados Unidos. A declaração foi dada em resposta a um requerimento do juiz de um processo no qual Garcia foi condenado por danos morais a uma mulher que teve seu nome incluído no suposto dossiê.

“O Requerido nunca fez nenhum protocolo na Procuradoria Geral da República. E o protocolo junto à Embaixada dos Estados Unidos foi feito pelo Dep. Federal Eduardo Bolsonaro, motivo pelo qual não possui comprovantes, devendo ser oficiado seu Gabinete para que o encaminhe”, diz trecho da manifestação entregue por Douglas Garcia à Justiça paulista em 5 de agosto.

O dossiê que teria sido entregue por Eduardo Bolsonaro à Embaixada dos Estados Unidos teria 56 páginas com nomes, fotos e informações pessoais de supostos militantes antifascistas. Em suas redes sociais, Garcia associou o grupo a atos terroristas.

Ao longo do processo, Garcia negou ser o autor do dossiê. O juiz da 45ª Vara Cível de São Paulo, Guilherme Ferreira da Cruz, pediu que ele apresentasse cópia dos protocolos referentes à entrega do dossiê. O deputado bolsonarista respondeu que quem entregou à PGR e à Embaixada dos Estados Unidos foi o deputado Eduardo Bolsonaro. O argumento não convenceu o magistrado, que condenou Garcia a pagar R$ 20 mil à autora da ação.

Na avaliação do juiz, Garcia “catalisou e sistematizou” o dossiê, que não é o mesmo elaborado por uma secretaria do Ministério da Justiça.

O deputado estadual publicou vídeo ontem em que afirmou que anunciou há dois meses que entregaria o dossiê à Embaixada dos Estados Unidos. Ele diz que o ofício teria a assinatura de Eduardo Bolsonaro, que respondeu a postagem dizendo que apoia Garcia. O GLOBO não conseguiu localizar Eduardo Bolsonaro para comentara reportagem.