Título: Advogados viram réus no confronto com MP
Autor: Mello, Alessandra
Fonte: Correio Braziliense, 14/02/2013, Política, p. 4

Contratação de serviços jurídicos sem licitação pela administração pública atinge até o presidente da OAB, denunciado por improbidade. Para a Ordem, não há irregularidades

Os advogados que prestam serviço à administração pública vivem entre a cruz e a espada. De um lado o Ministério Público, contrário à contratação direta — sem licitação — de serviços jurídicos por prefeituras e outros órgãos da administração, a não ser em casos muito específicos. De outro, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que condena a participação de seus filiados em processos licitatórios. Nesse terreno movediço, sobrou até para o presidente nacional da autarquia, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, que foi denunciado por improbidade administrativa pelo Ministério Público do Piauí. Segundo a denúncia, Coelho foi contratado, sem licitação, pela prefeitura de Antônio Almeida, no interior do estado, para representar a cidade em ações judiciais.

O Conselho Federal da OAB editou, em outubro, uma súmula proibindo os advogados de entrar nesse tipo de concorrência. O argumento é que é inexigível o procedimento licitatório para contratação de serviços advocatícios em função da singularidade da atividade, da notória especialização e da inviabilização objetiva de competição. Outra norma também editada pela OAB determina que advogados não podem ser responsabilizados nas esferas criminal e cível por emitir parecer técnico dispensando a realização da licitação para fornecimento de bens e serviços. No entanto, as regras da OAB não têm nenhuma validade jurídica, no entendimento do Ministério Público, fiscal da aplicação da lei. Diante disso, hoje não há praticamente uma banca que preste serviços ao poder público que não responda a processos por contratação sem licitação.

Ineficaz Para o promotor do Patrimônio Público do MP de Minas Gerais Leonardo Barbabella, as duas súmulas são ineficazes em relação ao ordenamento jurídico. “Essa é uma decisão de um órgão classista que não tem poder de lei”, ressalta. Segundo ele, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu que serviços de assessoria jurídica podem ser contratados, desde que o objeto seja singular. “Se uma prefeitura tem uma dívida tributária enorme, um caso difícil, ela pode contratar um escritório especializado sem precisar fazer licitação, mas, para atividades permanentes, ela tem de ter um quadro de profissionais”, diferencia ele.

Barbabella também não vê sentido na súmula que impede a responsabilização criminal de advogados que emitem pareceres dispensando órgãos públicos de fazer licitação. “Se um advogado emite parecer para dispensa de licitação com a intenção de simular ou mascarar contratações ilegais ou fraudulentas, ele vai responder por isso”, avisa o promotor. Para evitar esse tipo de conflito, Barbabella defende que os procuradores de prefeituras e dos governos estaduais e federal sejam sempre concursados.

Para o advogado Wederson Advíncula, integrante da seção mineira da OAB e coordenador da área de direito eleitoral da Escola Superior da Advocacia de Minas Gerais — também alvo de processos —, falta sensibilidade ao MP. “Duvido que o membro do Ministério Público, caso esteja doente, vá ligar para o médico mais barato para se tratar. Da mesma forma, duvido que, caso seja processado, vá procurar nos jornais o advogado mais barato para lhe defender. Como querer que a administração tome essa medida?”, pergunta ele. Para Advíncula, é preciso uma regra clara que evite esse conflito. Ele cita que, em todo o país, os tribunais têm decisões contraditórias em relação ao assunto. “Algumas vezes, permitem a inexigibilidade (de licitação para contratação de serviços advocatícios) e, em outros casos, proíbe. O Supremo Tribunal Federal (STF), órgão máximo do Poder Judiciário, admite a discricionariedade no procedimento de inexigibilidade de licitação, permitindo que o gestor escolha o profissional que prestará serviços advocatícios com base no grau de confiança que nele deposita”, exemplifica.

PGR contra lei da mordaça

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) na qual pede a anulação da Emenda Constitucional 26/2002 do estado de Rondônia, conhecida como lei da mordaça. A norma veta qualquer integrante do Ministério Público Estadual de se “manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente em que atue ou que seja conduzido por outros membros, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças de órgãos judiciais, salvo em peças processuais, ou estudos e obras técnicas”. Para Gurgel, a lei peca por não estabelecer, de forma clara, os limites à liberdade de expressão. O relator do caso é o ministro Dias Toffoli.