O Estado de São Paulo, n.46272, 25/06/2020. Política, p.A6

 

Weintraub é contestado no Banco Mundial

Beatriz Bulla

25/06/2020

 

 

Associação de funcionários pede que Comitê de Ética da instituição suspenda indicação de ex-ministro da Educação para diretoria executiva

A Associação de Funcionários do Banco Mundial enviou ontem uma carta ao Comitê de Ética da instituição pedindo uma investigação sobre o ex-ministro da educação do Brasil, Abraham Weintraub. O grupo que representa os funcionários do organismo internacional quer que a nomeação do brasileiro para assumir uma diretoria executiva do banco fique suspensa até a conclusão desta investigação. O motivo do pedido são falas preconceituosas do ministro sobre a China e minorias, além do posicionamento a respeito da prisão de ministros do Supremo Tribunal Federal.

“O Banco Mundial acaba de assumir uma posição moral clara para eliminar o racismo em nossa instituição. Isso significa um compromisso de todos os funcionários e membros do conselho de expor o racismo onde quer que o vejamos. Confiamos que o Comitê de Ética compartilhe dessa visão e faremos tudo ao alcance para aplicá-lá”, afirma a associação de funcionários. O e-mail com o pedido de investigação foi direcionado ao Comitê de Ética do banco e encaminhado ontem a todos os funcionários da instituição.

Mesmo sob reação de funcionários do Banco Mundial e de intelectuais brasileiros, Weintraub só não assumirá o cargo na instituição se o presidente Jair Bolsonaro mudar de ideia. Weintraub foi indicado pelo Ministério da Economia para assumir a diretoria executiva que representa o Brasil e mais oito países no banco.

A confirmação depende de uma eleição interna do grupo, mas é considerada meramente protocolar, já que o País tem mais de 50% do poder de voto e por isso pode emplacar o nome que desejar para a função. Não houve até o momento oposição formal por parte dos outros países que formam o consórcio junto com o Brasil, que são Colômbia, Filipinas, Equador, República Dominicana, Trinidad e Tobago e Suriname.

Na carta, os funcionários afirmam que, “de acordo com múltiplas fontes, o senhor Weintraub publicou um tuíte de carga racial, ridicularizando o sotaque chinês e culpando a China pela covid-19, e acusando os chineses de “dominação mundial’; levando a Suprema Corte a abrir uma investigação por crime de racismo”.

A carta também cita a afirmação que Weintraub fez na reunião ministerial do dia 22 de abril, quando sugeriu que ministros do Supremo Tribunal Federal deveriam ser presos. A associação de funcionários também alega que ele diz abertamente ser contra a proteção dos direitos de minorias e a promoção de igualdade racial.

“Embora sua indicação tenha sido condenada por vários países clientes, a Associação de Funcionários entende que a escolha deste diretor executivo é do Brasil e somente do Brasil”, afirmam os funcionários. Apesar disso, eles argumentam que são exigidos padrões de integridade e ética na conduta pessoal e profissional alinhados com políticas do banco, como a política sobre populações indígenas.

O Banco Mundial prevê, por exemplo, que comunidades indígenas sejam ouvidas quando um projeto de desenvolvimento pode afetar um território indígena. Os projetos financiados pela instituição levam em conta prerrogativas como redução de desigualdades e proteção ambiental.

“Solicitamos formalmente ao Comitê de Ética que reveja os fatos subjacentes às múltiplas alegações, com intenção de (a) colocar sua indicação em espera até que essas alegações possam ser revisadas e (b) garantir que o Sr. Weintraub seja avisado de que o tipo de comportamento pelo qual ele é acusado é totalmente inaceitável nesta instituição”, pede a associação. Se eleito, Weintraub vai trabalhar no banco até 31 de outubro de 2020, quando será necessário nova nomeação e eleição.

Viagem. Weintraub desembarcou em Miami, nos Estados Unidos, no sábado, 20, dois dias depois anunciar, ao lado do presidente Jair Bolsonaro, sua saída do ministério da Educação. Após a suspeita de que o ex-ministro tenha usado o passaporte diplomático referente ao cargo do qual já havia saído para conseguir desembarcar em Miami e, assim, driblar as restrições de viagem impostas pelos EUA aos brasileiros, em decorrência da pandemia do novo coronavírus, o governo retificou ontem, no Diário Oficial da União (DOU), a data de sua exoneração, que passou a valer “a partir de 19 de junho”, um dia antes do que constava no decreto presidencial anterior.

Na segunda-feira, em rede social, Weintraub agradeceu às “dezenas de pessoas” que o “ajudaram a chegar em segurança aos EUA”. O Tribunal de Contas da União (TCU) vai investigar se houve gasto de dinheiro público e participação do Itamaraty na ida do ex-ministro aos Estados Unidos.