O globo, n. 31784, 14/08/2020. País, p. 4

 

De volta para cadeia

Aguirre Talento

14/08/2020

 

 

STJ revoga prisão domiciliar de Queiroz e de sua mulher, Marcia

Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), terá que retornar à cadeia. A decisão foi do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Félix Fischer, que revogou a prisão domiciliar de Queiroz e de sua mulher, Márcia Aguiar, que estava foragida quando recebeu o benefício e agora deve ser presa. Em seu despacho, Fischer derrubou a liminar concedida pelo presidente do STJ, João Otávio Noronha, durante o plantão do Judiciário.

Com a revogação, o STJ vai intimar o Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ) para cumprir uma nova ordem de prisão contra Queiroz, o que deve ocorrer hoje. Fischer também determinou que o TJ-RJ analise com urgência o habeas corpus já apresentado pela defesa. A análise caberá ao relator do caso no Órgão Especial do TJ-RJ, desembargador Milton Fernandes de Souza.

A defesa do ex-assessor afirmou que recebeu com surpresa a decisão do STJ e que vai recorrer. Os advogados alegam que Queiroz tem problemas de saúde e que ele e Márcia fazem parte do grupo de risco para o coronavírus. Foi o mesmo argumento acatado por Noronha ao conceder a liminar que deu o benefício da prisão domiciliar. Nesta mesma decisão, em julho, o presidente do STJ estendeu a medida a Márcia, que estava foragida. Desde então, ambos estão juntos, com tornozeleira eletrônica num apartamento em Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio.

Ainda há outro habeas corpus da defesa de Queiroz nas mãos do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes. Ontem, Mendes pediu informações sobre a prisão de Queiroz ao TJ do Rio e ao STJ. Depois de analisar o material, o ministro deve decidir sobre o pedido da defesa, pela soltura do ex-assessor.

Ao protocolar o pedido no STF, os advogados do ex-assessor queriam evitar exatamente uma decisão desfavorável de Fischer. Já havia uma expectativa, nos bastidores do tribunal, de que o magistrado pudesse rever a decisão de Noronha e mandasse Queiroz e a mulher de volta para a cadeia. Fischer estava de licença médica e só retomou a análise do caso nesta semana. A estratégia da defesa era que o caso fosse discutido diretamente na Suprema Corte.

A ação foi distribuída a Gilmar Mendes porque ele havia sido o relator de uma reclamação movida anteriormente pela defesa do senador Flávio Bolsonaro. O advogado do ex-assessor argumentou que este caso tornava o ministro o responsável por julgar também o habeas corpus. Caso Gilmar concedesse alguma decisão, sua ordem ficaria acima de uma eventual decisão de Fischer. Para analisar o caso, porém, ele precisaria avaliar que há violações flagrantes contra a legislação e os direitos do acusado. Isso porque uma súmula do próprio STF restringe que ministros da Corte analisem recursos contra decisões liminares de habeas corpus em instâncias inferiores, o que só costuma ser feito em casos excepcionais.

OPERADOR DO ESQUEMA

Fabrício Queiroz foi preso em uma operação comandada pelo Ministério Público do Rio, em 18 de junho. Batizada de Operação Anjo, ele foi encontrado em um imóvel pertencente ao advogado Frederick Wassef, que atuava para Flávio Bolsonaro na investigação do esquema da “rachadinha”, como é conhecida a prática de devolução de parte dos salários por parte dos assessores lotados no gabinete de um parlamentar. Após a prisão de Queiroz, Wassef, que mantinha relação próxima com a família Bolsonaro, incluindo o presidente Jair Bolsonaro, deixou a defesa de Flávio.

O ex-assessor é suspeito de ser o operador do esquema de “rachadinha” quando Flávio Bolsonaro era deputado estadual, na Alerj. Dados de quebra de sigilo bancário e de relatórios de inteligência financeira detectaram movimentações financeiras milionárias na conta do ex-assessor, abastecida com repasses de diversos funcionários do gabinete. O caso configuraria o crime de peculato, dentre outros delitos sob suspeita. Investigadores também identificaram que Queiroz pagou contas da família do senador, como mensalidades escolares das filhas e boletos do plano de saúde.

ENTENDA AS IDAS E VINDAS JURÍDICAS DA PRISÃO DE QUEIROZ

Detido e enviado a Bangu 8

Queiroz foi preso em Atibaia, no interior de São Paulo, em 18 de junho e enviado ao Complexo de Gericinó, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Ele estava em um imóvel do advogado Frederick Wassef, que atuava junto à família Bolsonaro. Decretada pelo juiz Flávio Itabaiana, do  Tribunal de Justiça (TJ) do Rio, a prisão preventiva também mirou Márcia Aguiar, mulher do policial reformado.

Foro e prisão domiciliar

Uma semana depois, em 25 de junho, a 3ª Câmara Criminal do TJ fluminense decidiu retirar Itabaiana do caso. Os desembargadores atenderam a um pedido da defesa de Flávio, sob o argumento de que o parlamentar teria direito a foro privilegiado no caso, uma vez que era deputado estadual à época dos fatos investigados.

Em 9 de julho, o ministro João Otávio de Noronha, responsável pelo plantão judiciário durante o recesso do Superior Tribunal de Justiça (STJ), acatou um pedido da defesa de Queiroz e o transferiu para prisão domiciliar em consideração à saúde dele, acometido por um câncer de cólon. Noronha também concedeu o benefício a Márcia. Ela, que estava foragida há três semanas, entregou-se às autoridades após a decisão de Noronha.

Decisão reformada

Com o fim do recesso, o ministro do STJ Félix Fischer reformou ontem a decisão de Noronha e determinou que Queiroz e Márcia fiquem em unidades prisionais. Ele solicitou parecer sobre o pedido da defesa ao TJ do Rio, onde o desembargador Milton Fernandes, relator do caso, fará a análise.

Habeas corpus no STF

Na última segunda, em outro habeas corpus, a defesa de Queiroz pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) que derrube as ordens de prisão de junho. O responsável por analisar a solicitação será o ministro Gilmar Mendes. Ele pediu ontem informações sobre o caso ao TJ do Rio e ao STJ.