Correio braziliense, n. 20928, 10/09/2020. Política, p. 4

 

Lava-jato vai só até Janeiro

Sarah Teófilo 

10/09/2020

 

 

A Procuradoria-Geral da República (PGR) prorrogou, até 31 de janeiro de 2021, a força-tarefa da Lava-Jato do Paraná, mantendo a composição de 14 membros. O prazo para renovação venceria hoje. A equipe de Curitiba, então sob coordenação do procurador Deltan Dallagnol, havia solicitado, no fim do mês passado, a extensão dos trabalhos por mais um ano, mas não foi atendida. A 5ª Câmara de Coordenação e Revisão, que cuida dos casos de combate à corrupção, havia enviado um ofício sugerindo a renovação por, pelo menos, seis meses.

A prorrogação, assinada pelo vice-procurador-geral, Humberto Jacques, destacou que o Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF) deverá adotar as medidas para institucionalizar a atuação do combate à corrupção. A discussão refere-se à estrutura que substitua o modelo de forças-tarefas, que precisam ser renovadas anualmente. Ainda não foi decido como será o novo formato.

No documento, a PGR traz propostas, como a criação de novos ofícios de combate à corrupção, em unidades do Ministério Público Federal. Uma das possibilidades, discutida no conselho, seria a criação da Unidade Nacional de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado, que englobaria a estrutura das forças-tarefas, dando apoio ao procurador natural de casos complexos, como a Lava-Jato.

O novo coordenador da força-tarefa de Curitiba, Alessandro Oliveira, que assumiu após a saída de Dallagnol, continuará com 11 procuradores da República e dois procuradores regionais na equipe. Dos 14, 11 terão dedicação exclusiva. A manutenção de procuradores regionais precisa ser aprovada pelo CSMPF, mas a relatora do pedido, Maria Caetana Santos, já havia autorizado a continuação dos integrantes por mais um ano.

Em nota, a força-tarefa disse que a prorrogação “vai ao encontro do interesse público, pois permitirá que resultados significativos sejam obtidos em prol da sociedade brasileira”. No mês passado, a equipe de Curitiba afirmou que seria imprescindível estender os trabalhos “pelo menos até que se implante eventual modelo alternativo”.

Resistência

Jacques salientou, no ofício da prorrogação, críticas ao modelo de força-tarefa. Informou, ainda, que ouviu as unidades que têm membros cedidos para atuar no Paraná, que destacaram ser “um sacrifício” manter os integrantes deslocados por tanto tempo. Como a procuradoria do Distrito Federal, que pediu que um componente acumulasse as responsabilidades que tem originalmente com as da força-tarefa. Ou a de Minas, que reagiu pedindo que a cessão de um procurador fosse por período “razoável”. Segundo o vice-procurador-geral, unidades consultadas indicaram que investigações foram sacrificadas por terem integrantes de seus quadros lotados em Curitiba há quatro anos.

Ele frisou que não se pode confundir “tarefa” com “atribuição”. “Atribuições do Ministério Público são permanentes e, pois, nunca terminam. Tarefas são incumbências com início e término, não se perenizam. Uma tarefa que dura anos, e não enxerga o seu término no horizonte, portanto, muito provavelmente é uma atribuição cuidada como se tarefa fosse”, criticou.

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Advogados viram réus por esquema no Sistema S

Renato Souza

Luiz Calcagno 

10/09/2020

 

 

O juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro, aceitou denúncia oferecida pelo Ministério Público e tornou réus, ontem, os advogados Roberto Teixeira Cristiano Zanin Martins, que atua para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e Ana Tereza Basílio, que defende o governador afastado do estado do Rio Wilson Witzel. Também viraram réus o advogado Eduardo Martins, filho do ministro Humberto Martins, presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ); e o presidente da Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb), Daniel Rossiter. Foram cumpridos 50 mandados de busca e apreensão em Brasília e no Rio.

Eles são acusados, com outras 22 pessoas –– incluindo o ex-governador do Rio Sérgio Cabral –– de integrar uma organização criminosa para desviar recursos de entidades do Sistema S, que abrangem Sesi, Senac e Senai, e cujas irregularidades teriam causado prejuízos de R$ 151 milhões. De acordo com o MP, os escritórios eram contratados pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do estado do Rio (Fecomércio-RJ), de maneira que se evitava a fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU) e do conselho fiscal do Sistema S.

Os advogados foram delatados por Orlando Diniz, ex-presidente do Sistema S no Rio. A denúncia diz que a Fecomércio era utilizada para firmar os contratos e dificultar a fiscalização. Entre 2012 e 2013, três acordos firmados com Teixeira e Zanin renderam R$ 9,5 milhões a eles.

A investigação apontou, também, que entre dezembro de 2016 e maio de 2017, Orlando Diniz e outras duas pessoas desviaram ao menos R$ 4,7 milhões do Sesc e Senac do Rio, “mediante pagamentos de honorários advocatícios, por serviços que efetivamente não foram prestados”. Os valores, conforme apurado, eram repassados de forma sequencial a Frederick Wassef, que trabalhou para a família do presidente Jair Bolsonaro, e a outra advogada, “ocultando a sua origem e distanciando o dinheiro de sua origem ilícita”. Wassef, porém, ainda não é réu, embora seja acusado de receber R$ 2,7 milhões.

A denúncia aponta, também, que Eduardo Martins teria sido contratado “a pretexto de influir em atos praticados por ministros” do STJ. Ele teria obtido, mediante contratos, R$ 86,9 milhões.

Em nota, Zanin acusou o juiz Marcelo Bretas de ter ligação com Bolsonaro e disse que a ação é uma retaliação ao seu trabalho para expor erros da Lava-Jato. Já Wassef afirmou que “jamais fui contratado pela Fecomércio ou recebi pagamentos desta entidade”. Também citado, o escritório Basilio Advogados afirmou, em nota, que atuou em mais de 50 processos da Fecomercio entre 2013 e 2017. A Advocacia Gonçalves Coelho e o advogado Antonio Augusto de Souza Coelho garantiram que “comprovarão a improcedência das acusações quando lhes for dada oportunidade de defesa”. O Correio não conseguiu falar com representantes de Daniel Rossiter nem de Eduardo Martins. (Colaborou Sarah Teófilo)