Título: Juro pode subir, diz Mantega
Autor: Martins, Victor; Bancilloon, Deco; Hessel
Fonte: Correio Braziliense, 16/02/2013, Economia, p. 10

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, sinalizou ontem que, depois de terem atingido os menores patamares em décadas, no Brasil, os juros podem voltar a subir nos próximos meses. Ele afirmou que o dólar não é a ferramenta adequada para controlar a inflação, que acumulou uma alta de 6,15% nos últimos 12 meses e se aproxima do teto da meta oficial, de 6,5%. "O instrumento é juro", disse, em entrevista a agências internacionais. O ministro tentou desfazer a ideia de que o Banco Central tem usado a desvalorização da moeda norte-americana como uma âncora para segurar a carestia, mas foi além: "O juro não é fixo. Se houver uma inflação mais preocupante, ele pode se mexer, mas isso é com o Banco Central", frisou.

A declaração, feita pouco antes da reunião de ministros de finanças do G-20 (grupo das maiores economias), em Moscou, na Rússia provocou reação imediata no mercado brasileiro. Analistas e operadores entenderam a fala de Mantega como uma mudança de discurso que tira qualquer trava do BC nas próximas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom). Até agora, apesar da preocupação com a inflação já manifestada pela autoridade monetária, a equipe do Ministério da Fazenda negava a possibilidade de aumento dos juros. "As palavras do ministro mostram que o governo poderá elevar os juros novamente", afirmou Silvio Campos Neto, economista da consultoria Tendências.

Caso o BC eleve a taxa básica (Selic), as famílias poderão sentir os efeitos da medida de diversas maneiras. Segundo os economistas, os empréstimos e os financiamentos ficariam mais caros, já que os encargos cobrados nessas operações subiriam. Além disso, uma alta da Selic poderia ainda diminuir o já combalido ritmo de crescimento do país. Por outro lado, a inflação diminuiria, ou avançaria menos, abrindo mais espaço no orçamento familiar, e o cenário para os investimentos ficaria menos nebuloso, o que criaria condições para que a economia se recuperasse mais à frente.

Vigilância Para Mantega, o dólar chegou a uma cotação de equilíbrio, que não atrapalha o setor produtivo e, ao mesmo tempo, estimula os investimentos. O ministro aproveitou a ocasião para reforçar a ameaça de que o governo não aceitará que a divisa tenha uma variação "fora do padrão". "O meu recado é o mesmo, não tem nenhuma novidade: é câmbio com flutuação e vigilância", disse. Na quinta-feira, o mercado parece ter chegado ao valor considerado fora do padrão. A cotação bateu em R$ 1,95 e a tendência era de queda ainda maior, com os investidores testando qual seria o limite de tolerância do governo para esse recuo.

A resposta veio ontem com uma intervenção do Banco Central no mercado. Pela manhã, a instituição fez um leilão de swap cambial reverso, que equivale a uma compra de dólares no mercado futuro. Quando o BC faz esse tipo de operação, ele força a subida do dólar, e foi o que aconteceu ontem. A divisa fechou o dia com alta de 0,35%, cotada a R$ 1,965 na venda. "Esse governo não vai fazer âncora cambial, no máximo remou nessa direção", disse José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do banco Fator. Na visão dos analistas, as declarações do ministro e de outras autoridades indicam que o governo quer um dólar estável, com pouca oscilação para cima ou para baixo.

Carta branca Depois da declaração do ministro da Fazenda, os investidores passaram a apostar em uma possível alta da Selic já a partir de maio. No mercado futuro, em que são negociados contratos em que as partes acertam, previamente, juros que serão pagos apenas no vencimento das operações, as taxas dispararam. "A leitura da fala do ministro é a de que o governo está realmente mais preocupado com a inflação, e que, se for preciso, o Banco Central terá carta branca para aumentar a taxa Selic em 2013", disse o estrategista-chefe do Banco WestLB, Luciano Rostagno.

Em tese, os contratos futuros são negociados por empresas e bancos que querem se proteger de possíveis variações de juros ou do dólar. Na avaliação de técnicos do governo, porém, boa parte dessas negociações tem como único objetivo proporcionar ganhos aos "apostadores" do mercado. "Passamos muito tempo discutindo por que os juros no Brasil eram tão altos. Agora que estão em patamares mais civilizados, a reclamação é que os juros estão baixos demais", queixou-se, ao Correio, uma fonte do governo.

Apostando na alta Depois da fala de Mantega em Moscou, os juros fecharam em alta no mercado futuro. Um dos principais parâmetros utilizados para prever o comportamento da Selic dos próximos meses, os contratos com vencimento em janeiro de 2014 encerraram o dia negociados a 7,62% ao ano. Na quinta-feira, o preço médio acordado por esses papéis era de 7,39%, uma diferença de 23 pontos percentuais. "Não há como dissociar esse movimento da fala do ministro", opinou o economista sênior da Austin Rating, Felipe Queiroz.

"O juro não é fixo. Se houver uma inflação mais preocupante, ele pode se mexer, mas isso é com o Banco Central"

Guido Mantega, ministro da Fazenda