O globo, n. 31791, 21/08/2020. País, p. 6

 

JBS: PGR vai investigar atuação de Wassef

Victor Farias

21/08/2020

 

 

Advogado que defendia familia Bolsonaro recebeu R$ 9 milhões da empresa e teria defendido junto à cúpula do Ministério Público Federal a delação premiada dos irmãos Batista, cuja rescisão será julgada pelo Supremo

 A Procuradoria-geral da República (PGR) abriu ontem uma investigação preliminar para apurar se o advogado Frederick Wassef recebeu pagamentos da JBS, entre 2015 e 2020, e se esses valores tiveram algum impacto no acordo de delação premiada celebrado entre os irmãos Joesley e Wesley Batista e a PGR.

A apuração foi solicitada após a revista “Crusoé” noticiar que Wassef recebeu R$ 9 milhões da JBS e que o advogado teria se encontrado com o sub-procurador da República Adonis Callou de Araújo Sá, à época coordenador do grupo de trabalho da Operação Lava-Jato, para defender a manutenção do acordo de delação.

O encontro de Wassef com o subprocurador teria sido intermediado, segundo a Crusoé, pelo presidente Jair Bolsonaro e por Augusto Aras, e se destinaria a convencer o órgão a desistir da rescisão, o que ainda não foi julgado pelo Supremo Tribunal Federal. Desde setembro de 2017, ainda na gestão de Rodrigo Janot, a PGR vem defendendo a rescisão do acordo de delação dos irmãos Batista, soba suspeita de que eles teriam omitido crimes.

Na nota em que informou a abertura da investigação preliminar, a procuradoria-geral afirma que“eventual irregularidade poderá reforçar os indícios de omissão nos acordos de colaboração premiada dos executivos da companhia”.

A JBS afirma que os pagamentos a Wassef se referem a serviços prestados em outros casos, eque emitiu notas fiscais relativos a eles. O advogado também disseque não representou a empresa juntoà PGR no caso. Em nota, Aras afirmou que não intermediou encontro de Wassef com subprocuradores. O Palácio do Planalto não comentou o caso.

INVESTIGAÇÃO

Segundo a revista, os registros dos pagamentos da empresa ao advogado foram encontrados em documentos obtidos por promotores do Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) que investigam a relação de Wassef com Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro na Alerj. Queiroz, personagem central da investigação que apura um esquema da rachadinha no gabinete do então deputado estadual, foi preso em uma casa de Wassef, em Atibaia, no interior de São Paulo, em junho.

Segundo a Crusoé, o encontro entre Wassef e o subprocurador ocorreu no fim do ano passado a pedido do presidente da República, Jair Bolsonaro, que teria ligado ao procurador-geral, Augusto Aras, solicitando que o advogado fosse recebido na PGR.

A revista afirma que, após Callou aceitar se encontrar com Wassef, Bolsonaro teria ligado ao subprocurador, demonstrando agradecimento pela atenção dada ao advogado, que já foi representante do presidente e de Flávio em questões judiciais.

De acordo com a publicação, durante a reunião, Wassef afirmou a Callou que a anulação da delação seria uma injustiça e que a colaboração foi uma das mais eficazes da Lava-Jato.

Na nota publicada ontem pela PGR, Aras afirma que não “recebeu solicitação de nenhuma natureza por parte do presidente da República, e desconhece supostos telefonemas do presidente para qualquer membro do MPF”.

“Augusto Aras não participou de nenhum dos contatos que trataram de eventual proposta de repactuação do acordo de colaboração premiada da JBS com envolvimento do advogado Frederick Wassef. Todas as solicitações de audiência para tratar de assuntos jurídicos que chegam ao gabinete do PGR são direcionadas para os procuradores que atuam na respectiva matéria”, diz a nota.

Já Wassef afirmou que “qualquer tema relacionado à JBS ou qualquer outro cliente do meu escritório, não foi tratado com o Procurador Geral da República” e que, “dentro das minhas competências como advogado, não atuei junto a PGR em nome da JBS no final de 2019 conforme noticiado pela mídia”. “O Presidente da República, Jair Bolsonaro, jamais ligou ou pediu para que o Procurador Geral da República, Dr. Augusto Aras, me atendesse”, completou.

A JBS, por sua vez, afirmou que “o escritório de advocacia mencionado não representa nem se manifesta em nome da Companhia junto à PGR”. A empresa diz que os serviços prestados pelo escritório de Wassef se referem a “inquéritos na esfera policial” e pagos mediante emissão de nota fiscal. Ressalta que “os valores e detalhes do contrato são protegidos por sigilo legal”.