Título: Mercado testa o BC e dólar cai a R$ 1,95
Autor: Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 15/02/2013, Economia, p. 8
O dólar derreteu mais um pouco no pregão de ontem. Depois de recuar 0,31%, a divisa chegou ao menor nível desde maio do ano passado, fechando em R$ 1,958. A cotação ficou pouco acima de R$ 1,95, valor considerado pelo mercado como um piso extraoficial fixado pelo governo. Em apenas um mês e meio, a moeda norte-americana acumula um tombo de 4,22%. Segundo analistas, o mercado está testando os limites do Banco Central. A expectativa é que, hoje e nos próximos dias, um movimento especulativo tentará levar o câmbio ainda mais para baixo, até que a autoridade monetária se sinta obrigada a intervir. Os investidores querem saber até que ponto o governo vai tolerar a desvalorização.
Para quem pretende viajar ao exterior, esse é um bom momento de adquirir moeda estrangeira. Os especialistas dizem que a melhor estratégia é comprar aos poucos, começando bem antes da data da viagem, para que o custo não pese no orçamento. Outra recomendação é se valer de um cartão de crédito pré-pago, cujo valor pode ser preenchido gradativamente. O uso dos cartões tradicionais no exterior deve ser controlado porque, além do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de 6,38%, o turista só saberá o valor do dólar na volta da viagem, quando chegar a fatura. Se a divisa subir, o susto pode ser grande.
Entre os especialistas, ganhou força a avaliação de que o BC está usando o dólar mais barato como um instrumento para reduzir o preço de produtos importados e, dessa forma, segurar a inflação. Eles observaram que, mesmo com a divisa caindo perto de R$ 1,95, a autoridade monetária não fez qualquer movimento, ontem, para interromper a baixa. “Parece que o mercado está testando o piso. Essa queda aconteceu sem qualquer fato relevante no plano doméstico ou internacional”, ponderou Bruno Lavieri, economista da Tendências Consultoria.
Sidnei Nehme, economista e diretor-executivo da NGO Corretora de Câmbio, explica que, levando-se em conta exclusivamente fatores econômicos, o dólar não deveria estar em queda, mas com tendência de alta. Isso porque o volume de moeda estrangeira disponível no mercado diminuiu. Ainda ontem, o BC informou que em fevereiro, até o dia 18, as saídas de divisas superaram as entradas em US$ 67 milhões. No ano, o chamado fluxo cambial está negativo em US$ 2,3 bilhões e, se fevereiro terminar como começou, será o terceiro mês consecutivo de fuga de capitais.
Lavieri tem opinião semelhante e avalia que não existe mais câmbio flutuante no Brasil. “Desde maio do ano passado, quando definitivamente mudou o regime cambial, a quantidade de dólares que entra ou que sai do país não explica mais a cotação”, argumentou.
“O real está fortemente valorizado e deixa a impressão de que esta administração do preço da moeda acontece e de forma tranquila e sustentável”, observou Nehme. “Mas, mantido o fluxo cambial negativo para o país, e com a balança comercial deficitária, o que parece tranquilo neste momento pode se tornar preocupante”, alertou.
Nehme faz parte de uma ala do mercado para a qual o dólar baixo pode acabar com o setor produtivo nacional. Um outro grupo, mais alinhado com o Banco Central, acredita que a inflação está muito alta e é o mal a ser combatido no momento. Para esses analistas, não é possível atacar a carestia com o remédio tradicional da elevação dos juros (Selic) para não reduzir ainda mais o ritmo de crescimento do país. Por isso, o BC tem usado o dólar mais baixo para segurar a inflação.
Seja como for, o mercado deve continuar a testar a política econômica, até porque a postura adotada pelo BC, ao permitir o enfraquecimento do dólar, não agrada ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, que nos últimos meses trabalhou pela valorização da divisa.
Felipe Chad, sócio-diretor da corretora DX Investimentos explicou que as seguidas intervenções do governo na economia assustam os investidores, principalmente os estrangeiros. Segundo ele, esse fator político tem pesado contra a Bolsa de Valores de São Paulo (BMF&Bovespa), onde os aplicadores têm amargado seguidos prejuízos. Ontem, o Ibovespa, principal indicador das ações do pregão, fechou no vermelho pela sexta vez em sete dias. Terminou em 58.077 pontos, com queda de 0,56%. O desempenho negativo foi influenciado também pela notícia de que a Zona do Euro intensificou a recessão e encolheu 0,6% no último trimestre de 2012. No ano, a Bovespa já caiu 4,72%.
"Parece que o mercado está testando o piso. Essa queda aconteceu sem qualquer fato relevante no plano doméstico ou internacional"
Bruno Lavieri, economista da Tendências Consultoria.